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MP pede à Justiça 24 anos de prisão a 2 executivos do Bradesco acusados de corrupção

O procurador Frederico Paiva durante entrevista da força-tarefa da Operação Zelotes - Marcelo Camargo/Agência Brasil - 28.jul.2016 -
O procurador Frederico Paiva durante entrevista da força-tarefa da Operação Zelotes Imagem: Marcelo Camargo/Agência Brasil - 28.jul.2016 -

Eduardo Militão

Colaboração para o UOL, de Brasília

02/02/2018 16h18Atualizada em 05/02/2018 15h26

O Ministério Público pediu que a Justiça condene Luiz Angelotti e Domingos Abreu, dois executivos do Bradesco acusados de corrupção, a pelo menos 24 anos de prisão. Ambos viraram réus por conta da mesma investigação, que faz parte da Operação Zelotes, e aguardam o julgamento em liberdade. 

A Zelotes investiga desde 2015 uma série de empresas que corrompiam agentes da Receita e do Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais) para obter isenções bilionárias de impostos. O valor indevidamente perdoado giraria na casa dos R$ 20 bilhões, segundo a Polícia Federal e a Procuradoria.

Este pedido de pena está nas alegações finais do processo, última fase de uma ação criminal antes da sentença. Foram acusados Angelotti, Abreu e outras oito pessoas --servidores públicos e intermediários (elos entre os operadores do esquema e os funcionários corruptos). 

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Agora que foi encerrada a fase de depoimentos das testemunhas e de produção de outras provas, o Ministério Público apresentou suas alegações, reafirmando parte da denúncia e acrescentando outras informações. Sugeriu ainda ao juiz a punição para cada um dos réus. A próxima fase é a entrega das alegações finais das defesas. Depois disso, o juiz Vallisney Oliveira, da 10ª Vara Federal de Brasília, decidirá o caso, condenando ou absolvendo os acusados.

Acusação é de três anos de corrupção ativa

A Procuradoria da República no Distrito Federal diz, nas alegações finais, que os executivos Angelotti e Abreu cometeram corrupção ativa por três anos, tentando subornar funcionários da Receita para obter a derrubada de cobranças de impostos contra o banco.

Eles e os demais réus da ação penal, incluindo servidores públicos supostamente corruptos, deverão pagar R$ 20 milhões por danos morais coletivos, na avaliação dos procuradores. Os pedidos foram apresentados a Vallisney nesta semana.

De acordo com o Ministério Público, além de Angelotti e Abreu, outros dois executivos do Bradesco praticaram corrupção ativa: Luiz Carlos Trabuco, ex-presidente do banco, e Mário da Silveira Teixeira Júnior.

Em junho passado, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) trancou a ação em relação a Trabuco: os desembargadores entenderam que não havia indícios da participação do presidente do banco nos supostos crime e suspenderam o processo. Os procuradores recorreram, mas ainda não houve decisão. Da mesma forma, o executivo Mário Teixeira conseguiu um habeas corpus no tribunal e foi excluído do processo.

A Procuradoria disse ao juiz que “espera penas superiores a oito anos de reclusão por cada corrupção”, segundo documento obtido pela reportagem. Assim, Luiz Angelotti e Domingos Abreu seriam condenados por, pelo menos, 24 anos cada um por três atos de corrupção ativa. Contra os demais réus, os pedidos são de condenações por corrupção passiva, com pena mantida a oito anos por cada crime.

"Corrupção ativa caracterizada pelo ‘conchavo’"

O texto das alegações finais da Procuradoria diz que “Juntos, corruptos (que seriam funcionários públicos) e intermediários apresentaram as propostas de corrupção aos corruptores (que seriam os funcionários do Bradesco), que, ao final, aceitaram-nas, consumando-se, também em relação aos executivos do banco, a corrupção ativa caracterizada pelo ‘conchavo’ [‘conluio e ajuste prévio’]”.

A Procuradoria diz, por exemplo, que Eduardo Leite era o chefe da Delegacia Especial de Instituições Financeiras da Receita em São Paulo e encaminhava informações ao intermediário Mário Pagnozzi. Tratavam-se dos valores de impostos supostamente pagos a mais, que os contribuintes poderiam vir a utilizar para pagar débitos existentes. Os documentos usados por eles para fazerem essas análises, conhecidos como “papers”, eram usados por Pagnozzi para procurar interessados em se envolver nesse esquema. Segundo o MP, foi o que aconteceu em um caso do Bradesco.

O procurador Frederico Paiva afirma que o Bradesco tinha interesse em resolver uma pendência perante a Receita que envolvia R$ 4 bilhões em valores atualizados. O banco havia feito uma compensação tributária de Cofins considerada indevida entre fevereiro de 2001 e dezembro de 2005, que somava R$ 1,82 bilhão, e fora multado em R$ 912 milhões por isso.

“No dia seguinte, Mário Pagnozzi cumpriu a determinação de seu ‘sócio’ [Eduardo Leite] e encaminhou a solicitação a Luiz Carlos Angelotti, diretor da área fiscal do Bradesco”, diz o Ministério Público. “O pagamento da propina foi dissimulado por intermédio de um contrato de prestação de serviços de consultoria tributária entre Bradesco e PagnozziCalazans e Associados Consultoria Empresarial S/CLtda”, continua.

O dinheiro --neste caso pago pelo Bradesco-- saía das mãos de Pagnozzi e chegava a Eduardo Leite, por meio de operações de lavagem de dinheiro. O crime de lavagem de dinheiro será tratado em outras ações penais, de acordo com o Ministério Público.

Posicionamento dos acusados 

A assessoria de imprensa do Bradesco afirmou que não comentaria o caso referente aos quatro executivos do banco –-dois réus e dois livres do processo. Em 28 de julho de 2016, quando a denúncia foi recebida pela Justiça, a instituição financeira afirmou que “nenhuma irregularidade ou transgressão legal ou ética foi praticada por seus administradores, o que restará cabalmente provado durante a instrução do processo”.

O advogado de Eduardo Cerqueira Leite, Renato Vieira, disse que ele não era chefe da Delegacia da Receita em São Paulo, não tinha poderes para influir em autos de infração e não recebeu propinas do Bradesco por intermédio de Pagnozzi. Sua atuação era de diretor de Orientação Tributária. “Sequer era responsável por lavrar qualquer auto de infração”, argumentou o defensor. A assessoria da Receita confirma a versão do advogado. Segundo o órgão informou na tarde desta segunda-feira (5), o auditor teve um cargo de chefia na Deinf (Delegacia Especial de Instituições Financeiras) da Receita em São Paulo, mas não era o chefe da unidade. 

Cerqueira foi transferido para a uma unidade em Santo André (SP). “Espero convencer o magistrado de que nada disso é verdade. Isso é mentira. Vou convencê-lo quando eu fizer minhas alegações finais, além do que já está provado nos autos pelas testemunhas”, continuou seu advogado.

A reportagem tentou contato com a defesa de Mário Pagnozzi, mas não localizou seu atual advogado. 

A equipe do UOL também questionou o Ministério da Fazenda se funcionários da Receita respondiam a investigações internas derivadas da Zelotes. A assessoria da pasta disse que "a Corregedoria Geral do Ministério da Fazenda instaurou os processos necessários no âmbito correicional relacionados aos servidores em questão". Os casos ainda estão em andamento.