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TRF-4 colocou o processo de condenação de Lula rápido demais em pauta?

Foto: ABr
Imagem: Foto: ABr

Daniela Garcia e Paula Bianchi

Do UOL em São Paulo e no Rio

13/12/2017 04h00

Cerca de cinco meses após a condenação no chamado processo do tríplex, o caso do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) será julgado em 24 de janeiro de 2018 pela 8ª Turma do TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região), sediado em Porto Alegre. Como a decisão da segunda instância pode determinar se o petista participará das eleições em 2018, há uma discussão entre criminalistas se a data confirmada nesta terça-feira (12) teria o propósito de atender ao calendário eleitoral.

A defesa de Lula, que é pré-candidato à Presidência em 2018, diz que houve uma "tramitação recorde" no caso e sugere que o tribunal não esteja atento à "isonomia de tratamento" de réus. Entre a condenação na primeira instância e o julgamento no TRF-4, serão contados 196 dias corridos. Segundo a "Folha de S. Paulo", este foi o caso da Lava Jato que mais rápido 'subiu' de instância.

Relator do processo na 8ª turma, o desembargador João Pedro Gebran Neto concluiu seu voto no dia 1º dezembro e o repassou ao revisor, Leandro Paulsen. Este último, que também é o presidente do colegiado, autorizou a entrada do julgamento na pauta.

Em julho deste ano, Lula foi condenado a 9 anos e meio de prisão em primeira instância, pelo juiz Sergio Moro, pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Segundo a sentença, o ex-presidente recebeu um total de R$ 2,2 milhões em propina da construtora OAS na forma de um tríplex no Guarujá (SP) e das reformas feitas no imóvel. De acordo com o juiz, Lula recebeu a "vantagem indevida" em decorrência do cargo de presidente da República. A defesa nega todas as acusações.

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Segundo a Lei da Ficha Limpa, uma condenação criminal por um órgão colegiado, como é o caso da turma do TRF-4, torna um candidato inelegível. A lei foi sancionada pelo próprio Lula em 2010. A tese prevista na legislação deverá ser confrontada pelo petista em instâncias superiores da Justiça, como o STJ (Superior Tribunal de Justiça), o STF (Supremo Tribunal Federal) e o TSE (Tribunal Superior Eleitoral).

O UOL ouviu quatro advogados que avaliaram a tese da defesa de Lula. Três deles defenderam a atuação do tribunal em pautar o processo para janeiro. 

A criminalista Karina Kufa, coordenadora do curso de Direito Eleitoral do IDP-São Paulo, vê como natural a presteza do tribunal em julgar o ex-presidente já no primeiro trimestre de 2018. “Há uma pressão geral da imprensa e da sociedade para termos um resultado, não vejo problema disso. Seria muito mais temerário ter um julgamento às vésperas das eleições”, diz.

Segundo ela, a data pode até favorecer a defesa do ex-presidente. “Com um julgamento em janeiro, se Lula quiser uma liminar, recorrer, ele tem um respiro. Não fica uma situação açodada. A gente está falando de uma campanha presidencial”, lembra.

Para ela, postergar a decisão traria consequências negativas e, em se tratando de uma decisão do TRF, não há obrigatoriedade de seguir uma fila de processos. “Foi uma decisão saudável. Se o relator segurasse esse processo para depois da eleição também seria negativo. Imagina se você registra a candidatura e tem a notícia de uma condenação em segunda instância? Uma decisão liminar na cara do gol da eleição?”, questiona.

Na avaliação de Gustavo Badaró, professor de processo penal da USP, "é fundamental" que o tribunal faça o julgamento da causa para atender a Lei da Ficha Limpa.

"Eu, sinceramente, não vejo isso [a celeridade] como um mal. Se o Lula for condenado, já fica definido sua situação eleitoral. E caso seja absolvido, ele também ficará livre de estar pesando sobre ele uma sentença de primeiro grau", analisa.

"Nunca vi reclamação de celeridade", diz advogado

Badaró também contesta a reclamação da defesa de Moro sobre a celeridade do processo. Para o advogado, a posição é anormal, pois é acostumado a ouvir queixas contras a demora da Justiça.

"Normalmente o que se vê é a reclamação da demora do trâmite na Justiça. Muitas vezes no processo penal há uma demora que pode beneficiar o acusado, mas isso não deve ser a regra, mas sim, a exceção", opina.

Para Carlos Eduardo Scheid, advogado criminalista, a celeridade do processo no TRF-4 não está sofrendo influência do calendário eleitoral. Atuante no mercado de Porto Alegre há mais de dez anos, Scheid diz que o tribunal costuma ser mais rápido quando tem conhecimento prévio do caso a partir de recursos da defesa.

"Como a defesa do Lula apresentou sistematicamente recursos, durante a tramitação na primeira instância, o relator no tribunal já tinha conhecimento elevado sobre as particularidades do processo", pontuou.

O criminalista diz que o relator "não começou do zero", quando o processo subiu da primeira para segunda instância. "O relator não precisa dispensar um tempo para estudá-lo. Se fosse um processo que ele não conhecesse, levaria uns seis meses para elaborar o voto dele."

Para Scheid, não há relação entre o agendamento do julgamento e a eleição. "Eu posso te dizer que não há vinculação com o processo eleitoral. Isso está dentro do fluxo do tribunal."

Guilherme San Juan, criminalista e advogados de outros réus na Lava Jato, foi o único advogado ouvido pela reportagem a chamar a atenção para "uma celeridade grande" no caso do Lula.

Ele faz considerações ainda que o julgamento do TRF-4 foi marcado justamente no período em que o STF (Supremo Tribunal Federal) estará em férias. Sendo que a Suprema Corte está por votar sobre a prisão em segunda instância. "Não haverá tempo hábil de a decisão do STF poder alterar o posicionamento atual", pontua.

Defesa questiona "celeridade extraordinária"

Após o anúncio da data do julgamento, o advogado Cristiano Zanin Martins, que defende Lula, disse que o processo contra o ex-presidente agora não deve ser discutido apenas em relação à condenação judicial, mas também "sob a perspectiva da violação da isonomia de tratamento, que é uma garantia fundamental de qualquer cidadão". 

"Esperamos que a explicação para essa tramitação recorde seja a facilidade de constatar a nulidade do processo e a inocência de Lula", afirmou Zanin Martins em nota.

No dia 5, a defesa de Lula entrou com um pedido de informação no TRF-4 em que questiona uma suposta "celeridade extraordinária" na tramitação do processo do tríplex. Os advogados do ex-presidente perguntam quantos recursos de apelação ainda tinham que ser julgados no tribunal no dia 23 de agosto, quando o caso do tríplex 'subiu' para a segunda instância.

Entre outros questionamentos, os advogados querem saber também qual a ordem cronológica de entrada destes recursos no TRF-4; quantos deles estavam tramitando na 8ª Turma do tribunal, a responsável por julgar processos da Lava Jato; e quantos recursos foram julgados até agora.

Segundo o calendário aprovado pelo Congresso para as eleições de 2018, o registro das candidaturas poderá ser feito até o dia 15 de agosto. Os partidos podem pedir a substituição de um candidato que seja considerado inelegível até 20 dias antes da eleição, marcada para o dia 7 de outubro.