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Renan ataca ações do governo, fala em "agenda da morte" e prega CPI isenta

Luciana Amaral

Do UOL, em Brasília

27/04/2021 14h38Atualizada em 27/04/2021 16h00

Relator da CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) da Covid, Renan Calheiros (MDB-AL) criticou ações do governo federal, como a designação de militares à frente do Ministério da Saúde em meio à pandemia da covid-19, e falou que "nossa cruzada será contra a agenda da morte".

O senador pregou isenção e imparcialidade à frente do trabalho no colegiado e negou que a CPI será uma "inquisição". No entanto, falou que eventuais culpados devem "ser punidos imediatamente e emblematicamente".

"Não foi por acaso o flagelo divino que nos trouxe a esse quadro [na pandemia]. Há responsáveis, evidentemente; há culpados por ação, omissão, desídia ou incompetência; e eles, em se comprovando, serão responsabilizados. Essa será a resposta para nos conectarmos com o planeta. Os crimes contra a humanidade não prescrevem jamais e são transnacionais. Milosevic e Augusto Pinochet são exemplos da história. Façamos a nossa parte."

"Podemos preservar vidas e temos a obrigação de fazer justiça, de apontar, com responsabilidade, equilíbrio e provas, os culpados por esta hecatombe. Quem fez e faz o certo não pode ser equiparado a quem errou. O erro não é atenuante; é a própria tradução da morte. O país tem direito de saber quem contribuiu para milhares de mortes, e eles devem ser punidos imediatamente e emblematicamente", acrescentou pouco depois.

Renan criticou fortemente o fato de um militar ter comandado o Ministério da Saúde no enfrentamento à pandemia, no caso, o general Eduardo Pazuello, e disse que o resultado fala por si só.

"O que teria acontecido se tivéssemos enviado um infectologista para comandar nossas tropas? Provavelmente um morticínio, porque guerras se enfrentam com especialistas, sejam elas guerras bélicas ou guerras sanitárias. A diretriz é clara: militar nos quartéis e médicos na saúde. Quando se inverte, a morte é certa, e foi isso que lamentavelmente parece ter acontecido. Temos que explicar como, por que isso ocorreu."

O senador ressaltou que a CPI investigará fatos e responsáveis por eles, não nomes ou instituições, e citou que não é o Exército brasileiro que estará sob análise.

Ao longo de sua fala, Renan fez outras críticas indiretas ao governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido). Renan citou ter "repugnância ao fascismo" ao dizer que intimidações "sob qualquer modalidade e arreganhos não nos deterão". E, segundo o senador, a CPI será "santuário" da ciência.

"O negacionismo em relação à pandemia ainda terá de ser investigado e provado, mas o negacionismo em relação à CPI da Covid já não resta a menor dúvida", afirmou.

O emedebista disse ter a intenção de convocar o atual ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, e os três gestores anteriores da pasta. Um plano de trabalho, já levando em consideração pedidos de convocação e de requerimentos de informação, com sugestões de colegas, deve ser analisado nesta quinta (29).

Os trabalhos da CPI devem acontecer de forma semipresencial. A expectativa é que o ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta compareça à CPI na próxima terça (4).

Renan comunicou que, além de ministros e ex-ministros, por exemplo, serão chamados a falar à CPI médicos, cientistas, laboratórios, agentes públicos, representantes de organizações de saúde e de conselhos de Medicina.

Uma CPI pode convocar pessoas para depor, ouvir testemunhas, solicitar a análise de documentos e determinar diligências, entre outras ações. Ao seu final, a comissão pode compartilhar suas conclusões — pela mudança da legislação sobre o assunto pertinente, por exemplo — inclusive com o Ministério Público, para a responsabilização civil e criminal dos eventuais infratores.

Como relator, Renan será o responsável por elaborar um parecer da CPI, a ser avaliado também pelos pares.

Renan alfineta Lava Jato

Renan Calheiros ainda aproveitou a oportunidade hoje para alfinetar a Operação Lava Jato, que também investigou o político, e exaltar o STF (Supremo Tribunal Federal), que declarou o ex-juiz Sergio Moro parcial ao condenar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no caso do tríplex no Guarujá. Há a possibilidade de Renan se aliar a Lula para as eleições de 2022.

"Não somos discípulos nem de Deltan Dallagnol, nem de Sergio Moro; não arquitetaremos teses sem provas ou Power Points contra quem quer que seja. Não desenharemos o alvo para depois disparar a flecha. Não reeditaremos a República do Galeão. Agindo com imparcialidade, a partir de decisões coletivas, sem comichões monocráticos, ninguém arguirá nenhum tipo de suspeição no futuro desse trabalho", disse.

"Faço ainda uma referência especial ao Supremo Tribunal Federal, que não tem faltado à nação brasileira na defesa altiva da nossa Constituição terrivelmente democrática", disse. A expressão foi parecida com uma utilizada por Bolsonaro ao dizer que escolheria como ministro da Corte alguém "terrivelmente evangélico", em julho de 2019.

Quando presidente do Senado, em 2016, Renan se recusou a receber notificação do Supremo sobre seu afastamento do cargo. Na época, o ministro do STF Marco Aurélio Mello concedeu liminar para Renan ser afastado da presidência do Senado por concordar que, quem é réu, não pode compor a linha sucessória à Presidência da República em resposta a um questionamento da Rede Sustentabilidade.

Governo sofre derrotas em primeira reunião da CPI

A primeira reunião da CPI da Covid realizada hoje representou uma série de derrotas para o governo federal. Senadores governistas — minoria na comissão — tentaram suspender a primeira reunião e impedir a indicação de Renan como relator do colegiado, sem sucesso.

Liminar da Justiça ontem barrou que Renan fosse escolhido como relator, atendendo a um pedido da deputada federal Carla Zambelli (PSL-SP), da base bolsonarista na Câmara, mas nova decisão de hoje pela manhã já a revogou.

De qualquer maneira, a maioria dos membros da CPI pretendia ignorar a primeira decisão judicial. A todo momento, os governistas questionaram a indicação de Renan por acreditarem que ele será parcial na elaboração de seu parecer, especialmente por ser pai do governador de Alagoas, Renan Filho.

O presidente eleito da CPI, Omar Aziz (PSD-AM), responsável pela indicação, perguntou a Marcos Rogério (DEM-RO), um dos vice-líderes do governo no Congresso, "qual o medo da CPI".

"É o medo da CPI ou o medo do senador Renan? Me diga você. É medo da CPI ou medo do senador Renan?"

Antes mesmo de ser anunciado oficialmente como relator, Renan já estava sentado na mesa destinada à direção da CPI.

A maioria dos membros ainda elegeu um senador independente, Omar Aziz, como presidente, e um opositor, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), como vice do colegiado. O primeiro recebeu 8 votos de 11 votantes. O segundo, 7. O resultado da votação seguiu o previsto pelo acordo firmado entre os senadores tidos como independentes e opositores ao governo, que compõem 7 dos 11 titulares.

Pelo resultado, um dos quatro governistas votou em Aziz. Mais tarde, o senador Ciro Nogueira (PP-PI), um dos principais líderes do centrão, hoje base aliada do Planalto no Congresso, confirmou que votou em Aziz, conforme havia prometido ao colega. Nogueira também afirmou não ver impedimento para Renan ser relator. Este, depois, o chamou de "amigo dileto"

O senador Eduardo Girão (Podemos-CE), autor originário de um dos requerimentos que pedia a CPI, também se candidatou à presidência da comissão e tinha a preferência do Planalto. Porém, recebeu apenas três votos. Girão defendia alternar a presidência da CPI com Randolfe, e ter Marcos Rogério, como relator.

Os titulares da CPI da Pandemia

  • Omar Aziz (PSD-AM), presidente
  • Randolfe Rodrigues (Rede-AP), vice-presidente
  • Renan Calheiros (MDB-AL), relator
  • Ciro Nogueira (PP-PI)
  • Eduardo Braga (MDB-AM)
  • Eduardo Girão (Podemos-CE)
  • Humberto Costa (PT-PE)
  • Jorginho Mello (PL-SC)
  • Marcos Rogério (DEM-RO)
  • Otto Alencar (PSD-BA)
  • Tasso Jereissati (PSDB-CE)

Suplentes:

  • Angelo Coronel (PSD-BA)
  • Alessandro Vieira (Cidadania-SE)
  • Jader Barbalho (MDB-PA)
  • Luis Carlos Heinze (PP-RS)
  • Marcos do Val (Podemos-ES)
  • Rogério Carvalho (PT-SE)
  • Zequinha Marinho (PSC-PA)