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Uerj aumenta sigilo sobre projetos após UOL denunciar uso político

Letreiro da Uerj em campus de São Gonçalo  - Fabio Costa/Fotoarena / Agência O Globo
Letreiro da Uerj em campus de São Gonçalo Imagem: Fabio Costa/Fotoarena / Agência O Globo

Do UOL, no Rio

19/08/2022 04h00

Em vez de aumentar a transparência, a Uerj (Universidade do Estado do Rio de Janeiro) foi na contramão e ampliou nesta semana o sigilo sobre projetos usados para indicações políticas.

Folhas de pagamento dos programas Observatório Social da Operação Segurança Presente —no qual o UOL revelou haver indicados do deputado estadual Rodrigo Bacellar (PL) e um ex-vereador preso na Lava Jato— e Rio Sem Homofobia estavam públicas no site que reúne processos administrativos do governo estadual, mas tiveram os acessos bloqueados após as reportagens.

A mesma medida foi adotada pela Fundação Ceperj —órgão onde foram criados ao menos 20 mil cargos secretos—, quando o UOL revelou uma planilha chamada "governador" que tratava de um cronograma financeiro de um projeto com 9.000 cargos secretos.

Desta vez, foram colocados sob sigilo processos de prestação de contas onde estavam disponíveis folhas de pagamento dos dois projetos bancados com recursos do governo fluminense.

A universidade alega que restringiu o acesso porque esses processos "contêm informações dos participantes dos projetos que, em conformidade com a legislação vigente, não devem ser publicizadas, como CPF, identidade, PIS/PASEP/NIT, Banco, Agência e Conta-Corrente, além da integralidade das planilhas mensais de pagamentos".

A íntegra das folhas de pagamento estava disponível em apenas um documento. Com a medida tomada pela Uerj, outros registros que não contêm dados sensíveis deixaram de ser acessíveis no SEI (Sistema Eletrônico de Informações), o mecanismo de transparência do estado.

Uerj promete divulgar folhas em setembro

Questionada sobre o bloqueio no acesso às folhas de pagamento dos dois programas, a Uerj afirmou que "os processos mencionados não se encontram sob sigilo e sim com acesso restrito".

Formalmente, a decretação de sigilo em um documento público precisa ser feita por meio de um ato formal da universidade. No entanto, na prática, a totalidade dos dois processos se encontra agora sob sigilo —isto é, após as reportagens, não é mais possível acessar os documentos.

A Uerj prometeu no fim de semana divulgar as folhas de pagamento em seu Portal da Transparência. Na quarta-feira (17), a universidade disse que os dados referentes aos programas sem transparência serão divulgados no mês que vem.

"Vale ressaltar que os nomes dos integrantes de todos os projetos da Uerj, com as respectivas remunerações (exceto dados pessoais e bancários, como CPF, identidade, PIS/PASEP/NIT) estarão disponíveis para consulta pública no Portal de Transparência da Universidade a partir de setembro."

Indicações políticas e saques na boca do caixa

O UOL revelou que o governo Cláudio Castro (PL) está usando a Uerj para contratar aliados políticos sem nenhuma transparência. Somente neste ano, 11 secretarias e órgãos estaduais repassaram, por meio de descentralizações orçamentárias, R$ 593,6 milhões para projetos da universidade sem nenhuma transparência.

A reportagem obteve documentos de quatro deles e constatou que diversas pessoas contratadas com salários de até R$ 16 mil são ligadas a políticos, como o deputado estadual Rodrigo Bacellar (PL), braço direito de Castro e ex-secretário de Governo.

O ex-vereador do Rio Daniel Martins, preso na Lava Jato sob a acusação de atuar como operador de propina de um deputado beneficiado pela quadrilha de Sérgio Cabral, também foi contratado no projeto Observatório Social da Operação Segurança Presente com um salário de R$ 16 mil.

A Secretaria de Governo e o deputado Rodrigo Bacellar negam a existência de indicações políticas. Daniel Martins nega ter sido contratado por indicação política e afirma ter participado do processo seletivo.

O UOL também mostrou que, tal como no escândalo dos cargos secretos da Fundação Ceperj, o Banco Bradesco —que paga os servidores do Rio— identificou movimentação de saques de funcionários na boca do caixa em dinheiro vivo.

No dia 2 deste mês, o Bradesco enviou ofício com um alerta à universidade a respeito de remunerações por meio de OBPs (Ordens Bancárias de Pagamentos) relacionadas aos projetos realizados com recursos de outros órgãos (veja o documento abaixo).

Essas OBPs são a forma de pagamento que permite o saque na boca do caixa, em dinheiro, apenas com a apresentação de um documento.

Segundo o ofício do Bradesco, a modalidade está prevista no contrato do banco com o governo do Rio, mas deve ser usada em "caráter excepcional, a pagamentos eventuais, e não recorrentes de pequena monta a não-correntistas".

Documento mostra cobrança do Banco Bradesco para que a Uerj não utilize mais ordens de pagamento que permitem saques em dinheiro vivo, sem abertura de conta corrente - Reprodução - Reprodução
Imagem: Reprodução

Ao exigir que a universidade implemente o pagamento apenas a pessoas que tenham conta-corrente, o banco cita a "utilização crescente da modalidade OBP para pagamentos de fornecedores da Uerj, sem a observância das condições contratuais".

Na resposta ao Bradesco, o reitor da Uerj, Mário Sérgio Alves Carneiro, diz que a exigência foi "atendida de imediato em razão da máxima transparência, impessoalidade, boa-fé, cooperação e probidade que pautam a conduta desta gestão, jamais porque o pagamento por Ordem de Pagamento seria supostamente ilegal ou irregular, o que definitivamente não é, uma vez que está expressamente amparado por normas do Banco Central e do contrato em vigor".

No mesmo documento, o reitor afirma que a prática é "significativamente rara e excepcional". A assessoria de imprensa da Uerj disse, sem especificar um número absoluto, que "apenas 2 a 3% dos pagamentos de pessoal" na universidade ocorrem desta forma.