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Mandetta: Bolsonaro quer tirar foco da CPI da Covid ao criticar a China

Andreia Martins e Wanderley Preite Sobrinho

Do UOL, em São Paulo

06/05/2021 10h46Atualizada em 06/05/2021 12h41

O ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta (DEM-MS) vê as falas do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) contra a China como uma forma de "tirar o foco" da falta de gestão dele na pandemia e da CPI da Covid. Ontem, sem citar nominalmente a China e sem apresentar provas, Bolsonaro afirmou que o coronavírus pode ter sido criado a partir de um vírus de "laboratório".

"Acho que isso tem a ver com uma estratégia política dele [Bolsonaro] de manter uma base na internet. Acho que é mais para dar munição a essas pessoas e tirar o foco das análises que estão sendo feita pela imprensa, pela televisão, pela liderança tóxica que ele teve em relação à condução, e da CPI. Você tira o foco quando você cria uma agressão a China. As pessoas começam a discutir China e param de discutir aglomeração", afirmou Mandetta durante o UOL Entrevista.

A entrevista foi conduzida pela jornalista Fabíola Cidral, apresentadora do UOL, e pelos colunistas Tales Faria e Diogo Schelp.

"É uma irresponsabilidade muito grande, uma sensação de que você tem seu principal parceiro comercial com inimigo, ele fala de guerra química, produção de vírus em laboratório, que o país que mais cresceu foi a China, para criar uma narrativa", completou Mandetta.

O ex-ministro disse ainda que o presidente "optou por um caminho político" no enfrentamento da pandemia e que o alertou em várias ocasiões de que "não dá para tocar uma pandemia desta sendo hostil ao país que tem hoje cerca de 94% dos insumos que a gente precisa".

No ano passado, Bolsonaro tratou o vírus em várias oportunidades como o vírus chinês e chegou a comemorar em novembro a suspensão dos testes da vacina CoronaVac, produzida pelo laboratório chinês Sinovac em parceria com o Instituto Butantan, de São Paulo.

Tanto a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) quanto o Instituto Butantan dependem da chegada de IFA da China para envasar as vacinas Oxford/AstraZeneca e CoronaVac, respectivamente —as únicas com uso autorizado pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) no Brasil—, e atrasos nesse recebimento têm impactado na produção local dos imunizantes desde o fim do ano passado.

Mandetta —que deixou o ministério em abril do ano passado— falou que Bolsonaro não tem "toda" a responsabilidade pelas mortes por covid-19 no Brasil, mas criticou o antigo chefe pela condução política da crise, "um caminho muito perigoso".

"Veja bem, [Bolsonaro] não é o único responsável. O vírus atacou a humanidade, é um problema mundial. O mundo estava totalmente despreparado: os mecanismos internacionais, OMS [Organização Mundial da Saúde], ONU Organização das Nações Unidas], todos foram deficientes no enfrentamento de uma ameaça global", afirmou.

Agora, dentro de nosso país, tínhamos alguns caminhos a tomar. Eu optei pelo caminho técnico e o presidente optou pelo caminho político, um caminho muito perigoso, que tem influência direta no resultado lastimável que o país teve.
Luiz Henrique Mandetta, ex-ministro da Saúde, ao falar das 410 mil mortes pela covid

Ser presidente não é "meta de vida", diz Mandetta

Cotado como presidenciável em 2022, o ex-ministro negou que a cadeira de Bolsonaro seja uma "meta de vida", mas se colocou à disposição.

"Meta de vida não, mas meta de vida de ser indignado com a situação do Brasil. Enquanto me indignar, com certeza vou lutar", afirmou. "Agora, a gente pode lutar de várias maneiras. Não precisa necessariamente ser o presidente para colaborar."

Questionado se não estava sendo político com a resposta, Mandetta respondeu que estava "sendo tão franco a ponto de dizer: 'Olha, estou aqui, tenho uma visão de Brasil que representa uma parcela enorme que não querem votar nem em Lula, nem Bolsonaro'".

"Não acharam nada", diz Mandetta sobre sua gestão

O fracasso em convencer Bolsonaro a mudar de postura na pandemia foi o único erro de sua gestão, afirmou Mandetta, ao dizer que não tem medo de também acabar responsabilizado pela má condução da crise sanitária.

"Acho que já devem ter feito investigação para frente, para trás, para baixo... Pelo nível de perguntas que me fizeram, parece que procuraram muito e não acharam nada", afirmou.

Vou dizer de coração, fiz tudo o que eu achava correto, junto com uma equipe muito correta, muito focada. Agora, falam: Você não conseguiu convencer o presidente. Realmente.
Luiz Henrique Mandetta, ex-ministro da Saúde, sobre sua atuação na pandemia