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STF: Cármen Lúcia cobra governo por desmatamento; Mendonça suspende votação

17.mar.22 - Ministro André Mendonça em sessão do STF - Nelson Jr. / STF
17.mar.22 - Ministro André Mendonça em sessão do STF Imagem: Nelson Jr. / STF

Paulo Roberto Netto e Rafael Neves

Colaboração para o UOL e do UOL, em Brasília

06/04/2022 18h16Atualizada em 06/04/2022 21h56

O ministro André Mendonça, do STF (Supremo Tribunal Federal), pediu vista (mais tempo de análise) e suspendeu o julgamento de duas ações da chamada "pauta verde", conjunto de sete processos que discutem políticas públicas e omissões do governo federal no combate ao desmatamento na Amazônia.

A suspensão ocorreu logo após o voto de Cármen Lúcia, única a votar, que reconheceu a existência de um quadro "estrutural" de violação a direitos na situação ambiental do país. A ministra deu um duro voto, criticou a falta de execução do orçamento para políticas ambientais e cobrou a adoção de um novo plano para reduzir o desmatamento da floresta.

Em seu voto, Cármen reconheceu o "estado de coisas inconstitucional" na proteção ambiental da Amazônia. Nesta situação, o Judiciário reconhece uma situação de contínuas violações à Constituição.

A ministra ordenou, entre outras medidas, que o governo elabore um plano que vise a fiscalização e o combate ao desmatamento, a proteção dos direitos indígenas e o combate a crimes ambientais. O documento deverá ser entregue ao STF em até 60 dias, contendo o cronograma de ação, metas, objetivos, prazos e recursos disponíveis para sua implementação.

O governo deverá elaborar também um plano de fortalecimento de órgãos ambientais, como Ibama e o ICMBio, e atuar para garantir a redução efetiva e contínua dos níveis de desmatamento ilegal em terras indígenas.

Durante o voto, Cármen criticou a inexecução do orçamento disponível para políticas ambientais, apontando que as verbas ficam somente previstas, mas não saem do papel.

Verbo não é verba. Lorota, trololó, lero-lero de dizer que está lá previsto, mas não acontecido. Não adianta ter uma previsão que não é para ser executada"
Ministra Cármen Lúcia, do STF

Mendonça pede vista

Ao pedir vista, André Mendonça, indicado ao STF por Bolsonaro, afirmou que a proteção do meio ambiente não é somente responsabilidade do governo federal, mas também dos estados, e que é preciso buscar uma "resposta futura".

"A responsabilidade de proteção não é apenas da União, é também dos estados. E na região [amazônica], há estados com dimensão maior que muitos países e nós precisamos para ter uma resposta a meu ver adequada a essa questão, tratar também da responsabilidade dos estados", disse. "Não quero olhar muito para o passado, quero ver como construir o futuro". O ministro afirmou que pediu vista apenas nestes processos, mas votará nas ações pautadas para amanhã.

O desmatamento na floresta amazônica brasileira atingiu níveis recordes para o mês de fevereiro, de acordo com dados do governo. Ao mesmo tempo, um estudo científico indicou que a selva está chegando a um ponto de inflexão após o qual não poderá mais se sustentar.

"Pauta Verde"

O STF retomou hoje o julgamento da chamada "pauta verde", conjunto de sete processos que discutem políticas ambientais em vigor no país. Nesta sessão, os ministros começaram a votar em duas ações movidas por partidos da oposição. Amanhã, o STF discutirá outros quatro casos sobre o tema.

O primeiro processo de hoje, apresentado pela Rede Sustentabilidade, acusa o governo Bolsonaro de omissão no combate ao desmatamento da Amazônia. A legenda cita dados do INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) que demonstrariam o avanço da destruição da floresta desde 2019.

A segunda ação, movida por sete partidos, pede ao Supremo que obrigue o governo a adotar o Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia (PPCDam), que funcionava desde 2004 e foi descontinuado por Bolsonaro.

O governo alega que houve uma "evolução" do PPCDam para um novo plano de combate à queima da floresta.

"Foi na busca de novas soluções para a prevenção e o combate ao desmatamento que foi concebido o novo Plano Nacional, que é, de fato, um claro avanço no combate e controle do desmatamento na Amazônia", disse o advogado-geral da União, Bruno Bianco, na semana passada.

O desmatamento no Brasil tem aumentado desde que o presidente Bolsonaro assumiu o cargo, em 2019, e enfraqueceu a conservação ambiental, defendendo mais agricultura comercial e mineração em áreas protegidas para ajudar a tirar a região amazônica da pobreza, Na avaliação do Meio Ambiente, o governo "atua de forma ainda mais contundente em 2022 no combate aos crimes ambientais".

"Cupinização institucional"

Cármen iniciou a leitura de seu voto na última quinta-feira (31) com duras críticas ao que chamou de "cupinização" das instituições democráticas, especialmente em temas ambientais.

"O que são esses cupins? O cupim do autoritarismo, o cupim do populismo, o cupim de interesses pessoais, o cupim da ineficiência administrativa. Tudo isso junto a construir um quadro que não tenha o cumprimento objetivo, garantido, da matéria constitucional devidamente assegurada", afirmou.

Cármen também citou a declaração do ministro da Economia, Paulo Guedes, que em 26 de março afirmou que o Brasil é "apenas um pequeno transgressor ambiental" em comparação a outros países. "A transgressão está confessada", disse a ministra.