Acusado de ser operador de deputado ganhou salário em folha secreta da Uerj
Um dos alvos da Operação Furna da Onça —uma das mais notórias fases da Lava Jato no Rio— foi contratado em projeto usado para empregar aliados políticos do governador Cláudio Castro (PL) na Uerj (Universidade do Estado do Rio de Janeiro).
O ex-vereador do Rio Daniel Marcos Barbiratto de Almeida foi preso em 2018 acusado de atuar como operador de um deputado em esquema do ex-governador Sérgio Cabral, que pagava em troca de apoio político no Legislativo fluminense, segundo o MPF (Ministério Público Federal).
Conhecido como Daniel Martins, Barbiratto consta entre os nomes na lista de pagamentos do Observatório Social da Operação Segurança Presente, realizado na Uerj com recursos da Segov (Secretaria Estadual de Governo). O programa, juntamente com outros 17 tocados pela Uerj com dinheiro de órgãos do governo fluminense, é marcado por falta de transparência e folhas de pagamento secretas.
De acordo com documentos obtidos pelo UOL em um processo de prestação de contas, Barbiratto embolsou ao todo R$ 112 mil entre junho e dezembro do ano passado, período em que recebeu salário de R$ 16 mil. Apesar de Barbiratto ter permanecido no programa até junho passado —conforme informou o advogado dele—, não é possível saber quanto ele recebeu neste ano em razão da falta de transparência sobre os dados do projeto.
O Observatório Social da Operação Segurança Presente foi iniciado quando a Segov era comandada pelo deputado estadual Rodrigo Bacellar (PL), braço direito de Castro e hoje líder do governo na Alerj (Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro).
Apesar de a Uerj e o governo do Rio afirmarem que todos os contratados passaram por processo seletivo simplificado, o nome de Barbiratto não aparece entre os convocados em nenhum dos quatro editais divulgados no site da universidade.
Ele é enteado do deputado estadual Luiz Martins (União Brasil-RJ), também preso na Furna da Onça. Barbiratto ficou nove meses preso preventivamente sob a acusação de corrupção passiva. O processo deixou a esfera criminal e corre na Justiça Eleitoral, onde aguarda denúncia.
De acordo com o MPF, Barbiratto atuava como um operador de Luiz Martins, recebendo os pagamentos mensais feitos pela quadrilha de Sérgio Cabral para comprar o apoio político do deputado estadual.
Em depoimento ao MPF, Sergio de Castro Oliveira, o Serjão, assessor direto e um dos operadores de Cabral, afirmou que os pagamentos mensais a Luiz Martins começaram no final de 2009 e duraram até março de 2014. O MPF afirma que o mensalinho era de R$ 80 mil.
Na denúncia feita em 2018, os procuradores afirmam que Barbiratto era um dos responsáveis por receber a mesada, enviada por meio de doleiros.
"O arranjo quanto às circunstâncias dos pagamentos era feito, via de regra, por contatos telefônicos entre SERGIO DE CASTRO OLIVEIRA (ou "SERJÃO"), assessor direto de SERGIO CABRAL, e o gabinete do deputado estadual LUIZ MARTINS, que combinavam quem receberia o dinheiro, onde e quando. As entregas de propina ocorreram no Centro da cidade do Rio de Janeiro, na Rua Erasmo Braga, onde ficava o escritório do referido parlamentar, diretamente para ele ou para DANIEL, por meio da rede de doleiros de RENATO CHEBAR e MARCELO CHEBAR, notadamente CLAUDIO BARBOZA e VINÍCIUS CLARET", diz o MPF.
As entregas de dinheiro vivo para Barbiratto foram confirmadas por Luiz Carlos Linhares Ferreira, um dos homens responsáveis por transportar remessas de dinheiro enviadas pelos doleiros que atuavam para a quadrilha de Cabral. Segundo o MPF, Ferreira forneceu "informações pormenorizadas" sobre os locais de entrega e reconheceu Barbiratto por meio de fotografias.
Barbiratto e Luiz Martins negam as acusações feitas pelo MPF.
A Operação Furna da Onça foi deflagrada pela Força-Tarefa da Lava Jato no Rio em novembro de 2018. Na ação, foram presos dez deputados estaduais, dois integrantes do primeiro escalão do governo do Rio, além de outras 14 pessoas.
O que dizem o ex-vereador e o governo do RJ
Procurado pelo UOL, Barbiratto nega ter sido contratado por indicação política e afirma ter participado do processo seletivo. Ele diz ainda que não exerceu nenhuma outra ocupação profissional simultaneamente, apesar de isso ser permitido pelas regras do Observatório Social da Operação Segurança Presente.
Perguntado sobre o que fazia no observatório, Barbiratto disse que "sua função era analisar índices de criminalidade nos bairros do município do Rio de Janeiro e nos demais municípios, compilá-los e transformá-los em relatórios a serem apresentados, a fim de avaliar a necessidade da implantação do programa Segurança Presente nessas localidades pelas autoridades competentes".
Desde 1999, o governo do Rio mantém em funcionamento o ISP (Instituto de Segurança Pública), órgão responsável exatamente por "produzir informações e disseminar pesquisas e análises com vistas a subsidiar a implementação de políticas públicas de segurança", segundo o site oficial do órgão.
Questionado pelo UOL, o governo do estado defendeu a contratação do ex-vereador. "O Sr. Daniel foi contratado por processo seletivo simplificado e, até o momento da contratação, não havia qualquer fato que o impedisse de participar do projeto e receber bolsa ou remuneração, conforme o permitido por lei", alegou.
Emprego de aliados políticos
Além de Barbiratto, o UOL constatou a presença no Observatório Social da Operação Segurança Presente de quatro assessores do deputado estadual Rodrigo Bacellar (PL-RJ), que comandava a Segov na época da criação do programa. Juntos, eles receberam da Uerj R$ 205 mil em salários em 2021.
Bacellar já negou ter exercido influência política nas contratações do programa.
A reportagem também constatou a presença de servidores de outras secretarias trabalhando simultaneamente no projeto, além de assessores de vereadores de Campos dos Goytacazes (RJ) aliados de Bacellar.
No último sábado (13), o UOL mostrou que as descentralizações orçamentárias do governo para a Uerj chegaram a R$ 594 milhões em 2022.
Parte desses recursos —a Uerj alega que é um pequeno percentual— vinha sendo usada para pagamentos na boca do caixa, com retirada do dinheiro em espécie. O movimento foi detectado pelo Bradesco que, no dia 2, mandou um ofício à universidade informando que os pagamentos seriam suspensos se os funcionários não abrissem conta-corrente, o que foi acatado pela Uerj.
A Uerj afirmou em nota que os pagamentos na boca do caixa ocorriam "exclusivamente em casos excepcionais de erros", mas que "não irá realizar, a partir deste mês, qualquer ordem de pagamento".
A universidade não contestou, contudo, a falta de transparência nas folhas de pagamento. Segundo a instituição, a consolidação dos dados dos programas para divulgação no Portal da Transparência da Uerj estão "em andamento".
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