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Juiz alertou para sigilo de decisão sobre busca e grampo contra Ribeiro

Igor Mello

Do UOL, no Rio

24/06/2022 17h33

O juiz federal Renato Coelho Borelli, responsável por supervisionar o inquérito sobre o chamado gabinete paralelo do MEC (Ministério da Educação), alertou sobre o sigilo da decisão que determinou medidas cautelares contra o ex-ministro Milton Ribeiro, entre elas, a busca e apreensão em seus endereços e a quebra de seu sigilo telefônico.

Ao autorizar que a Polícia Federal procedesse com as novas medidas de investigação, Borelli destacou que pessoas "estranhas ao processo" não poderiam ficar sabendo dessas informações. A determinação consta em decisão judicial obtida pelo UOL. "As informações prestadas são acobertadas pelo segredo de justiça, delas não se podendo dar ciência a pessoas estranhas ao processo, sob pena de caracterização de crime", escreve o juiz.

Escutas telefônicas mostram que o presidente Jair Bolsonaro (PL) falou com Ribeiro sobre a possibilidade de buscas em sua casa. Uma conversa entre o ex-ministro e sua filha, interceptada no dia 9 deste mês, ainda sugere que eles também soubessem do grampo telefônico.

Por conta disso, o MPF (Ministério Público Federal) solicitou a remessa dos autos da investigação contra Ribeiro para o STF (Supremo Tribunal Federal), instância na qual inquéritos contra o presidente da República tramitam. Na manifestação, o procurador da República Anselmo Henrique Cordeiro Lopes fala em "possível interferência ilícita por parte do Presidente da República Jair Messias Bolsonaro" na investigação.

"Nesta oportunidade, o MPF vem requerer que o auto circunstanciado nº 2/2022, bem como o arquivo de áudio do investigado Milton Ribeiro que aponta indício de vazamento da operação policial e possível interferência ilícita por parte do Presidente da República Jair Messias Bolsonaro nas investigações, sejam desentranhados dos autos e remetidos, de maneira apartada e sigilosa, ao Supremo Tribunal Federal", diz o documento.

Medidas cautelares foram autorizadas em maio

Borelli autorizou em 17 de maio a interceptação telefônica, as buscas e uma série de outras medidas cautelares contra os alvos da operação —entre eles, Milton Ribeiro e os pastores Gilmar Santos e Arilton Moura.

A PF atualizou a lista de terminais telefônicos a serem monitorados, e o magistrado renovou a interceptação das linhas em 31 de maio, por um prazo de 15 dias. Em 15 de junho, renovou essa autorização por mais 15 dias, mas suspendeu as escutas pouco depois da operação que prendeu na quarta-feira (22) o ex-ministro e os pastores.

Em conversa com sua filha em 9 de junho, o ex-ministro afirma que o presidente "teve o pressentimento" de que havia a intenção de atingi-lo por meio da investigação no MEC. O áudio foi revelado pela Globonews e obtido pelo UOL.

""Não! Não é isso... ele acha que vão fazer uma busca e apreensão... em casa... sabe... é... é muito triste. Bom! Isso pode acontecer, né? Se houver indícios, né?", disse Milton Ribeiro à filha.

Em áudio divulgado pela Folha de S.Paulo em 21 de março, Ribeiro diz a um interlocutor que dava prioridade aos pedidos dos pastores por recomendação de Bolsonaro.

Na sequência da conversa, a filha do ministro o alerta de que os dois estavam falando por uma ligação telefônica convencional —que pode ser interceptada pelos investigadores. Logo em seguida, eles se despedem e desligam.

"Eu tô te ligando do meu celular normal, viu, pai?", alerta a filha. Milton Ribeiro então responde: "Ah é? Ah, então depois a gente se fala".

Em mensagem enviada a outros integrantes da Polícia Federal, o delegado Bruno Calandrini, que comanda a investigação sobre o gabinete paralelo no MEC, afirmou ter havido interferência e disse não ter "autonomia investigativa" no inquérito.

"O deslocamento de Milton para a carceragem da PF em SP é demonstração de interferência na condução da investigação, por isso, afirmo não ter autonomia investigativa e administrativa para conduzir o Inquérito Policial deste caso com independência e segurança institucional", disse Calandrini.

O UOL procurou o Palácio do Planalto. Os esclarecimentos serão publicados quando forem recebidos.

O que diz a defesa de Ribeiro

O advogado de Ribeiro, Daniel Bialski, afirmou por meio de nota que o áudio foi realizado antes da deflagração da operação e questionou a competência da Justiça Federal em Brasília em julgar o caso, após a investigação ser enviada ao STF.

Para ele, tudo indica que há motivos para anular ao menos parte das decisões da operação. "Causa espécie que se esteja fazendo menção a gravações/mensagens envolvendo autoridade com foro privilegiado, ocorridas antes da deflagração da operação", afirmou. "Se realmente esse fato se comprovar, atos e decisões tomadas são nulos por absoluta incompetência", disse.