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Cerceado por isolamento e cloroquina, Teich não comenta exames de Bolsonaro

O presidente Jair Bolsonaro e o ministro da Saúde, Nelson Teich - DIDA SAMPAIO/ESTADÃO CONTEÚDO
O presidente Jair Bolsonaro e o ministro da Saúde, Nelson Teich Imagem: DIDA SAMPAIO/ESTADÃO CONTEÚDO

Carolina Marins*

Do UOL, em São Paulo

14/05/2020 01h30

A divulgação dos exames feitos pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) para detectar a covid-19 foi o assunto do dia ontem, mas não foi alvo de manifestação do ministro da Saúde, Nelson Teich. Depois de uma reunião com o presidente na manhã de quarta, Teich cancelou a entrevista coletiva que faria sobre a situação do combate à pandemia depois que seu plano para o isolamento foi rejeitado por estados e municípios.

Havia expectativa de que ele usasse comentasse na ocasião os resultados, assim como esclarecesse os planos já anunciados para as medidas de restrição da circulação no país.

Os exames feitos pelo presidente em março deste ano deram negativo para a covid-19, a doença causada pelo novo coronavírus, e foram tornados públicos pelo ministro Ricardo Lewandowski. Apesar de haver dito que seu resultado era negativo, Bolsonaro relutava em mostrar os exames e só o fez após ação movida pelo jornal O Estado de S. Paulo.

Além do isolamento social, que passou a entrar em sua pauta nos últimos dias, Teich também é pressionado pelo presidente, que voltou a defender o uso da cloroquina, Na terça, o ministro pediu cautela e alertou que a cloroquina é um medicamento com efeitos colaterais e que qualquer prescrição deve ser feita com base em avaliação médica.

A postura é semelhante à adotada pelo seu antecessor, Luiz Henrique Mandetta (DEM), atitude essa que foi um dos motivos que levou à demissão dele da pasta.

Na tarde de quarta, porém, Bolsonaro disse que vai discutir com o ministro a ampliação do uso do medicamento e citou até sua mãe como exemplo.

"Vai ser discutido hoje com o ministro. O meu entendimento, ouvindo médicos, é que ela deve ser usada desde o início para quem está no grupo de risco, pessoas com comorbidades, com idade...", disse.

"Se fosse minha mãe, com 93 anos, eu vou atrás dela, pego o médico... claro que não vou forçar, mas tem muitos que concordam com esse tipo de medicamento e ela usaria. Enquanto não tiver medicamento comprovado no mundo, temos esse no Brasil que pode dar certo ou não, mas como não pode esperar quatro ou cinco dias, é melhor usar."

A cautela em defender a cloroquina por parte de Teich tem desagradado os apoiadores do presidente, que já pediram a demissão do ministro pelo Twitter.

Mesmo sem a apresentação em coletiva, o Ministério da Saúde divulgou os números de hoje do coronavírus no país. Em 24 horas, o número de óbitos confirmados aumentou em 749, e o de casos diagnosticados, 11.385.

Com um total de 188.974 pessoas já contaminadas o Brasil é hoje o sexto país em número de infectados segundo a Universidade Johns Hopkins. Com isso, já tem mais infectados que a França (178.184).

A lista é liderada pelos Estados Unidos, que registra 1.388.936 casos, seguido por Rússia, com 242.271, Reino Unido, com 230.985, Espanha, com 228.691, e Itália, 222.104.

Projeções apontam o cenário brasileiro nos próximos meses. Segundo dados divulgados esta semana pelo Instituto de métricas da Universidade de Washington, 88.305 pessoas podem morrer por covid-19 no país até 4 de agosto. Além disso, o pico de mortes diárias no Brasil deve acontecer em 1º de julho, com 1.024 óbitos em 24 horas.

Sobre as medidas para conter a crise econômica causada pela pandemia, Bolsonaro comentou disse que não houve falha por parte do governo federal na distribuição do auxílio emergencial de R$ 600 a trabalhadores sem carteira assinada. Segundo ele, "muita gente deu golpe". Para ele, "não existe falha nossa", mas sim "erro do próprio interessado".

Desde o lançamento do site e do aplicativo muitos trabalhadores têm reclamado de falhas técnicas no acesso, negativas injustificadas, erros na avaliação dos critérios, além de filas nas agências da Caixa para tirar dúvidas ou sacar o dinheiro. Também houve mudança de calendário e atraso no pagamento da segunda parcela, ainda sem data definida.

A crise política também ganhou novo capítulo por conta da denúncia feita pelo ex-ministro Sergio Moro. O ministro da Secretaria de Governo da Presidência, o general Luiz Eduardo Ramos, corrigiu dois trechos do próprio depoimento que prestou à Polícia Federal na terça-feira, o que levantou protestos da defesa de Moro.

Ramos foi ouvido no inquérito que tramita no STF para apurar as denúncias de Moro sobre suposta interferência política do presidente Jair Bolsonaro no comando da Polícia Federal.

Durante a noite, a deputada federal Carla Zambelli (PSL-SP) afirmou à PF que não conversou com o presidente sobre negociar a permanência de Moro no governo federal em troca de uma vaga de ministro no STF (Supremo Tribunal Federal).

Em abril, por meio de mensagens trocadas por telefone e divulgadas primeiro pelo "Jornal Nacional" e depois pela própria parlamentar, Zambelli aparece sugerindo a Moro que poderia trabalhar para uma indicação do então ministro ao STF caso ele aceitasse o delegado Alexandre Ramagem no comando da Polícia Federal. Moro respondeu que não estava "à venda".

*Colaborou Constança Rezende, do UOL, em Brasília