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"Assim, não vejo a menor possibilidade de o Governo dar certo", diz Collor

Eduardo Anizelli/Folhapress
Imagem: Eduardo Anizelli/Folhapress

Do UOL, em São Paulo

03/11/2019 10h09

Ex-presidente da República a atual senador, Fernando Collor de Mello concedeu uma entrevista para o "Correio Braziliense" na qual traçou um paralelo entre o seu governo e o atual de Jair Bolsonaro. Dizendo já ter "visto este filme", Collor evitou falar sobre um possível impeachment, mas vê características que remetem ao ocorrido durante sua passagem pelo Palácio do Planalto.

"Olhe, continuando assim, eu não vejo a menor possibilidade de este governo dar certo. O que acontecerá, eu não saberia dizer. Mas, se continuar do jeito que está, o governo não tem como levar adiante o período governamental", disse, ao ser questionado sobre se o desfecho do atual Governo poderia ser o mesmo do que o seu.

Collor enfrentou um processo de impeachment em 1992 e deixou o cargo menos de três anos depois de tomar posse. Ele diz que um de seus erros foi não ter construído um melhor relacionamento com o Congresso Nacional e com a classe política, situação que ele também enxerga no Governo Bolsonaro.

"É um filme que eu já vi, embora haja diferenças entre o início do governo (do presidente Jair) Bolsonaro e o início do meu governo, parece que está passando novamente na minha frente. Certos episódios e eventos me deixam muito preocupado, talvez não cheguemos a um bom termo sobre o mandato mal exercido pelo presidente da República — a começar por essa falta de interesse em construir uma base sólida de sustentação no Parlamento. Partindo-se do princípio de que, sem maioria no Congresso, não se governa — isso é uma condição sine qua non em um regime presidencialista, mas também no parlamentarista", disse.

"O desinteresse em construir essa maioria nos leva a temer um desenlace diferente do que gostaríamos. E, num clima de ingovernabilidade, tudo pode acontecer. Foi um descuido de minha parte (referindo-se ao próprio mandato, entre 1990 e 1992), nesse ponto, eu vejo a semelhança de não ter me preocupado, não ter dedicado a atenção devida desde o início do meu governo a um melhor relacionamento com a classe política. O presidente da República precisa entender que ele é o líder político da nação. Como líder político da nação, ele tem por dever fazer política, e fazer política pelos caminhos institucionais, com os partidos políticos e com os políticos. Querer quebrar uma regra de ouro de um processo democrático, é um nonsense", completou.

Collor ainda disse que se sentiu um super-homem ao ser eleito. "É claro que, quando me elegi, eu disse: 'Bom, sou um um super-homem ( ?) Essa questão da eleição em que se ganha com uma disputa muito acirrada, e essa coisa toda, faz do vitorioso a primeira sensação de que: 'não, eu posso tudo. Agora, eu sou o maioral e, agora, todos os outros têm que se submeter à minha vontade, ao meu desejo'. Isso é um erro, e está acontecendo agora", disse.

Para ele, Bolsonaro está incorrendo a um erro ao não adotar um tom conciliador. "Isso é um perigo. O presidente incorre num erro grande, na minha avaliação, quando ele delimita a sua interlocução a um nicho de 15%, 20% da população, que são aqueles considerados bolsonaristas puros de origem. Eles não representam a nação brasileira", afirma.

Por último, ele traçou um paralelo entre o PSL, atual partido de Jair Bolsonaro, e o PRN, sigla pela qual foi eleito em 1989.

"Sim (existe semelhança). O eleitorado deu ao presidente, além da sua eleição, um grupo de 53 deputados para, a partir desse núcleo, ele construir uma maioria. Mas ele cria essa confusão enorme, agora entrando na Procuradoria-Geral da República, pedindo para levantar as contas do partido, colocando uma série de suspeições em relação ao presidente do partido (o deputado Luciano Bivar, PSL-PE). Esse filme, repito, eu já vi", disse.

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Errata: este conteúdo foi atualizado
Diferentemente do informado no terceiro parágrafo do texto, Collor ficou na Presidência do Brasil por mais de dois anos, tomando posse em março de 1990 e deixando o cargo em dezembro de 1992. Anteriormente, o texto dizia que ele exerceu o mandato por menos de dois anos. Também estava errada a informação sobre o mês em que ele assumiu. Foi em março, não em setembro de 1990. Os erros foram corrigidos.