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Lava Jato: cúpula do transporte pagou R$ 58 mi a chefe da Alerj; deputados recebiam mesada

Jorge Picciani (PMDB) é conduzido coercitivamente para depor na PF - Pablo Jacob / Agência O Globo
Jorge Picciani (PMDB) é conduzido coercitivamente para depor na PF Imagem: Pablo Jacob / Agência O Globo

Hanrrikson de Andrade

Do UOL, no Rio

14/11/2017 13h45

Investigações da Operação Cadeia Velha, nova fase da Operação Lava Jato no Rio de Janeiro desencadeada nesta terça-feira (14) pela Polícia Federal, MPF (Ministério Público Federal) e Receita Federal, apontam que, somados pagamentos mensais, o presidente da Alerj (Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro), Jorge Picciani (PMDB), teria recebido cerca de R$ 58,4 milhões em propina de empresas de ônibus. Ele foi levado coercitivamente para depor na sede da Polícia Federal na capital fluminense e, na tarde de hoje, já havia deixado o prédio na região portuária.

"Enquanto o Rio definha, a ponto de estar nessa situação de caos social, esses sujeitos se empapuçam com o dinheiro da corrupção", disse o procurador da República Carlos Alberto Gomes Aguiar sobre a atuação de Picciani e dos deputados estaduais Paulo Melo e Edson Albertassi, todos do PMDB, em suposto acordo de cobrança e pagamento de propina para favorecer interesses de empresários no Estado, entre os quais representantes do setor de transporte público e empreiteiras.

Os três parlamentares, além da mulher de Albertassi, Alice Brizola Albertassi, foram alvo de mandados de condução coercitiva (quando o suspeito é obrigado a depor). Entre os presos na ação, está o filho de Jorge Picciani, Felipe Picciani, investigado por lavagem de dinheiro.

Filho de Picciani - FÁBIO MOTTA/ESTADÃO CONTEÚDO - FÁBIO MOTTA/ESTADÃO CONTEÚDO
14.nov.2017 - Felipe Picciani chega à sede da PF no Rio após ser preso na Operação Cadeia Velha
Imagem: FÁBIO MOTTA/ESTADÃO CONTEÚDO

Segundo o procurador, os deputados do PMDB recebiam uma "mesada" de diversas fontes para legislarem em favor dos empresários. A investigação aponta que os parlamentares concederam benefícios fiscais e aprovaram atos de ofício com o intuito de defender interesses privados.

Como exemplo, o procurador citou um e-mail repassado a Picciani que continha reclamações da Odebrecht sobre um projeto de lei que tramitava na Alerj. A medida prejudicava a Braskem, petroquímica controlada pela empreiteira.

O chefe do Legislativo fluminense teria, segundo relato de um executivo da Odebrecht, negociado a inclusão de termos no texto da proposta legislativa, impedindo assim que a Braskem fosse prejudicada. O referido e-mail consta nos autos do processo, fornecido pelo delator Benedito Júnior, ex-executivo da empreiteira.

É uma organização criminosa que tem casco duro e ocupa os principais escalões do Estado do RJ.

Carlos Alberto Gomes Aguiar, procurador da República

Paulo Melo teria sido beneficiado, segundo afirmam a Polícia Federal e os procuradores da República da força-tarefa da Lava Jato, com R$ 54,3 milhões.

Albertassi, por sua vez, recebia um mesada menor, pois não teria a mesma relevância política dos colegas, que possuem longa carreira na vida pública --ambos já estiveram à frente da Presidência do Parlamento.

Na versão do MPF, a indicação de Albertassi para o conselho no Tribunal de Contas Estadual pode ter sido uma "manobra" para evitar o avanço das investigações --a indicação pelo governador Luiz Fernando Pezão (PMDB) foi aprovada na semana passada por uma comissão da Alerj e seria levada a plenário nesta terça, mas a votação foi suspensa por decisão judicial.

Para o delegado da Polícia Federal Alexandre Ramagem Rodrigues, que conduziu as investigações, os deputados do PMDB formavam uma "tropa de choque" em favor dos empresários ligados à Fetranspor (Federação de Empresas de Transporte Rodoviário do Estado do RJ). O peso político de Picciani, Melo e Albertassi na rotina do Parlamento também foi observado por Aguiar, que reproduziu o depoimento de um delator:

"Eu dava o dinheiro porque eles são politicamente fortes. Eu quero tê-los ao meu lado para quando eu precisar. Colocaram os deputados no bolso. Simples assim."

No total da Operação Cadeia Velha, a Justiça expediu seis ordens de prisão preventiva (sem prazo) e quatro temporárias (com prazo inicial de cinco dias), além de quatro mandados de condução coercitiva (três deles contra os deputados do PMDB) e outros 35 de busca e apreensão.

Também são alvos de mandados de prisão: Lélis Teixeira, ex-presidente da Fetranspor; José Carlos Lavoras, ex-conselheiro da Fetranspor; Jorge Luiz Ribeiro, Carlos Cesar da Costa Pereira, Andreia Cardoso do Nascimento, Ana Claudia Jaccoub, Marcia Rocha Schalcher de Almeida e Fábio Cardoso do Nascimento.

TRF-2 analisará pedidos de prisão de deputados do PMDB

O MPF pediu ao TRF-2 as prisões e o afastamento dos cargos parlamentares dos deputados Picciani, Paulo Melo e Albertassi. O desembargador federal Abel Gomes entendeu que os pedidos devem ser analisados pela Primeira Seção Especializada do TRF-2, que ele integra.

O magistrado pediu a convocação de sessão extraordinária, “com a urgência que a natureza dos requerimentos requer”. A Primeira Seção Especializada tem sessões ordinárias na quarta quinta-feira de cada mês, mas, em razão do pedido de urgência, o caso pode ser analisado na próxima quinta (16).

Outro lado

Em nota, Picciani afirmou que acusações contra ele e sua família são falsas. “Em toda a minha carreira jamais recebi qualquer vantagem em troca de favores. A Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro não atua a serviço de grupos de interesse, não interfere em aumento de tarifas (que é autorizado pela Agetransp) e não votou isenção de IPVA para ônibus, porque isso foi feito por decreto pelo ex-governador (decreto 44.568 de 17/01/2014), quando eu nem sequer tinha mandato”, afirmou.

Segundo o peemedebista, a prisão do filho é “uma covardia” com objetivo de atingi-lo. “Felipe é um zootecnista, bom pai, bom filho, bom amigo, que trabalha de sol a sol e não tem atuação política. Todos que o conhecem o respeitam e sabem do seu caráter e correção”, afirmou.

Picciani disse ainda que a indicação de Albertassi para o TCE foi feita pelo governador Pezão e que determinou sua suspensão por decisão da Justiça.

O deputado Paulo Melo (PMDB-RJ), disse estar à disposição da Justiça e pronto para contribuir com as investigações. "Não tenho nada a esconder. Minha vida política sempre foi muito clara, todas as contribuições recebidas foram legais e declaradas na justiça eleitoral", afirmou, em nota.

O deputado Edson Albertassi disse, por meio de nota, que as acusações contra ele serão contestadas por sua defesa, que ainda não teve acesso ao inquérito.
"Albertassi confia na Justiça e está à disposição para esclarecer os fatos", diz o comunicado.

Com relação à indicação para vaga de conselheiro do Tribunal de Contas, o deputado enviou nesta terça um oficio à Mesa Diretora da Alerj, declinando da indicação e solicitando a devolução da mensagem 38/2017 ao governador.

A Alerj informou apenas que, por decisão de Jorge Picciani, a votação da indicação de Albertassi para vaga de conselheiro no TCE-RJ foi suspensa. A Casa não se manifestou quanto às acusações contra os parlamentares.

O PMDB do Rio de Janeiro disse que não vai se manifestar sobre as acusações da Operação Cadeia Velha.

Procurada, a defesa de Jacob Barata Filho afirmou que ainda não teve acesso ao teor do pedido de prisão preventiva e, por esse motivo, não tem condições de se manifestar a respeito.

Os advogados informaram que pretendem recorrer da decisão a fim de restabelecer as medidas alternativas decretadas pelo ministro Gilmar Mendes --recolhimento noturno domiciliar, entrega do passaporte, entre outras. A Fetranspor disse em nota que "permanece à disposição para prestar os esclarecimentos necessários às investigações".

O UOL procurou também os advogados do presidente do órgão, Lelis Teixeira, mas eles ainda não se manifestaram.

A reportagem tenta contato com a defesa dos demais suspeitos para que eles possam comentar a investigação.