RJ: planilha de 9.000 cargos secretos é identificada com nome 'governador'
Uma planilha que mostra o detalhamento dos recursos necessários até o fim do ano para a manutenção de 9.000 cargos secretos foi identificada pela Secretaria Estadual de Trabalho do Rio de Janeiro com o nome "governador" (veja o documento abaixo).
Disponível no SEI (Sistema Eletrônico de Informações) do governo fluminense, a tabela é relativa ao projeto Casa do Trabalhador, cujas inaugurações de unidades têm sido usadas politicamente nas últimas semanas pelo governador e candidato à reeleição, Cláudio Castro (PL).
Os dados da planilha mostram previsão de contratação 4.500 "agentes de apoio" e outros 4.500 "agentes de empregabilidade" a partir da sexta etapa do projeto, com início em maio passado.
Perguntada sobre o nome "governador" na tabela, a Secretaria de Trabalho afirmou que "vai apurar se houve um erro na confecção da planilha". A pasta disse ainda que "os equipamentos públicos [unidades da Casa do Trabalhador] são entregues para benefício da população e não têm finalidade político-partidária".
A contratação desses profissionais não ocorre por meio da Secretaria de Trabalho, mas pela Fundação Ceperj (Fundação Centro Estadual de Estatísticas, Pesquisas e Formação de Servidores Públicos), que não divulga os nomes dos funcionários. Também não há contracheque, e os salários são sacados na boca do caixa, no Banco Bradesco.
Nesta sexta (15), reportagem da TV Globo mostrou relatos de ex-funcionários do órgão afirmando que repassavam parte de seus salários à cúpula da fundação, que nega qualquer irregularidade.
A tabela localizada pela reportagem prevê a utilização de R$ 301,4 milhões até o fim deste ano no Casa do Trabalhador, cujas unidades atendem pessoas que precisam de apoio para a reinserção no mercado de trabalho.
Levantamento feito pelo UOL em diários oficiais mostra que o orçamento previsto na planilha vem sendo cumprido praticamente à risca.
Até agora, a Secretaria de Trabalho já transferiu R$ 85,6 milhões para a Ceperj. O valor da tabela, referente aos seis primeiros meses do ano, é de R$ 91,6 milhões. O último repasse, relativo a junho, de R$ 34,6 milhões, é exatamente o valor que foi publicado em Diário Oficial no dia 1º deste mês.
O Casa do Trabalhador é o projeto que possui o maior número de cargos secretos no governo do Rio. Dos 18 mil postos localizados pela reportagem, metade vem desse programa. Depois do Casa do Trabalhador, vem o Esporte Presente RJ, com 6.000 funcionários divididos em 1.500 núcleos voltados para a prática de atividades esportivas.
Um documento de 30 de junho, da Fundação Ceperj, mostra que a previsão atualizada de gastos com o projeto esportivo até o fim do ano chega a R$ 381,1 milhões. Ou seja, somente com esses dois projetos há uma previsão de gastos de R$ 682,5 milhões neste ano.
Maratona de inaugurações
O detalhamento dos repasses mensais para a expansão da Casa do Trabalhador explica a maratona de inaugurações que o governador Cláudio Castro realizou até o dia 1º deste mês —data limite para a participação de pré-candidatos em eventos desse tipo.
Os gastos previstos, que eram inferiores a R$ 4 milhões no primeiro trimestre, saltaram para R$ 12,9 milhões em abril. Nos meses seguintes, houve uma nova ampliação, dessa vez para mais de R$ 34 milhões mensais.
Entre abril e 1º de julho, Castro inaugurou 12 unidades da Casa do Trabalhador, uma média de um evento por semana, de acordo com levantamento feito pelo UOL com base nas agendas oficiais do governador.
Segundo a Secretaria de Trabalho, "havia um cronograma de entregas com essa previsão".
A escolha dos locais contemplados com sedes não parece seguir critérios técnicos: cinco das 12 unidades lançadas entre abril e julho ficam em pequenos municípios do interior —caso de Carmo, com 19.161 habitantes, e Engenheiro Paulo de Frontin, com 14.138. Também foi contemplada a localidade do Terreirão, uma pequena comunidade no Recreio dos Bandeirantes, zona oeste do Rio.
A pasta afirma que "as Casas do Trabalhador estão sendo inauguradas em diversos municípios do Estado, inclusive nos pequenos, com o objetivo de levar os serviços do programa para todos, garantindo assim que as políticas públicas sejam disponibilizadas para cada cidadão fluminense, independente do seu local de residência".
As inaugurações seguiram sempre o mesmo rito: com festa ao lado de pré-candidatos a deputado estadual e federal aliados de Castro, bem como de prefeitos que apoiam seu projeto de reeleição. O senador Romário (PL), que tentará a reeleição como companheiro de chapa do governador, participou do lançamento da unidade de Olaria, na zona norte do Rio, em 11 de junho.
A figura mais presente nesses eventos foi o deputado estadual Gustavo Tutuca (PP), que foi secretário de Turismo de Castro até abril, quando se desincompatibilizou para concorrer no pleito de outubro. Ele esteve presente nas inaugurações de cinco das 12 unidades abertas no período analisado. Nos eventos, discursou e até cortou a faixa em ao menos duas oportunidades.
Em nota, a assessoria de imprensa do parlamentar afirmou que, "das cinco inaugurações citadas pela reportagem, três aconteceram em municípios onde ele tem atuação recorrente há muitos anos".
Tutuca disse ainda que "repudia qualquer ilação de uso eleitoral em um programa que pode transformar a vida de tantas pessoas e desconhece qualquer tipo de indicação política sobre o mesmo".
Outra figura central na dinâmica desses atos é o secretário estadual de Trabalho, Patrique Welber. Presidente do Podemos no Rio, ele continua realizando a maratona de inaugurações, agora sem a presença de Castro. Ao mesmo tempo, é um dos articuladores da campanha à reeleição do governador.
O Casa do Trabalhador também foi um dos projetos citados pelo ex-governador e pré-candidato ao cargo Anthony Garotinho (União Brasil) como moeda de troca de apoio político de Cláudio Castro.
Garotinho afirmou que, em reunião no Palácio Guanabara, o governador ofereceu a ele 520 postos —sendo 280 da Casa do Trabalhador e 120 do Esporte Presente RJ.
O acordo não aconteceu, e Garotinho, que pretendia inicialmente ser candidato a deputado federal, agora se apresenta como pré-candidato ao Executivo e tem partido para o ataque contra Castro.
A Ceperj nega que tenha havido qualquer oferta de cargos ao ex-governador.
O político trava na Justiça batalha pelo direito de disputar as eleições —enquanto o Ministério Público Eleitoral do Rio diz que Garotinho está inelegível por condenação decorrente da Operação Chequinho, o ex-governador diz que o Supremo Tribunal Federal já anulou toda a operação.
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