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Por reeleição, Alcolumbre testa força no Senado e desagrada antigos aliados

1º.fev.2019 - Os senadores Kátia Abreu (PDT-TO), Davi Alcolumbre (DEM-AP) e Renan Calheiros (MDB-AL) em sessão conturbada para a escolha do presidente do Senado - Marcelo Chello/CJPress/Estadão Conteúdo
1º.fev.2019 - Os senadores Kátia Abreu (PDT-TO), Davi Alcolumbre (DEM-AP) e Renan Calheiros (MDB-AL) em sessão conturbada para a escolha do presidente do Senado Imagem: Marcelo Chello/CJPress/Estadão Conteúdo

Luciana Amaral

Do UOL, em Brasília

02/03/2020 04h00

Resumo da notícia

  • Presidente do Senado cogita mudança da Constituição ou regimento interno do Senado para se reeleger
  • Insatisfeitos, senadores próximos veem aproximação de chefe da Casa com Renan e 'velha política'
  • Colegas falam em traição e manobra ilegal e dizem que tentarão impedir mudança na regra

Em tentativa de se reeleger como presidente do Senado em 2021, Davi Alcolumbre (DEM-AP) testa a própria força na Casa para mudar a Constituição Federal e desagrada antigos aliados.

Hoje, tanto o chefe do Senado como o da Câmara não podem disputar reeleição na mesma legislatura. A Constituição diz que o mandato é de dois anos — para mudar a regra é necessária uma PEC (Proposta de Emenda à Constituição).

No final do ano passado, quando questionado sobre o assunto, Alcolumbre afirmou que, "se alguém levantar esta possibilidade, vou estar à disposição". Nos bastidores, ele já comenta a intenção com aliados e sonda a força de um parecer favorável.

Alcolumbre se elegeu presidente do Senado em 2 de fevereiro de 2019, com a bênção do atual ministro da Cidadania, Onyx Lorenzoni (DEM), após um processo conturbado em plenário. Houve anulação da primeira votação, depois que foram registrados mais votos que senadores presente, desistência de candidaturas e o STF (Supremo Tribunal Federal) determinando voto secreto.

Senado e Câmara teriam que aprovar PEC

Uma PEC precisa ser aprovada tanto no Senado quanto na Câmara dos Deputados. Se realmente seguir nesse caminho, Alcolumbre deverá ter mais facilidade no Senado do que na Câmara, onde já há fila de candidatos para suceder o presidente Rodrigo Maia (DEM-RJ) e, por isso, a resistência de deputados deve ser maior.

Se optasse por aproveitar a eventual mudança da PEC e se candidatasse à reeleição, Maia tentaria um quarto mandato consecutivo, porque o primeiro foi um tampão após a renúncia de Eduardo Cunha (MDB), hoje preso no âmbito da Operação Lava Jato. Ainda assim, sua candidatura não era ponto pacífico e Maia se apoiou em um parecer para prosseguir com a vontade.

Embora no Senado as pretensões de Alcolumbre aparentem ter vida mais tranquila, antigos aliados dele na eleição do ano passado já demonstram descontentamento e afirmaram ao UOL acreditar que hoje ele não tem os votos necessários — pelo menos 41 a favor. Ponderam, porém, que a situação pode mudar até o final do ano.

Um senador aliado de Alcolumbre, ouvido pela reportagem sob a condição de anonimato, acredita que o presidente conseguirá aprovar uma PEC ou achar uma brecha no regimento interno se reunir as condições políticas.

"A gente sabe que, tendo os votos, Alcolumbre consegue um parecer técnico da assessoria do Senado que permita a ele concorrer à reeleição. Acaba se dando um jeito", disse.

Outro senador, que apoiou Alcolumbre na eleição, mas hoje não repetiria a ação, concorda. "Se conseguir [voto], vai ser arranjando um jeito de fazer o jurídico [do Senado] passar."

No início de 2019, o atual presidente do Senado foi visto como alguém de confiança da equipe de Bolsonaro que enfrentaria a tida velha política, em especial o então candidato ao comando da Casa Renan Calheiros (MDB-AL).

A senadora Simone Tebet (MDB-MS) já havia enfrentado Renan internamente no MDB, mas ele acabou sendo escolhido como o candidato oficial da bancada do partido.

Em plenário, Alcolumbre concorreu com Renan, Esperidião Amin (PP-SC), Angelo Coronel (PSD-BA), Reguffe (Podemos-DF) e Fernando Collor de Mello (Pros-AL).

Antes, Alvaro Dias (Podemos-PR), Major Olímpio (PSL-SP) e Simone Tebet — que decidiu então participar de forma avulsa — renunciaram às candidaturas em favor de Alcolumbre para que juntassem votos e derrotassem Renan, candidato pela quinta vez.

No final, o emedebista também renunciou na segunda votação alegando que o processo não era mais democrático após os senadores optarem por revelar os próprios votos.

A insatisfação de antigos aliados

A percepção de antigos aliados, que não se limita aos que renunciaram em favor de Alcolumbre, é que ele não cumpriu o que prometeu para ser eleito.

Apontam, por exemplo, que Alcolumbre barrou a CPI da Lava-Toga, que investigaria integrantes de Cortes superiores do Judiciário, e não pautou em plenário projeto que modifica o Código de Processo Penal para permitir a prisão após condenação em segunda instância. Na quarta-feira (19), um grupo de 43 senadores — maioria do Senado — apresentou pedido para que o presidente retome a iniciativa, sem resposta até o momento.

Mais um ponto de insatisfação é que Alcolumbre se aproximou de Renan ao longo do ano passado, dizem senadores ouvidos pela reportagem.

"Como é que ele pode hoje ficar do lado do desafeto? Ouvir conselhos, apoiar e ser apoiado. Era tudo o que a gente não queria. O Senado ainda perdeu protagonismo para a Câmara. Se apequenou", afirma um.

Outro avisa que, se Alcolumbre seguir com o projeto de reeleição, o grupo vai expor as discórdias publicamente na esperança de ganhar o apoio da população.

"Se colocar em pauta [a possibilidade da reeleição], vamos chiar. Não vamos permitir. Já nos sentimos traídos", afirmou.