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Bolsonaro distorce frase para questionar CoronaVac e defender cloroquina

João Dória mostra caixa da CoronaVac durante apresentação dos índices de eficácia da vacina do Instituto Butantan  - DANILO FERNANDES/FRAMEPHOTO/FRAMEPHOTO/ESTADÃO CONTEÚDO
João Dória mostra caixa da CoronaVac durante apresentação dos índices de eficácia da vacina do Instituto Butantan Imagem: DANILO FERNANDES/FRAMEPHOTO/FRAMEPHOTO/ESTADÃO CONTEÚDO

Do UOL, em São Paulo*

17/08/2021 14h21Atualizada em 17/08/2021 14h24

O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) criticou o governador de São Paulo, João Doria (PSDB-SP), e voltou a lançar dúvidas sobre a eficácia da CoronaVac ao mesmo tempo que fez uma defesa do que chama de "tratamento precoce", que se baseia em medicamentos sem eficácia contra a covid-19, como a hidroxicloroquina.

Na entrevista para a Rádio Capital Notícia (MT), Bolsonaro usou uma frase distorcida de Doria, dizendo que o governador afirmou que uma pessoa "jamais morreria" se tomasse as duas doses da CoronaVac. Em live no dia 12 de agosto, Bolsonaro já havia omitido que mortes por covid após duas doses da vacina são raras.

"Olha o que está acontecendo com a CoronaVac, ninguém tem coragem de falar. Gente que tomou as duas doses, foi infectada e está morrendo. Por que está morrendo? Porque acreditou nas palavras do governador de São Paulo, que ele tuitou, que quem tomar as duas doses da CoronaVac, se for infectado, jamais morrerá. E a pessoa fica em casa, 'tomei as duas doses e não vou morrer'. Acaba morrendo", disse Bolsonaro, em meio a mais uma defesa da hidroxicloroquina.

A declaração a qual se refere o presidente foi um tuíte de 14 de janeiro deste ano, na qual Doria dizia que estudos clínicos indicavam que 100% dos vacinados não desenvolveram formas graves da doença, com "chance zero de morrer". A postagem tem sido compartilhada por grupos bolsonaristas depois da morte do ator Tarcísio Meira, vítima da covid-19.

Na postagem, Doria se referia aos estudos apresentados à Anvisa pelo Instituto Butantan, que de fato indicaram este índice de eficácia contra mortes, mas não disse que "jamais" alguém iria morrer se fosse vacinado, limitando a sua análise aos dados do momento.

Na divulgação da eficácia da CoronaVac, foi salientado que os índices de eficácia poderiam ser diferentes em grupos maiores analisados e os estudos continuariam. Ana Maria Chudzinski, diretora do centro de Desenvolvimento e Inovação do Butantan, explica que alterações nos índices de eficácia são esperadas.

"Existem casos onde num ensaio clínico com número reduzido você pode dizer que não houve morte e depois num esquema vacinal populacional inteiro você vê número reduzido de mortes. Mas isso não demonstra de forma alguma que a vacina não é eficaz e que o dado primeiro é mentiroso. De forma alguma. Por que? Porque estamos falando de de indivíduos e quanto o maior número de indivíduos submetidos, as resposta individuais vão aparecer', disse.

Além disso, desde a declaração de Doria, cientistas pesquisam o impacto de variantes que se transformaram predominantes no Brasil (gama) e em várias partes do mundo (delta) na eficácia da vacinação, ainda sem uma conclusão. O tempo de proteção com a vacina também é alvo de estudos contínuos.

Tarcísio Meira sofria de "comorbidades graves", indicou o filho do ator em entrevista ao "Fantástico". Tarcísio Filho ainda apontou que a mãe, a atriz Gloria Menezes, conseguiu se recuperar da covid justamente porque estava vacinada com ambas as doses.

Após a morte do ator, Doria lembrou que nenhuma vacina é infalível, e que o número de mortes é pequeno. "É importante destacar que todas as vacinas funcionam, mas nenhuma delas é infalível. No caso do Brasil, somente 3% das pessoas que morreram por covid-19 neste ano tomaram as duas doses de vacina", escreveu Doria, no Twitter.

Defesa de tratamento precoce

Na sequência, Bolsonaro voltou a fazer uma defesa do que chama de tratamento precoce, pedindo que a população procure médicos e, se os profissionais recomendarem tratamento precoce, "faça, mesmo tendo sido vacinado duas vezes".

Em outro momento, ele pediu para levantar a mão quem tivesse tomado cloroquina ou ivermectina. Segundo ele, "umas 15 pessoas" que estariam em seu gabinete se manifestaram de forma positiva. Nenhum dos dois remédios citados tem eficácia comprovada, sendo que estudos indicam total ineficácia de ambos contra a covid-19.

Após a CPI da Covid decidir propor o seu indiciamento pelo crime de charlatanismo, o mandatário negou as acusações da comissão. "Não sou charlatão nem curandeiro, só dei uma alternativa", afirmou o presidente.

Bolsonaro ainda negou que tenha buscado sozinho outras alternativas de tratamento para a doença, mas que teve o apoio de equipes médicas para orientá-lo. Ele ainda lançou a possibilidade de uma teoria conspiratória, sem apresentar indícios.

"Por que essa onda toda contra o tratamento precoce? Será que é um grande negócio para a indústria farmacêutica para comprar vacina?", questionou, reclamando da retirada do ar de páginas que defendem o tratamento precoce.

CoronaVac foi aprovada por Anvisa

A Coronavac teve o uso emergencial aprovado pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) após testes que demonstraram a eficácia global de 50,38% — isso representa a proporção de pessoas que não foram infectadas após tomarem a vacina.

Desde então, outras pesquisas científicas foram realizadas para avaliar a vacina. Um estudo de efetividade conduzido pelo Instituto Butantan na cidade de Serrana, no interior de São Paulo, vacinou cerca de 75% da população adulta e observou quedas de 80% nos casos sintomáticos de covid e de 86% nas internações, além de reduzir as mortes em 95%.

Importante ressaltar que nenhuma vacina garante 100% de imunidade contra uma doença. O propósito delas é tornar o contato do sistema imunológico com o vírus mais seguro e reduzir internações e mortes. Quanto maior a quantidade de pessoas vacinadas, menores as chances de o vírus continuar circulando. O que permite a erradicação de uma doença — ou redução dos casos — é a ampla cobertura vacinal. Ou seja: quanto mais pessoas protegidas, menor a circulação do vírus.

*Com informações da Agência Estado