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Conselho do MP pune Deltan com censura por críticas a Renan Calheiros

Felipe Amorim e Vinicius Konchinski

Do UOL, em Brasília, e colaboração para o UOL, em Curitiba

08/09/2020 12h27Atualizada em 08/09/2020 14h37

O CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público) decidiu hoje, por maioria de votos, aplicar a pena de censura ao procurador da República Deltan Dallagnol, em processo movido pelo senador Renan Calheiros (MDB-AL).

O processo foi apresentado ao CNMP pelo emedebista no ano passado, quando ele disputava a presidência do Senado contra Davi Alcolumbre (DEM-AP). Renan alega que Deltan tentou interferir nas eleições, prejudicando sua candidatura, o que seria uma forma de exercer atividade política, atuação proibida a membros do Ministério Público.

A decisão de hoje foi tomada por 9 votos a 1. Votaram a favor da punição os conselheiros Otavio Rodrigues, Oswaldo D'Albuquerque, Sandra Krieger, Fernanda Marinela, Luciano Maia, Marcelo Weitzel, Sebastião Caixeta, Luiz Fernando Bandeira de Mello Filho e Rinaldo Reis Lima. Apenas o conselheiro Silvio Amorim votou contra a punição.

O conselheiro Otavio Rodrigues, relator do processo, afirmou em seu voto que as manifestações de Deltan poderiam comprometer a imagem de isenção do Ministério Público. Ele comparou as críticas de Deltan à possibilidade de o procurador-geral da República atacar publicamente um candidato a presidente, o que também seria considerado inadequado.

"Reduzir este caso a um debate sobre liberdade de expressão é ignorar os imensos riscos à democracia quando se abre as portas para agentes não eleitos, vitalícios e inamovíveis disputarem espaços, narrativas e, em última análise, o poder com agentes eleitos", disse Rodrigues.

A pena de censura é a segunda na escala de gravidade prevista na legislação do Ministério Público: advertência, censura, suspensão e demissão ou cassação da aposentadoria.

Após o julgamento, Renan Calheiros afirmou que a punição é "branda" e disse que vai processar Dallagnol na Justiça em busca de reparação por danos morais.

O desgaste de Deltan

Na última semana Deltan anunciou ter deixado o comando da Operação Lava Jato no MPF (Ministério Público Federal) de Curitiba — a força-tarefa vem enfrentando pressão e questionamentos da Procuradoria-Geral da República, chefiada por Augusto Aras, com quem se envolveu em conflito sobre o sigilo dos dados sob investigação no Paraná.

Deltan, que atribuiu sua saída à necessidade de se dedicar ao tratamento de saúde da filha, teve sua atuação na Lava Jato posta em xeque após a divulgação em 2019 de diálogos e documentos obtidos pelo The Intercept Brasil.

As mensagens trocadas expuseram sua relação com o então juiz Sergio Moro e também um plano de negócios de eventos e palestras que Deltan a partir de contatos obtidos durante as investigações da Lava Jato.

Em novembro do ano passado, Dallagnol havia sido punido com uma advertência pelo CNMP por críticas a ministros do STF durante entrevista a uma rádio.

Já no mês passado, o Conselho do MP decidiu arquivar processo contra o procurador movido pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) por causa da apresentação de denúncia contra o petista feita com o auxílio de um PowerPoint.

Em nota divulgada hoje, os procuradores da força-tarefa da Lava Jato afirmaram que a decisão do conselho "diminui o espaço de contribuição de membros do Ministério Público para a democracia do país". Os procuradores disseram discordar da decisão e manifestaram seu apoio a Dallagnol.

Entenda o caso Renan x Deltan

À época da eleição no Senado, ocorrida em fevereiro de 2019, era debatido se a votação poderia ser aberta, posição defendida pelo procurador. Renan acabou renunciando à candidatura.

Em uma das postagens feitas antes da eleição, Deltan escreveu no Twitter: "Se Renan for presidente do Senado, dificilmente veremos reforma contra corrupção aprovada".

Na decisão de hoje, o CNMP entendeu que não houve atuação política de Deltan, mas que o procurador deixou de cumprir o dever profissional de atuar com decoro.

O processo voltou à pauta do conselho após decisão do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Gilmar Mendes, que liberou o julgamento da ação pelo CNMP.