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Deputado diz que saia estimula estupro; colega criticada por roupa rebate

Luciana Quierati e Mirthyani Bezerra

Do UOL, em São Paulo

10/05/2019 00h11

Ao se posicionar contra um projeto de lei pelo combate ao assédio sexual e à cultura do estupro em órgãos públicos de Santa Catarina, o deputado estadual Jessé Lopes (PSL) disse na Assembleia Legislativa do estado que a roupa usada pelas mulheres pode estimular o crime.

"Se você quer andar com sainha, decote, ótimo. Se você quer chamar a atenção de estupradores, você sabe o risco que está correndo. Se você se deparar com essa situação, lamento", disse o deputado na terça-feira (7), ao justificar seu voto contrário à proposta.

O projeto, da deputada Luciane Carminatti (PT), foi aprovado e prevê divulgação com cartazes, nas repartições públicas estaduais, de mensagens de conscientização. Dos deputados que compareceram a sessão para votar sobre o projeto, 32 votaram a favor e dois contra. Além de Lopes, o deputado Bruno Souza (PSB) também votou contra.

Ontem, por telefone ao UOL, Lopes voltou a dizer que a roupa da mulher é chamariz para esse tipo de violência.

"As mulheres que se dispõem a usar roupas assim e que têm essa liberdade precisam ter cuidado, porque estão chamando a atenção desses vagabundos", disse ele, antes de afirmar que sugere à esposa e à mãe que evitem vestimentas curtas ou decotadas.

O deputado disse que votou contra o projeto por não ver efeito em campanhas como a proposta pelo PL, com placas e cartazes de divulgação, e por não acreditar no conceito de cultura do estupro utilizado no texto. "Não concordo que exista essa cultura no Brasil. Existem casos isolados", disse o parlamentar.

Cultura do estupro, segundo a ONU (Organização das Nações Unidas), é um termo usado para abordar as maneiras como a sociedade culpa as vítimas de assédio sexual e normaliza o comportamento sexual violento dos homens. Ou seja: quando, em uma sociedade, a violência sexual é normalizada por meio da culpabilização da vítima, isso significa que existe uma cultura do estupro.

Para o deputado Lopes, o que reduziria o número de abusos e estupros no país seria o fim da impunidade, o aumento do policiamento e de ações de segurança pública e a facilitação do porte de armas, como feito pelo presidente Jair Bolsonaro nesta semana.

Segundo dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), divulgados em 2015, a cada 11 minutos uma mulher é estuprada no Brasil. Somente no estado de São Paulo, são registrados 32 casos de estupro e estupro de vulneráveis por dia. O Rio tem um estupro a cada duas horas e 70% das vítimas são menores de idade.

"Muita desinformação"

9.mai.2019 - Deputada estadual Paulinha (PDT-SC)  - Divulgação/Assessoria imprensa - Divulgação/Assessoria imprensa
Deputada estadual Paulinha (PDT-SC), em seu gabinete na Alesc
Imagem: Divulgação/Assessoria imprensa

Colega de Lopes na Alesc, a deputada Ana Paula da Silva (PDT), a Paulinha - que foi alvo de ataques nas redes sociais por ter ido à posse, em janeiro, com um macacão vermelho decotado -, votou a favor do projeto e criticou a atitude do pesselista.

"Obviamente que nosso colega foi infeliz. Não sei como é que uma pessoa pode pensar desse jeito", disse a deputada, que, no entanto, creditou a fala de Lopez à falta de conhecimento. "É claro que ele não é a favor do estupro. Não acho que é maldade da parte dele. Mas é muita desinformação e uma limitação ideológica, e ele não consegue avançar. É uma pena", disse.

Ela afirmou que, ao ouvir o deputado durante a sessão, até pensou em pedir a palavra e rebatê-lo, mas desistiu. "Não ia mudar o processo de votação. O projeto da minha colega seria aprovado porque não é a primeira vez que ele fala isso e, dessa vez, ninguém deu importância."

Cultura do estupro

Para o deputado Jessé Lopez, falar em cultura do estupro é incorreto porque faria subentender que "todos os homens são potenciais estupradores". "Quem, em sã consciência, cultua o estupro?", questionou ele, para quem o estuprador não é um homem comum, e sim um psicótico.

Pensamento que, segundo a promotora Fabíola Sucasas, assessora do Centro de Apoio Cível em Direitos Humanos do Ministério Público de São Paulo, é equivocado.

Existe a mística de que o estuprador vai saltar no terreno baldio, e geralmente seria um homem negro, e vai atacar. Mas não, o perigo mora ao lado. Muitas vezes é o homem trabalhador, que vai à igreja e dá presente no natal. promotora Fabíola Sucasas

De acordo com a nota técnica "Estupro no Brasil: uma radiografia segundo os dados da Saúde", publicada em 2014 pelo Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), 11,8% dos casos de estupros de crianças, por exemplo, são cometidos por pais, 12,3 por padrastos e 32,2% por amigos ou conhecidos das vítimas.

A promotora disse que iniciativas como a da deputada Luciane são importantes. "Interessante louvar a iniciativa desse PL. No meu entender, retrata um avanço na compreensão do que significa a violência sexual contra a mulher", disse.