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Apoio à reeleição de Lira na Câmara vai unir bolsonaristas e lulistas

09.nov.22 - Presidente eleito, Lula, se encontra com o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, para reunião particular em Brasília (DF) - FÁTIMA MEIRA/ESTADÃO CONTEÚDO
09.nov.22 - Presidente eleito, Lula, se encontra com o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, para reunião particular em Brasília (DF) Imagem: FÁTIMA MEIRA/ESTADÃO CONTEÚDO

Do UOL, em Brasília e em São Paulo

29/11/2022 04h00Atualizada em 29/11/2022 18h11

As bases do futuro governo Lula e do atual governo Bolsonaro se unirão no apoio à reeleição de Arthur Lira (PP-AL) à presidência da Câmara dos Deputados. O PT de Luiz Inácio Lula da Silva e o PSB, de seu vice Geraldo Alckmin, chancelaram o voto na tarde de hoje (29), enquanto o PL do presidente Jair Bolsonaro deverá tratar do assunto em um jantar nesta noite, em Brasília.

O apoio petista a Lira indica uma mudança de rumo da bancada do partido em relação ao presidente da Câmara, grande aliado de Bolsonaro, e tem influência direta de Lula. Segundo o deputado Felipe Carreras (PSB-PE), futuro líder do partido na casa, em entrevista coletiva nesta tarde após a reunião da aliança, a decisão foi "consenso" na bancada.

De olho no comando de comissões importantes da Casa, incluindo a CCJ (Comissão de Constituição e Justiça), na aprovação da PEC da Transição (Proposta de Emenda à Constituição) e um início de mandato mais tranquilo, o partido não só abdicará de lançar nome próprio à Presidência da Câmara como vai aderir ao até então desafeto.

Adaptar é preciso. O PT fez oposição a Lira durante todo o seu mandato, após ter apoiado a candidatura de Baleia Rossi (MDB-SP), em 2021. Eleito com apoio de Bolsonaro, Lira se tornou o principal aliado do governo na Casa e foi o grande articulador do chamado orçamento secreto, que fiou apoio do centrão à atual gestão — algo combatido não só pelo partido mas também criticado abertamente por Lula durante a campanha.

No anúncio, feito pelo deputado Reginaldo Lopes (PT-MG), líder da bancada, houve uma espécie de mea culpa em relação ao apoio que mais deu sustentação ao bolsonarismo junto ao PL, partido de Bolsonaro.

"Decidimos pelo apoio compreendendo que temos uma agenda de país, uma agenda de reconstrução do Brasil, uma agenda que o próprio Arthur Lira foi o primeiro a reconhecer a legitimidade das urnas e é fundamental essa estabilidade institucional", justificou Lopes.

O PT decidiu não lançar nome próprio, mas havia uma expectativa de endosso a nomes do MDB ou do PSD. Apesar de divergências, a sigla decidiu ser melhor reorganizar a estratégia em torno dos objetivos próprios:

  • Facilitar o início do novo governo Lula
  • Aprovar a PEC da Transição
  • Conseguir comissões importantes da Casa

Negociação pela CCJ. Para apoiar formalmente a reeleição de Lira e integrar o bloco, o PT negocia para assumir a presidência da CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) da Câmara, colegiado onde devem passar os projetos mais relevantes. No entanto, a ofensiva petista causou um problema para Lira, uma vez que oposicionistas do governo eleito, como parlamentares do PL, também querem o cargo.

Isso porque integrantes do Centrão querem emplacar o partido do presidente Bolsonaro na CCJ, com o argumento de que a sigla elegeu a maior bancada da Casa (99 deputados). Em troca, o União Brasil, que já anunciou apoio ao Lira na semana passada, manteria a presidência de outra comissão importante, a CMO (Comissão Mista do Orçamento).

Na avaliação de deputados do Centrão ouvidos pelo UOL, a demora do PT em se aliar publicamente a Lira poderia deixá-lo sem chance para barganhar a chefia da Câmara. E a opinião seria matemática: além do PP, com 47 deputados, já indicaram apoio ao alagoano o União Brasil (59 parlamentares), o Republicanos (41), o PDT (17), o Podemos (12), o PSC (6), o Patriota (4) e o PTB (1).

Correm por fora até o momento o PL (99) e o PSD (42), que ainda não sinalizaram abertamente o apoio, mas dirigentes das legendas endossam o nome de Lira. Se isso se concretizar, sem a federação do PT (que reúne 80 de mais dois partidos: PV e PCdoB), Lira já reuniria o apoiamento de 328 deputados dos 513. São necessários 257 votos para vencer a disputa.

Inimigos mais perto ainda. Durante toda a campanha, Lula criticou insistentemente a relação entre o governo Bolsonaro e Congresso. Em maio, chegou a chamar Lira de "imperador do Japão" ao falar que era o parlamentar, não o presidente, quem controlava o orçamento.

O presidente eleito chegou em Brasília ontem (28) depois de se recuperar de uma cirurgia na garganta. Ele tem participado de reuniões particulares, além de ver o jogo da seleção brasileira na Copa do Mundo, acompanhado da cúpula do governo eleito. Ele se encontrou com Lira no início de novembro, após a eleição. Não está prevista uma nova reunião, mas o apoio à reeleição passa muito pelos planos do governo.

Fantasma do passado. Um dos objetivos dos petistas é garantir um início de mandato mais tranquilo para Lula, com a lembrança do governo Dilma Rousseff (PT), quando o partido apoiou eleição do deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP) contra Eduardo Cunha (então MDB-RJ), que, vitorioso, abriu o processo de impeachment contra a presidente.

Com um Congresso mais conservador e de maioria de oposição, parlamentares petistas dizem entender que não é o momento de entrar na disputa contra alguém com amplo apoio na Casa e focar em garantir um início de mandato mais tranquilo para que Lula possa fazer o que pretende e prometeu.

De olho na PEC. A proposta que prevê um adicional ao orçamento sem furar o teto tem sido o principal foco do novo governo desde a eleição. O projeto é indispensável para que o partido consiga garantir as principais promessas de Lula na área social, em especial o Bolsa Família, então Auxílio Brasil, no valor de R$ 600 com adicional de R$ 150 por criança com menos de seis anos.

A proposta, protocolada ontem no Senado pelo senador Marcelo Castro (MDB-PI), relator-geral do Orçamento 2023, o valor referente ao programa fica fora do cálculo do teto de gastos entre 2023 e 2026. O texto traz ainda um aval extra de R$ 175 bilhões e já foi alvo de críticas entre lideranças do meio político e empresarial que apoiaram o petista no segundo turno contra Bolsonaro.

Desafio entre bancadas. No início da discussão do texto, petistas avaliaram que se o texto começasse no Senado seria mais rapidamente aprovado do que se começasse pela Câmara. Mas o que se tem desenhado é um desentendimento dos senadores em relação à proposta. O PT terá que reverter a resistência de bancadas relevantes da Casa, como a do Podemos, que contém oito senadores.

Ao UOL, o líder da sigla, Oriovisto Guimarães (Podemos-PR), afirmou que indicará voto contrário à PEC tanto na CCJ do Senado quanto no plenário. "Sou contrário à proposta. Eu e meu partido votaremos contra", disse. Questionado sobre as negociações, o parlamentar afirmou que é contra o valor extra teto e o prazo de quatro anos.

"Temos duas discordâncias. Valor máximo seria de R$ 80 bilhões e prazo máximo de um ano. Com esse valor é possível bancar o Bolsa Família, o auxílio de R$ 150 para crianças, a Farmácia Popular e o aumento do salário mínimo", completou. Guimarães disse que deverá ocorrer uma reunião de líderes nesta semana para tratar do assunto.

Aliados do PT. Lula conta, inicialmente, com o apoio de legendas da base de esquerda, e de caciques do MDB e do PSD — ambas as bancadas reúnem 12 senadores e somam 24 parlamentares.

No entanto, o texto não é unanimidade entre os integrantes, assim como ocorre no PSDB, com os seis tucanos. O senador Tasso Jeiressati (RN), inclusive, defende outros valores para a PEC. Há, ainda, quem trabalhe contra a proposta, como os parlamentares aliados de Jair Bolsonaro, do PL e do PP — com, respectivamente, oito e sete senadores, chegando a 15 parlamentares.

São necessários 49 votos favoráveis dos 81 senadores. A base petista conta com o apoio de apenas 12 senadores de quatro siglas: PT (7), Pros (2), PSB (1), Rede (1) e Cidadania (1). Faltariam 37 votos para levar o texto à Câmara dos Deputados.