Cabral: "caixinha dos transportes" na Alerj surgiu com Moreira Franco
O ex-governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral (MDB) disse hoje em depoimento ao juiz Marcelo Bretas --responsável pelas ações em primeira instância da Operação Lava Jato no estado-- que a chamada "caixinha dos transportes" da Alerj (Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro) surgiu durante o mandato do ex-governador Moreira Franco (MDB).
De acordo com o Cabral, o primeiro governo de Leonel Brizolla (PDT), iniciado em 1983, encampou as empresas de ônibus e, com isto, criou-se um imbróglio jurídico. Deste impasse surgiu a Fetranspor, (Federação das Empresas de Transportes do Rio de Janeiro), que era a união dos sindicatos municipais do setor de transportes.
"Entre 1987 e 1990, por intermédio do então governador Wellington Moreira Franco (MDB), cria-se as soluções jurídicas necessárias para que as empresas deixassem de ser encampadas e a surge a primeira propina na Alerj. O então deputado estadual Gilberto Rodrigues era quem administrava a propina na Alerj. No executivo, Moreira Franco e Carlos Navega [procurador de Justiça morto em 2017] trabalhavam o trâmite de distribuição de propina na Alerj." De acordo com Cabral, ele passou a arrecadar e concentrar propinas da Fetranspor a partir de 1995, quando foi eleito presidente da Alerj.
Procurado pelo UOL, o advogado de defesa de Moreira Franco, Antonio Pitombo, afirmou que alguns "condenados - candidatos a delatores - sentem-se imunes aos riscos da calúnia e da difamação, assim, volta e meia ousam imputar algo, de forma leviana, a alguém."
"Espera-se que esse desatino não conte com oculto estímulo de acusadores, ou magistrados, que lhes acenam com vantagens futuras na execução da pena", escreveu Pitombo em nota.
Cabral assumiu o controle da propina em 1998
"No governo de Marcelo Alencar (PSDB), eu me tornei presidente da Alerj. Fui procurado pelo deputado Gilberto Rodrigues que disse que a Fetranspor queria se entender comigo. Marco Aurélio Alencar (secretário de Fazenda do Marcelo) era responsável pela propina do Executivo e eu no Legislativo. A Fetranspor surge da encampação e eles tinham medo dessa estatização. Sempre houve, da parte dos deputados, essa "extorsão". Nessa época, a caixinha da Fetranspor girava em torno de R$ 800 mil por mês. Eu tirava R$ 300 mil para mim e distribuía aos demais deputados o restante. Isso se estendeu até 1998", relatou.
"Nessa época houve uma extensão das linhas de ônibus por 15 anos e, como contrapartida, estabelecemos o ICMS de 13% para as linhas. Isso resultou em um dinheiro a mais para mim e Picciani. Ali em abri uma conta em Nova York para colocar o dinheiro da propina e Picciani comprou uma fazenda no Mato Grosso", afirmou.
Desvios teriam chegado a R$ 144 milhões
Na Operação Ponto Final, na qual foi ouvido hoje, Cabral é acusado pela força-tarefa da Lava Jato no Rio de receber R$ 144,7 milhões do esquema da Fetranspor entre julho de 2010 e outubro de 2016, um mês antes de ser preso.
Questionado por Bretas durante o depoimento, o ex-governador disse que o valor recebido "girava em torno disso, sim". O pedido para audiência foi feito pela defesa de Cabral. Na primeira vez em que foi convocado para depor no âmbito da Ponto Final, no ano passado, ele permaneceu calado.
No mês passado, Cabral admitiu, pela primeira vez, em depoimento ao juiz Bretas, ter recebido propina durante o período em que foi governador do Rio. Aos procuradores, Cabral disse estar "aliviado" ao revelar o esquema --o que indica uma mudança. Preso desde novembro de 2016, Cabral soma nove condenações, cujas penas totalizam 198 anos e seis meses.
(*Colaborou Alex Tajra, de São Paulo)
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