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Aras silencia sobre ataques de Bolsonaro às eleições e irrita cúpula da PGR

Aras assumiu a PGR em setembro de 2019 e foi indicado por Bolsonaro para mais dois anos à frente da instituição - Reuters
Aras assumiu a PGR em setembro de 2019 e foi indicado por Bolsonaro para mais dois anos à frente da instituição Imagem: Reuters

Rafael Neves

Do UOL, em Brasília

13/08/2021 04h00

O presidente Jair Bolsonaro tem sido acionado no STF (Supremo Tribunal Federal), há quase dois meses, por seus ataques ao sistema eleitoral. Desde meados de junho, chegaram à Corte pelo menos três pedidos para que o presidente comprove suas acusações de fraude em eleições recentes e seja investigado por elas.

Estes processos estão à espera de um parecer do procurador-geral da República, Augusto Aras, que deve opinar sobre quais providências devem ser tomadas em relação a Bolsonaro. Até o momento, contudo, Aras não se posicionou em nenhum deles.

Relator de uma das ações contra Bolsonaro, o ministro Dias Toffoli fez ontem uma cobrança direta a Aras para que se manifeste no caso. O processo foi aberto no dia 21 de julho a pedido do senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE), pedindo que o presidente comprove suas "reiteradas declarações" de que as eleições de 2018 foram fraudadas.

Aras emitiu um despacho no dia 4 de agosto, mas apenas para manifestar ciência de uma decisão da ministra Rosa Weber reconhecendo que o caso não tinha urgência. Toffoli, porém, cobrou de Aras uma posição sobre o mérito do pedido de Vieira. "Entendo imprescindível colher sua manifestação", escreveu Toffoli.

A PGR também ainda não se posicionou sobre um caso mais antigo, aberto no STF em 18 de junho, a pedido da Rede Sustentabilidade. Por meio de um mandado de segurança, o partido fez um pedido semelhante ao de Vieira: que Bolsonaro seja obrigado a comprovar as alegadas fraudes eleitorais que vem citando.

No dia 24 de junho, o ministro Gilmar Mendes, relator do caso, determinou que Bolsonaro e a AGU (Advocacia-Geral da União) se manifestassem em dez dias e, na sequência, que a PGR também se posicionasse. O governo se manifestou, mas até o momento não há nenhum parecer de Aras no processo.

O UOL perguntou à PGR o motivo da falta de manifestação nos dois casos. Sobre a petição de Vieira, a instituição alega que o despacho inicial do processo, da ministra Rosa Weber, apenas determinava que o caso não se enquadrava na situação de urgência. "Ou seja, não se manifestou no mérito porque sequer houve pedido do relator", justificou a PGR.

A respeito da petição da Rede, a instituição afirma que o processo "sequer chegou à PGR para manifestação", apesar do despacho de Gilmar Mendes. O UOL consultou o STF para saber por que a PGR não foi intimada, mas não obteve resposta.

Há ainda um processo mais recente, aberto a partir de uma notícia-crime protocolada por dez deputados do PT. Os parlamentares querem que Bolsonaro seja investigado por suspeita de improbidade administrativa e crimes eleitorais pela live feita no dia 29 de julho, em que atacou, sem provas, a integridade do voto eletrônico.

Neste caso, a ministra Cármen Lúcia pediu manifestação de Aras no dia 4 de agosto. Até o momento, não houve resposta. Questionada, a PGR afirmou que ainda está dentro do prazo para manifestação.

Revolta crescente

Aras chegou ao comando da PGR em setembro de 2019. Ele foi indicado por Bolsonaro para o cargo, apesar de não fazer parte da lista tríplice da ANPR (Associação Nacional dos Procuradores da República). No fim de julho, o presidente indicou Aras para um novo mandato de dois anos, desagradando novamente os indicados da lista tríplice.

Os procuradores preteridos na escolha não são, contudo, os únicos incomodados com a conduta de Aras. A omissão diante dos ataques de Bolsonaro às eleições levou um grupo de 27 subprocuradores-gerais a publicar um manifesto cobrando providências do PGR.

Os subprocuradores-gerais, que ocupam o topo da carreira do Ministério Público, defenderam que Aras deve "agir enfaticamente" contra as ameaças de Bolsonaro ao sistema eleitoral e ao STF. Para eles, Aras não tem o direito de "assistir passivamente aos estarrecedores ataques àquelas Cortes e a seus membros", já que estas agressões, segundo eles, são "inequívoca agressão à própria democracia".

Sob condição de anonimato, o UOL conversou com um dos signatários do documento. Para ele, o silêncio diante das atitudes de Bolsonaro tem tornado Aras cada vez mais isolado na cúpula da PGR. "Nós temos um PGR, hoje, que não tem nenhum respaldo, nenhum apoio interno. A gente vê que ele tem dificuldade até para formar equipes", afirmou.

Segundo este procurador, a percepção na PGR é que Aras "deu as costas" para as obrigações do Ministério Público. "Todos os PGR que chefiaram a instituição são passíveis de críticas. Mas nunca havíamos tido alguém que não dá a mínima importância para o desmonte institucional. É uma atitude completamente omissa", avalia.

Outro membro da PGR, que também falou ao UOL de forma anônima, avalia que Aras aposta em soluções políticas, e não jurídicas, para os choques entre Bolsonaro e as instituições. "É o que se viu no caso da proposta do voto impresso. A solução não veio dos tribunais e, sim, da Câmara dos Deputados, que colocou a ideia em votação", afirma o procurador, em referência à derrubada da PEC na última terça-feira.