Por centrão e desconfianças, 'namoro' de Bolsonaro e Maia não deve vingar
Em meio a desconfianças mútuas e conversas do Planalto com o centrão que afetam o poder dentro da Câmara, o "namoro" do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), tem poucas chances de vingar e virar "casamento".
A estratégia de morde e assopra adotada por Bolsonaro se tornou rotineira e, por isso, não é possível vislumbrar uma aliança mais firme para o futuro, avaliaram parlamentares e interlocutores ouvidos pelo UOL.
Nas palavras do próprio Bolsonaro, ele e Maia voltaram a "namorar", após uma série de divergências públicas quanto à economia e à condução de políticas de saúde pública, durante a pandemia do novo coronavírus.
Entretanto, horas antes da declaração sobre esse "namoro", na semana passada, o presidente criticou Maia (sem citar seu nome) por entregar a relatoria da MP (Medida Provisória) da redução de salários e jornadas para o deputado oposicionista Orlando Silva (PCdoB-SP).
Disse a empresários que o presidente da Câmara "parece que quer afundar a economia para ferrar o governo e para talvez tirar um proveito político lá na frente. Maia se recusou a comentar a declaração de forma direta.
O "namoro" anunciado por Bolsonaro é só para inglês ver. Na prática, vão manter apenas uma relação institucional necessária entre os Poderes e que sirva às ambições de ambos, apontam interlocutores.
Segundo Maia, em visita ao Planalto de última hora, a convite de ministros militares na semana passada, Bolsonaro teria sido persuadido a convidá-lo para um café, quando ele já estava no palácio.
O desconforto de Maia era visível em vídeo obtido pelo UOL. Sem máscara, descumprindo lei do Distrito Federal, Bolsonaro cumprimentou Maia lhe dando as mãos. O presidente da Câmara, com a proteção facial, ofereceu o cotovelo. Bolsonaro estava mais sorridente, e Maia, com semblante mais sério.
Ambos buscam apoio do centrão para comandar Câmara
O pano de fundo mais recente nas divergências entre os dois é a disputa de poder pelo comando da Câmara nos próximos dois anos. Ambos querem, e precisam, do centrão ao seu lado. As eleições internas da Casa estão previstas para fevereiro de 2021.
O grupo informal é composto por Republicanos, PL, PP (Progressistas), PSD, Solidariedade, PTB, Pros e Avante, enquanto DEM e MDB resistem em ser denominados como do centrão. Juntos, contabilizam 220 dos 513 deputados federais.
A não ser que consiga aprovar uma mudança na Constituição, o que hoje parece pouco provável, Rodrigo Maia não pode mais se reeleger à Presidência da Câmara. No entanto, quer fazer seu sucessor e tem o centrão como base de sustentação. A preferência dele vai para um dos líderes do grupo, o líder da maioria Aguinaldo Ribeiro (PP-PB).
Nas últimas semanas, Bolsonaro estreitou negociações com o centrão, na tentativa de construir uma base aliada no Congresso Nacional. Os partidos emplacam nomes para cargos no governo federal, segundo parlamentares e interlocutores do Planalto, já que o presidente da República busca apoio na Câmara e no Senado para aprovar projetos de seu interesse e barrar um eventual pedido de impeachment.
O responsável pelo aceite do início do processo de impeachment é justamente o presidente da Câmara, que, por enquanto, pede "paciência". Um presidente precisa de 172 votos contrários ao processo de impedimento, para barrá-lo e arquivá-lo.
Essa movimentação de Bolsonaro junto ao centrão dificulta os planos de Maia na Câmara, pois o presidente tem demonstrado preferência por outros integrantes do grupo: Arthur Lira (PP-AL) e Marcos Pereira (Republicanos-SP).
A disputa já apareceu até mesmo em plenário, quando da votação da Medida Provisória que amplia a regularização fundiária por autodeclaração. Maia defendeu o adiamento da pauta. Lira queria a análise imediata, assim como o governo. O atual presidente da Câmara acabou levando a melhor, mas considera-se que ganhou somente a primeira batalha da guerra.
As conversas de Bolsonaro com o centrão também dividem a base com a qual Maia se reelegeu à presidência da Câmara. A maioria dos partidos provavelmente verá maior vantagem em ficar ao lado do Planalto, a depender das propostas palacianas de cargos e da liberação de emendas.
Para continuar no páreo, Maia minimizou falas de Bolsonaro e aceitou ir ao Planalto. Ao mesmo tempo, não pode se aproximar demais do Planalto, para não perder o eventual apoio dos cerca de 130 deputados da oposição. Tê-los ao seu lado pode ser crucial para eleger seu sucessor no comando da Casa. Portanto, esse cálculo precisa ser feito para equilibrar a balança.
Incômodo de Maia com ataques de bolsonaristas
Nos bastidores, o presidente da Câmara critica Bolsonaro por ir a manifestações que pedem o fechamento do Congresso Nacional, o que atenta contra a Constituição, e ser instável em decisões governamentais que afetam votações no Parlamento.
Maia também desconfia que o presidente autoriza ataques a quem considera adversário político nas redes sociais. Ele já foi alvo do fogo de blogueiros e apoiadores mais ferozes de Bolsonaro no Twitter, como os próprios filhos do presidente.
Embora não passe despercebido em ataques de bolsonaristas, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), mantém uma melhor relação com Bolsonaro do que Maia e, publicamente, evita se colocar nas brigas dos dois. Por isso, não foi ao Planalto junto com Maia na semana passada.
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