Ex-chefe de gabinete de Flávio Bolsonaro pagava aluguel de Léo Índio
Mariana Mota, ex-chefe de gabinete de Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), fez pagamentos de despesas locatárias de uma quitinete no centro do Rio, onde morava Leonardo Rodrigues de Jesus, o Léo Índio, primo do atual senador. O dinheiro provinha da conta de Mariana, no período em que Flávio foi deputado estadual e que Léo constava como seu assessor na Alerj (Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro), ao longo de 2007.
Os dados mostram ainda que Mariana recebeu em sua conta repasses de funcionários do gabinete de Flávio.
Foram cinco pagamentos em benefício de Léo Índio. Em fevereiro de 2007, Mariana fez uma transferência identificada como "al.leo" para Norival Dantas, que alugava imóvel para Leo Índio. O valor foi de R$ 503. No mês seguinte, repetiu a operação para Dantas, no valor de R$ 460 — dessa vez, anotou "condomin".
Em maio, outra transferência, identificada como "leo" e valor de R$ 503. Em julho do mesmo ano, outra operação chamada de "aluguel", no total de R$ 500. Em agosto, mais R$ 500 com anotação "leo".
Procurado desde quarta-feira (10), o senador Flávio Bolsonaro não respondeu aos questionamentos da reportagem. Léo Índio também não respondeu. Mariana Mota disse que "queria se dar ao direito de não responder".
Esta é uma das quatro reportagens realizadas pelo UOL a partir da análise de dados de 100 quebras de sigilos bancários de investigados no caso da "rachadinha" do gabinete de Flávio Bolsonaro, quando ele era deputado estadual na Alerj.
O UOL teve acesso às quebras de sigilo em setembro de 2020, quando ainda não havia uma decisão judicial contestando a legalidade da determinação da Justiça fluminense, e veio, desde então, analisando meticulosamente as 607.552 operações bancárias distribuídas em 100 planilhas -uma para cada um dos suspeitos. O STJ (Superior Tribunal de Justiça) anulou o uso dos dados resultantes das quebras de sigilos no processo contra Flávio, mas o Ministério Público Federal recorreu junto ao STF (Supremo Tribunal Federal). O UOL avalia que há interesse público evidente na divulgação das informações que compõem estas reportagens.
Possível operadora
Mariana também foi apontada pelo MP-RJ (Ministério Público do Rio de Janeiro) como uma possível operadora do esquema de "rachadinha" antes do policial militar da reserva Fabrício Queiroz.
Segundo o MP-RJ, de janeiro de 2007 a março de 2008, Mariana recebeu 15 transferências em sua conta, no total de R$ 39 mil, de outro assessor: Jorge Luis Souza. Os procuradores também apontaram diversos saques em espécie feitos por Mariana dentro do caixa da Alerj —no total, esses saques correspondem a 40% do que ela recebeu por trabalhar na casa.
Mariana é amiga e confidente de Ana Cristina Siqueira Valle, ex-madrasta de Flávio e segunda mulher de Jair Bolsonaro. Exerceu a chefia do gabinete do primeiro mandato de Flávio como deputado estadual, entre 2003 e 2007, ano em que Queiroz e o coronel Miguel Braga Grillo passaram a integrar o gabinete na Alerj. Braga Grillo é atual chefe de gabinete do filho mais velho de Jair no Senado.
O advogado Magnum Cardoso, que representa Mariana Mota, afirmou que "a defesa não irá se manifestar tendo em vista que o procedimento tramita sob sigilo." O advogado diz ainda "repudiar veemente o vazamento dessas informações, algo que vem se tornando rotina em se tratando desse procedimento."
Cardoso também representa Ana Cristina Siqueira Valle.
Pagamentos de aluguel
O aposentado Norival Dantas contou ao UOL que alugou uma quitinete no centro do Rio para o primo de Flávio. "É algum sobrinho do Bolsonaro? Já (alugou). Há muito tempo", disse Dantas. O locatário disse não se recordar direito dos pagamentos, mas afirmou que não conheceu Mariana Mota. "Ele me pagava às vezes em mãos, às vezes em depósito", contou.
Léo Índio também teve seu sigilo bancário quebrado no âmbito da investigação do caso da "rachadinha". Os dados mostram que ele fez pagamentos a Norival Dantas em meses de 2007 diferentes daqueles em que Mariana realizou transferências.
Entre os anos de 2006 e 2012, Léo Índio foi registrado como assessor de Flávio. De 2007 em diante, quando a quebra foi autorizada, o primo de Flávio recebeu R$ 427 mil líquidos da Alerj. Como outros funcionários investigados, Leo Índio também mantinha o padrão de sacar grandes quantias em dinheiro vivo. Nesse período, sacou mais de R$ 400 mil.
Léo Índio começou o ano de 2007 recebendo cerca de R$ 3.100 mil por mês. Em 2012, ganhava cerca de R$ 6.000 líquidos. Em muitos meses, assim que o salário entrava em sua conta, sacava a maior parte do dinheiro no mesmo dia ou até uma semana depois. Passou a maior parte dos seus últimos meses no cargo com a conta bancária negativa.
Em novembro do ano passado, Léo Índio foi nomeado como assessor parlamentar da primeira secretaria do Senado, que é comandada pelo senador Sérgio Petecão (PSD-AC), um aliado do governo Bolsonaro. Seu salário bruto (sem desconto) é de R$ 17.319,31. Antes desse cargo, ele estava lotado no gabinete do senador Chico Rodrigues (DEM-RR), flagrado pela Polícia Federal com dinheiro na cueca.
Mais repasses para Mariana Mota
O UOL identificou ainda que duas ex-assessoras de Flávio Bolsonaro na Alerj, Ana Amélia Soares e Angela Cerqueira, também repassaram para Mariana valores próximos a seus salários, no mês seguinte às suas exonerações — R$ 1.470 e R$ 900, respectivamente. Antes de perder o cargo, Angela também costumava sacar quase integralmente seus salários.
Angela é ex-cunhada de Fabrício Queiroz. Procurada, não retornou. Já Ana Amélia informou por meio de familiares que era professora e foi cedida para a Alerj, mas não quis responder aos questionamentos sobre o repasse.
Em depoimento ao MP-RJ, em julho do ano passado, Flávio Bolsonaro foi questionado sobre quem foram e como escolheu seus chefes de gabinete. Respondeu que não lembrava.
"São cargos em confiança. Então logo no início do mandato, formação de equipe, não lembro agora, de cabeça, as pessoas que passaram na chefia de gabinete minha", afirmou, sem fazer referência a Mariana Mota.
O MP-RJ denunciou Flávio, Queiroz e outros 15 assessores por diferentes crimes que incluem peculato (roubo de dinheiro público), lavagem de dinheiro e organização criminosa. Os investigadores apontam que ocorreu um desvio de R$ 6 milhões, dos quais pelo menos R$ 2 milhões passaram pela conta de Queiroz.
No entanto, novas denúncias podem surgir. Os investigadores descobriram que dez familiares de Ana Cristina fizeram saques que, no total, equivalem a 90% de seus salários. Nenhum deles tem qualquer prova de que prestou qualquer serviço a Flávio.
As provas que apontam lavagem de dinheiro na loja de chocolates, da qual Flávio Bolsonaro era sócio, também devem gerar uma nova acusação. O MP-RJ aguarda uma manifestação do Órgão Especial, segunda instância do TJ-RJ (Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro), que trata de casos dos deputados, para dar sequência ao caso.
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