TJ-SP mantém decisão e Bolsonaro é condenado a pagar R$ 10 mil a jornalista
O Tribunal de Justiça de São Paulo decidiu nesta quinta-feira (19) manter a condenação do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) por danos morais no processo movido contra ele pela jornalista Bianca Santana, ex-colunista de Ecoa. O presidente terá que indenizar a profissional em R$ 10 mil, após acusá-la equivocadamente de propagar notícias falsas.
Além disso, Bolsonaro foi condenado a pagar 80% das custas e das despesas processuais, além dos honorários advocatícios de 20% do valor da causa, que é de R$ 50 mil. Ainda cabe recurso às cortes do STJ (Superior Tribunal de Justiça) e STF (Supremo Tribunal Federal). O UOL entrou em contato com a Secretaria de Comunicação da Presidência da República e com a PGR (Procuradoria Geral da República), que ainda não responderam. Este texto será atualizado se isso acontecer.
No recurso, negado pela 8ª Câmara de Direito Privado, a defesa de Bolsonaro alegou que ele se retratou publicamente sobre as declarações, o que excluiria a necessidade de indenização por dano moral. Os advogados do presidente classificaram suas declarações como um "lapso" e acrescentaram que isso poderia ter ocorrido com qualquer pessoa em transmissões ao vivo.
O recurso não foi aceito pelos desembargadores, que mantiveram a decisão de indenização proferida pelo juiz César Augusto Vieira Macedo, da 31ª Vara Cível do TJ-SP, em dezembro do ano passado.
Dizer em rede nacional que determinada jornalista divulga fake news é tirar dela o bem mais valioso ao exercício de sua profissão: a credibilidade. Sendo o autor da ofensa o presidente da República, mandatário do Estado, o impacto moral é inegável e dispensa prova
Alexandre Coelho, desembargador do TJ-SP e relator da ação
O julgamento ainda teve a participação dos juízes Theodureto Camargo, Clara Maria Araújo Xavier e Salles Rossi.
Em suas redes sociais, a jornalista comemorou a decisão em segunda instância e disse que a indenização de R$ 10 mil por danos morais "será doada integralmente a projetos para a busca de verdade e justiça por Marielle Franco".
O respiro de confiança na justiça, com o qual a maior parte de nós não pode contar, extrapola o voto de uma desembargadora e dois desembargadores, na manutenção da condenação do réu
Bianca Santana, jornalista
Relembre o caso
No dia 28 de maio de 2020, Bianca foi acusada pelo presidente de propagar fake news. As acusações de Bolsonaro ocorreram durante uma live. Na ocasião, o presidente atribuiu à jornalista uma matéria que ela não escreveu. O texto afirmava que o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) barrou uma propaganda eleitoral de Fernando Haddad (PT) que acusava o presidente — então candidato — de ter votado contra a LBI (Lei Brasileira de Inclusão), voltada a pessoas com deficiência.
Na época, Bianca havia publicado um texto citando relações entre pessoas próximas a Bolsonaro e os acusados do assassinato da vereadora Marielle Franco, no Rio de Janeiro. A jornalista defendeu a tese de que a federalização do caso interessava ao presidente, que, segundo ela, queria usar o cargo para proteger os mandantes do crime.
Dois meses depois, em outra live, Bolsonaro se desculpou por citar o nome de Bianca e acusá-la de disseminar notícias falsas.
"Lamento o ocorrido na live de 28 de maio. Peço desculpas à jornalista Bianca Santana. Eu fiz referência a várias reportagens de fake news, e uma falei que era dela. Não era dela, tinha o nome dela lá embaixo. Houve equívoco da minha parte", disse ele.
Na ação movida contra o presidente, a jornalista pedia indenização no valor de R$ 50 mil. No entanto, o pedido público de desculpas foi suficiente, segundo a Justiça, para a indenização ser fixada em R$ 10 mil.
Embora os advogados de Bianca tenham argumentado que a menção ao seu nome não foi "meramente um erro", o juiz César Augusto Vieira Macedo entendeu que a quantia determinada era "razoável e suficiente à compensação, estando ainda em conformidade com a mais recente jurisprudência".
Além de ser referência no movimento negro brasileiro, Bianca é pesquisadora, professora e escritora, formada em jornalismo, com mestrado em Educação e doutorado em Ciência da Informação. Ela atuou como professora universitária, além de publicar vários textos em diversos veículos de imprensa e palestrar em eventos nacionais e internacionais.
Ataques à imprensa
Um levantamento feito pela Fenaj (Federação Nacional dos Jornalistas) em outubro do ano passado apontou que o presidente Jair Bolsonaro fez, em média, um ataque à imprensa por dia entre janeiro e setembro de 2020. No total, foram 299 no período. Destes, 259, foram classificados como ataques de descredibilização da imprensa. Os outros 38 foram de "ataque a jornalista".
Em 2019, foram 114 casos de descredibilização da imprensa e 94 de agressões diretas a profissionais, totalizando 208 casos de violência, segundo o relatório de Violência contra jornalistas e Liberdade de Imprensa no Brasil da Fenaj.
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