Revista: Mensagens revelam que procuradores queriam operação contra Ciro
Trechos inéditos de diálogos entre procuradores da Lava Jato publicados hoje pela revista CartaCapital revelam que o pré-candidato à Presidência Ciro Gomes (PDT) foi alvo de conversas entre integrantes da força-tarefa. Eles procuraram algo nas investigações que pudesse ser usado contra o ex-governador, crítico da operação, e seu irmão, o senador Cid Gomes (PDT-CE), diz a reportagem.
Além de Ciro, o ex-presidente da Câmara Rodrigo Maia (sem partido-RJ) e o jornalista Márcio Chaer, crítico da operação, também foram alvos de conversas dos integrantes da força-tarefa, chamados, respectivamente, de "fdp" e "pilantra".
Os diálogos fazem parte do caso que ficou conhecido como Vaza Jato, vazamento de diálogos entre procuradores e o então juiz Sergio Moro tratando sobre assuntos da operação. Procurados pela revista, os procuradores atualmente responsáveis pela Lava Jato preferiram não se manifestar.
De acordo com a reportagem, em 13 de janeiro de 2019, no grupo chamado "Filhos do Januário 4", a procuradora Laura Tessler enviou uma mensagem perguntando se havia algo que pudesse ser usado contra Ciro no que fora coletado pelas investigações.
"Tava louquinha pra fazer uma visita pra ele", escreveu ela, se referindo a uma possível operação contra o pedetista.
Felipe D'Élia Camargo responde que Léo Pinheiro, da empreiteira OAS, havia feito acusações contra Ciro, mas voltou atrás ao ser ouvido. A também procuradora Jerusa Viecili participou da conversa e disse que havia algo no acordo da Galvão Engenharia, e Laura comemora.
Veja abaixo a conversa publicada pela Carta Capital. As mensagens foram reproduzidas com a grafia publicada pela revista, incluindo erros de português e abreviaturas.
- Laura Tessler: Pessoal, na linha do "arrastão cível", alguém lembra de colaborações que envolvam Ciro e Cid Gomes? Lembro do Ciro falando que nos esperaria a bala...
- Felipe D'Élia Camargo: o Leo Pinheiro tem anexo sobre isso, mas falaram que na oitiva ele refugou e falou bem mal
- Laura Tessler: Ai ai ai
- Laura Tessler: Tava louquinha para fazer uma visita pra ele (sem levar bala, óbvio, rs)
- Jerusa Viecili: Acordo da Galvao tem
- Laura Tessler: Massa!!!!!
Ciro critica Moro e Dallagnol
Procurado pela revista, Ciro disse que os diálogos são "mais uma prova de que a organização criminosa comandada por Moro e Dallagnol transformou a estrutura da Justiça em um covil de milicianos".
O pré-candidato mencionou a operação da qual ele e o irmão foram alvo em dezembro do ano passado, para investigar um suposto esquema de fraude e pagamento de propina durante obras do estádio Castelão, em Fortaleza, entre 2010 e 2013.
"O tempo está servindo para desmascarar este método nefasto, mas seus efeitos, infelizmente, ainda vão perdurar. A operação abusiva que sofri recentemente é um reflexo tardio deste lavajatismo que ainda sobrevive", completou.
'Maia colocou as mangas de fora'
Um mês depois do diálogo sobre Ciro, o então presidente da Câmara, Rodrigo Maia, foi alvo de críticas dos procuradores no grupo e xingado de "fdp".
A conversa começou após Deltan Dallagnol, então chefe da força-tarefa, enviar uma notícia em que o parlamentar desqualificava o pacote anticrime apresentado por Moro, então ministro da Justiça e Segurança Pública. Na ocasião, Maia chamou Moro de funcionário do presidente Jair Bolsonaro (PL).
Um dos procuradores sugeriu que o ex-juiz da Lava Jato jogasse "a sociedade contra Maia", numa campanha por meio das redes sociais.
Veja abaixo o diálogo:
- Deltan Dallagnol: Maia diz que projeto de Moro é 'cópia e cola' e que ministro 'confunde as bolas'
- Athayde Ribeiro Costa: Maia ta gostando do poder e com o governo fraco colocou as mangas de fora... desrespeito com o Min da justics
- Athayde Ribeiro Costa: Fdp
- Jerusa Viecili: Maia claramente se irritou quando falou de Moro. Deve ter acontecido algo nos bastidores para isso parece que Moro teria enviado uma mensagem cobrando dele a tramitação do pacote). Mas chamar de funcionário do bozo foi f...O fato é que, nessa confusão toda que virou o país, Maia vai crescendo, até pelas trapalhadas do executivo que acabam atingindo e diminuindo o prestígio de Moro.
- Orlando Martello: Sim, mas agora Moro pode vir o jogo. Jogar a sociedade contra Maia. Foi o q fez. O nome de Maia pode começar a aparecer nas redes sociais. como o de Gilmar
- Welter PRR: Ele tem que virar o jogo trabalhando como MJ. Se a briga for pelas redes sociais vai ser outra m
- Welter PRR: Tem que criar uma pauta positiva. Botar a PF para trabalhar
Maia reage: "Organização criminosa"
Procurado por CartaCapital, Maia disse que o trecho das conversas "é a prova que existia uma organização criminosa, comandada pelo ex-ministro Moro, que contava com vários procuradores e parte do Ministério Público".
"A forma como eles agiam era tentar constranger as pessoas através das redes sociais, inclusive usando o aparelho do Estado brasileiro, o que é crime."
"A LavaJato tentou ocupar o aparelho do Estado brasileiro. São milicianos da mesma forma. O que vemos é que foi montada uma organização criminosa para avançar em cima das instituições para que esse grupo tomasse o poder. A filiação do ministro Moro, e principalmente a do Deltan, é a prova disso", disse Maia. Ambos se filiaram ao Podemos.
Jornalista também foi alvo
Em 14 de fevereiro de 2019, um dia após falarem sobre Ciro, os procuradores mencionaram o jornalista Márcio Chaer, editor do Conjur, revista eletrônica especializada na cobertura jurídica.
Um dos procuradores pergunta se havia algo contra ele e, na sequência, Chaer é chamado de "pilantra".
Um material supostamente incriminador é citado contra ele, mas um dos procuradores diz que o caso "não deu em nada".
Veja abaixo o diálogo:
- Felipe D'Elia Camargo: Márcio Chaer - diretor da revista Consultor Jurídico, conhecem?
- Paulo Galvão: pilantra mas jornalista, por que?
- Felipe D'Eplia Camargo: assessor de imprensa do Milton Lyra
- Paulo Galvão: na Satiagraha também pegaram um contrato dele com alguém, não lembro se o próprio Daniel Dantas, com o objetivo de minara credibilidade de investigações
- Paulo Galvão: Na época foi divulgado, mas não deu em nada e ninguém lembra que a Conjur é vendida...
- Paulo Galvão: Acho até que vale à pena divulgar novamente, no momento certo
"Acho até espantoso que eles não tenham sido mais ofensivos, dado o grau de irresponsabilidade e amadorismo com que eles sempre acusaram seus alvos. Não tenho problema em debater sobre minha vida profissional, empresarial ou pessoal. O que está em questão é a desonestidade de policiais, procuradores e juízes que adotaram a mentira como ferramenta de trabalho. O centro de tudo são as práticas jurídicas corruptas que esses agentes cometeram", disse Chaer à reportagem.
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