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Análise: Witzel cometeu ilegalidade ao divulgar conversa com Mourão?

O governador do Rio, Wilson Witzel (PSC) - André Melo Andrade/Am Press & Images/Estadão Conteúdo
O governador do Rio, Wilson Witzel (PSC) Imagem: André Melo Andrade/Am Press & Images/Estadão Conteúdo

Gabriel Sabóia

Do UOL, no Rio

27/01/2020 17h45

Resumo da notícia

  • Especialistas divergem sobre suposta ilegalidade de Witzel ao publicar conversa com Mourão sem autorização prévia
  • Um dos juristas ouvidos afirma que a veiculação do diálogo constitui crime e viola o Código Penal
  • O outro jurista consultado pelo UOL afirma não ver qualquer problema no ato

Juristas ouvidos pelo UOL divergem sobre se houve algum tipo de ilegalidade por parte do governador do Rio, Wilson Witzel (PSC), ao publicar um vídeo em sua conta no Twitter no qual liga para o presidente da República em exercício, Hamilton Mourão (PRTB), com o viva voz ligado, e fala sobre as chuvas que atingiram o estado.

Mourão não sabia que o contato estava sendo gravado enquanto conversava com Witzel, na tarde de ontem, sobre a ajuda que o governo federal daria ao estado. A divulgação do telefonema foi criticada tanto por Mourão —que a definiu como antiética— como pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido), que tem o governador do Rio como desafeto político.

Para o doutor em direito constitucional e professor da PUC-SP, Erick Pereira, o governador —que é ex-juiz federal— teria violado o Artigo 153 do Código Penal.

"Em que pese o interesse ser meramente eleitoreiro, estarrece a revelação do diálogo porque caracteriza crime, tanto pela Lei de Segurança Nacional, quanto pelo Código Penal. O artigo 153 prevê detenção de um a seis meses, ou multa, 'para quem divulgar sem justa causa, conteúdo de documento particular ou de correspondência confidencial, de que é destinatário ou detentor, e cuja divulgação possa produzir dano'", explica.

De acordo com o advogado, o vice-presidente da República deveria estar ciente da divulgação e consentir com o eventual compartilhamento. Apesar da crítica, Mourão afirmou hoje que o assunto está superado.

Em dissonância com Erick Pereira, o professor de direito constitucional da PUC-RJ Manoel Peixinho diz que Witzel não cometeu crime ao divulgar o conteúdo.

Ele argumenta que, por ter sido o autor do telefonema, Witzel não precisaria pedir autorização e que, portanto, não há qualquer irregularidade. Para Peixinho, o debate tange somente o campo ético e político.

"Quando a pessoa liga, não há a necessidade de pedir autorização. É uma ligação em 'defesa própria', de interesse público. Não há irregularidade. O que ele não poderia era fazer uma interceptação de terceiros, gravar outras duas pessoas conversando entre si. É claro que há um debate ético e político que pode ser travado, mas juridicamente não vejo problema. Até aconselho a clientes meus que estão sendo acusados de assédio moral a gravar telefonemas feitos por ele. É a chamada 'ligação de defesa própria'", explica.

Questionado sobre o vídeo gravado por Witzel, Mourão disse que o governador fluminense "esqueceu a ética e a moral".

Em relação ao governador Wilson Witzel, ele diz que foi fuzileiro naval. Eu acredito que ele esqueceu a ética e a moral que caracterizam as Forças Armadas quando saiu do corpo de fuzileiros navais. Nada mais tenho a dizer a respeito

Hamilton Mourão, vice-presidente da República

Depois do mal-estar, Witzel divulgou uma nota para explicar a publicação da conversa com Mourão, na qual o chama de "presidente". Segundo o comunicado, tudo se tratou de uma "conversa de trabalho".

"O vídeo divulgado nas redes sociais do governador Wilson Witzel tem somente a intenção de tranquilizar os moradores de cidades do noroeste do estado, fortemente atingidas pelas chuvas e, em função disso, sem item básico neste momento que é água para consumo", diz a nota.

Horas depois, Witzel disse no Twitter que o telefonema para Mourão "foi para mostrar união, pedir apoio e dar satisfação ao povo e aos prefeitos em uma hora tão difícil".