Governo escala tropa de choque para blindar Bolsonaro na CPI da Covid
Em desvantagem numérica na CPI da Covid no Senado, o governo federal montou uma tropa de choque para tentar minimizar danos e blindar presidente Jair Bolsonaro (sem partido).
Na primeira reunião oficial hoje a partir das 10h, a CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) será instalada e seus membros elegerão presidente e vice. A tendência é que a presidência fique com Omar Aziz (PSD-AM), tido como independente, e a vice com Randolfe Rodrigues (Rede-AP), da oposição. O entendimento da maioria é que Renan Calheiros (MDB-AL) assuma a relatoria.
Apenas 4 das 11 vagas de titulares do colegiado são ocupadas por senadores considerados mais confiáveis pela base de Bolsonaro. Dentro da CPI, Ciro Nogueira (PP-PI), Jorginho Mello (PL-SC), Marcos Rogério (DEM-RO) e Eduardo Girão (Podemos-CE) serão a primeira linha de frente em defesa do governo.
Onyx e Ramos
Embora haja divergências internas nas estratégias de defesa a serem utilizadas pelo governo, Bolsonaro escalou o ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Onyx Lorenzoni, como o articulador político do Planalto com os senadores neste caso. Por ser deputado federal licenciado e já ter sido ministro da Casa Civil e da Cidadania, a justificativa é que ele tem mais experiência em negociações com parlamentares.
Onyx nunca aceitou o fato de ter perdido o poder da articulação política ao ser trocado na Casa Civil e, agora, na Secretaria-Geral — de trabalho mais burocrático como uma espécie de zeladoria do Planalto — quer retomar esse protagonismo, afirmam interlocutores do presidente.
O ministro-chefe da Casa Civil, Luiz Eduardo Ramos, foi designado para coordenar respostas e unificar os discursos do governo junto aos ministérios. A Casa Civil, inclusive, foi responsável por enviar a ministérios uma lista de 23 acusações frequentes sobre o desempenho do governo Bolsonaro no enfrentamento à covid-19, como revelou o UOL, numa tentativa de subsidiar o governo com respostas a críticas na CPI.
Segundo Ramos, as pastas tinham até a última sexta-feira para preparar as respostas e que a ideia é iniciar esta semana já com a argumentação do governo pronta.
Pazuello, "memória do governo na CPI"
O líder da oposição no Senado, autor de um dos requerimentos que deu origem à CPI e provável vice-presidente da comissão, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), afirmou que o governo entregou um "roteiro a ser seguido".
Parte da própria base de Bolsonaro no Senado enxergou a lista como uma espécie de confissão de crimes. Sob reserva, um líder governista chamou o documento de "coisa de gente maluca".
Na intenção do Planalto, o ex-ministro da Saúde general Eduardo Pazuello e seu então número dois na pasta, coronel Élcio Franco, serão a "memória" da defesa do governo na CPI com o histórico de documentos e acontecimentos.
Élcio foi nomeado como assessor especial da Casa Civil após sair do Ministério da Saúde. O UOL apurou que o coronel é amigo de longa data de Ramos e que este o considerou um "burro de carga" na antiga pasta. Portanto, não quis deixá-lo "desassistido". A tendência é que Pazuello também ganhe um cargo no Planalto em breve.
Ao mesmo tempo, Pazuello e Élcio deverão ser uns dos principais alvos de senadores críticos ao governo na CPI.
A reportagem apurou que até senadores governistas já enviaram a integrantes do Planalto fotos e vídeos de Pazuello sem máscara em shopping em Manaus para exemplificar como será difícil defender certas atitudes de integrantes do governo em meio à pandemia. De qualquer maneira, para o Planalto, é melhor as acusações serem direcionadas aos dois militares do que a Bolsonaro.
Além dos citados, o governo conta com as declarações e atuações de outros ministros para se defender. As pastas deverão subsidiar os senadores governistas com informações que possam rebater acusações e tirar o foco de eventuais erros de Bolsonaro. A estratégia do governo é tentar não personalizar a CPI em cima de Bolsonaro.
Alguns dos atuais ministros que devem ser chamados para depor na CPI são Marcelo Queiroga (Saúde), Carlos França (Relações Exteriores) e Paulo Guedes (Economia), por exemplo.
A ministra da Secretaria de Governo, Flávia Arruda, oficialmente a responsável pela articulação política entre Planalto e Congresso, deve ficar escanteada no momento. Ela sofre resistência de senadores por ser inexperiente e originária da Câmara dos Deputados. A ideia é que Flávia entre na articulação da CPI apenas se a comissão se tornar política em excesso.
O governo tentará apontar um mau uso de verbas por estados e municípios — já a oposição focará no negacionismo de Bolsonaro, atraso de vacinas, falta de remédios e gastos com cloroquina. Ambos os grupos deverão recorrer à ajuda de órgãos técnicos para a obtenção de dados, como o TCU (Tribunal de Contas da União).
Postos-chave da CPI devem ficar com críticos ao governo
Com apoio do Planalto, Eduardo Girão pretende concorrer à presidência da CPI contra Aziz. No entanto, até senadores governistas acreditam que ele só contará com os votos da tropa de choque de Bolsonaro dentro da comissão.
Apesar de a eventual posse de Renan na relatoria ter sido impedida por uma liminar concedida ontem pela Justiça, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), disse que a escolha do relator da CPI é uma questão interna da Casa que não admite interferência de um juiz. A decisão, porém, cabe ao presidente da CPI.
O nome de Renan como relator desagrada o Planalto. Renan tem atirado contra o governo nos últimos meses, é pai do governador de Alagoas e é visto pela base de Bolsonaro como alguém que buscará blindar os mandatários estaduais.
Passo a passo da CPI
Esta primeira reunião será semipresencial e presidida pelo senador mais velho da comissão, Otto Alencar (PSD-BA). Alguns senadores defendem que a CPI já vote requerimentos, como para a realização de depoimentos, e que haja a apresentação de um plano de trabalho.
Uma CPI pode convocar pessoas para depor, ouvir testemunhas, solicitar a análise de documentos e determinar diligências, entre outras ações. Ao seu final, a comissão pode compartilhar suas conclusões — pela mudança da legislação sobre o assunto pertinente, por exemplo — inclusive com o Ministério Público, para a responsabilização civil e criminal dos eventuais infratores.
A criação da CPI da Covid só tramitou após determinação do STF (Supremo Tribunal Federal). Antes, o requerimento que atendia a todos os critérios necessários estava parado havia cerca de dois meses na mesa do presidente do Senado, alçado ao cargo com a ajuda do Planalto.
A base aliada trabalhou para atrapalhar a criação da CPI, sem sucesso. Embora senadores governistas reconheçam que fatos se sobrepõem a qualquer outra argumentação, acreditam que a comissão será utilizada como plataforma eleitoral para 2022.
Bolsonaro deve tentar a reeleição e se preocupa com a força do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que já atrai parte do centrão a si. Atualmente, os partidos do centrão compõem a massa da base de Bolsonaro no Congresso.
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