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Operação Lava Jato

Cabral envolve Crivella, Paes, Pezão e Garotinho em esquema da Fetranspor

5.jun.2018 - O ex-governador do Rio Sérgio Cabral (MDB) chega ao prédio da Justiça Federal para acompanhar o depoimento do ex-presidente Lula - Fábio Motta/Estadão Conteúdo
5.jun.2018 - O ex-governador do Rio Sérgio Cabral (MDB) chega ao prédio da Justiça Federal para acompanhar o depoimento do ex-presidente Lula Imagem: Fábio Motta/Estadão Conteúdo

Gabriel Sabóia

Do UOL, no Rio

05/04/2019 17h10Atualizada em 05/04/2019 19h48

De acordo com o depoimento prestado na tarde de hoje pelo ex-governador do Rio Sérgio Cabral (MDB) ao juiz Marcelo Bretas --responsável pelas ações em primeira instância da Operação Lava Jato no estado-- outros ex-governadores do estado, como Luiz Fernando Pezão (MDB) e Anthony Garotinho (PRP), receberam dinheiro da Fetranspor (Federação das Empresas de Transportes do estado) para manter o esquema criminoso em seus mandatos. A "caixinha da Fetranspor" seguiu acontecendo no governo de Anthony Garotinho.

O ex-prefeito da capital fluminense Eduardo Paes (DEM), assim como o atual prefeito da capital fluminense, Marcelo Crivella (PRB), também teriam sido beneficiados por negociatas feitas por ele.

"No ano de 1999, surge o Anthony Garotinho como novo governador. Sem o nível do [Leonel] Brizolla de encampação das empresas, ele queria a redução das tarifas. A esta altura, já haviam três grandes empresário do setor no estado: Jacob Barata Filho, na capital, Luiz Carlos Lavouras, na região metropolitana, e Amaury Andrade, no interior. O Garotinho queria colocar o Andrade como seu interlocutor, já que ele dava propina ao Garotinho em Campos dos Goytacazes. Deste modo, a 'caixinha da Fetranspor' no setor executivo seguiu acontecendo no governo no Garotinho", afirmou.

Em nota, a defesa de Garotinho afirmou que as declarações de Cabral são "fantasiosas e não há nenhuma verdade no que ele disse".

Cabral admitiu que no ano de 2002, a Fetranspor doou à campanha dele R$ 2 milhões -- valor inferior ao doado à campanha dos seus adversários.

"Estávamos estremecidos, pois eu recorri no STJ (Superior Tribunal de Justiça) e venci quanto ao fim das gratuidades no ônibus, que eles tanto queriam. Até 2006, fiquei sem receber dinheiro da Fetranspor e trabalhava no Senado Federa. O deputado Jorge Picciani (MDB), que havia sido meu distribuidor de propina na Alerj (Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro), enquanto eu era presidente da Casa, me dava depósitos mesmo assim. Eram depósitos irregulares, de até R$ 300 mil, a cada três os quatro meses", diz.

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Paes e Crivella teriam sido beneficiados

"Em 2006, me elejo governador e nessa campanha a Fetranspor me deu cerca de R$ 5 milhões. Picciani se reelege presidente da Alerj e segue administrando o caixa na Alerj. Tinha a informação de que a caixinha do Legislativo era de 1 milhão. A do Executivo era de R$ 420 mil por mês e era eu quem recebia. O então secretário de Transportes, Júlio Lopes ganhava R$ 1 milhão a cada reajuste tarifário", afirmou

"Em 2008, ano eleitoral, tudo foi convertido para campanhas. A campanha de Eduardo Paes (hoje no DEM, na época no MDB) à prefeitura recebeu R$ 6 milhões. Pedi este valor ao Barata e Lavouras, era um pedido pessoal, dentro deste contexto do nosso acordo. Mas, assim que acabou o primeiro turno, o terceiro colocado na corrida me procurou. Era o Marcelo Crivella (PRB). Eu e ele sempre tivemos uma relação respeitosa e fraternal". O encontro, de acordo com Cabral, selou a compra do apoio de Crivella a Paes por 1,5 milhão de dólares.

"Ele me ligou e pediu uma conversa no Palácio Laranjeiras. Disse que estava sendo pressionado a apoiar o Fernando Gabeira (que disputava com Paes o segundo turno), mas não queria apoiá-lo por questões religiosas. O Armínio Fraga teria oferecido a ele 1 milhão de dólares. Pedi um tempo, liguei para o Eike Batista e fui à casa dele. Expliquei a ele que precisava de US$ 1,5 milhão, ele aceitou pagar. Paes soube desta situação toda e foi no dia seguinte à casa do Eike. Crivella chegou à casa dele e ficou combinado que o Crivella gravaria um vídeo apoiando o Paes, apenas no programa eleitoral que seria exibido na TV Record", disse.

Em um vídeo publicado nas redes socais, Crivella negou o recebimento do valor, disse que "nunca falou com Armínio Fraga" e concluiu dizendo que a escolha por apoiar Eduardo Paes aconteceu por um único motivo: "Ele era o candidato que tinha maior afinidade com os evangélicos".

O ex-governador disse que em 2010, na sua campanha à reeleição, recebeu doações de R$ 20 milhões da Fetranspor. Mas foi em 2014 que as doações atingiram os seus valores máximos. "Àquela altura, havia uma discussão sobre a renovação da licitação das linhas de ônibus. Por conta disto, a campanha do Pezão recebeu R$ 30 milhões", concluiu.

As doações de empresas a campanhas políticas foram proibidas pelo Supremo Tribunal Federal em 2015.

A reportagem do UOL entrou em contato com as defesas dos citados por Cabral e aguarda retorno.

Desvios teriam chegado a R$ 144 milhões

Na Operação Ponto Final, na qual foi ouvido hoje, Cabral é acusado pela força-tarefa da Lava Jato no Rio de receber R$ 144,7 milhões do esquema da Fetranspor entre julho de 2010 e outubro de 2016, um mês antes de ser preso.

Questionado por Bretas durante o depoimento, o ex-governador disse que o valor recebido "girava em torno disso, sim". O pedido para audiência foi feito pela defesa de Cabral. Na primeira vez em que foi convocado para depor no âmbito da Ponto Final, no ano passado, ele permaneceu calado.

No mês passado, Cabral admitiu, pela primeira vez, em depoimento ao juiz Bretas, ter recebido propina durante o período em que foi governador do Rio. Aos procuradores, Cabral disse estar "aliviado" ao revelar o esquema --o que indica uma mudança. Preso desde novembro de 2016, Cabral soma nove condenações, cujas penas totalizam 198 anos e seis meses.

(*Colaborou Alex Tajra, de São Paulo)

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