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Senador Marcos do Val diz que Bolsonaro tentou coagi-lo a ajudar em golpe

Do UOL, em São Paulo

02/02/2023 07h52Atualizada em 02/02/2023 15h56

O senador Marcos do Val (Podemos-ES) disse que a tentativa para envolvê-lo num golpe contra a eleição de Lula partiu de Jair Bolsonaro e do então deputado federal Daniel Silveira (PTB).

Entretanto, Do Val teria recusado e denunciado, em dezembro, o caso ao ministro Alexandre de Moraes, presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral). O senador fez uma transmissão nas redes sociais durante a madrugada relatando a suposta coação de Bolsonaro.

"Eu ficava p*** quando me chamavam de bolsonarista. [...] E vocês esperem. Na sexta-feira, vai sair na [revista] Veja a tentativa de Bolsonaro de me coagir para que eu pudesse dar um golpe de Estado junto com ele. Só para vocês terem uma ideia. E é lógico que eu denunciei." Senador Marcos Do Val em trasmissão nas redes

Moraes autorizou a PF a ouvir Do Val sobre o caso. A solicitação foi feita no inquérito que investiga os atos de 8 de janeiro que destruíram o Palácio do Planalto, o Congresso Nacional e o STF (Supremo Tribunal Federal).

Após a repercussão do caso —e a prisão de Silveira hoje—, Veja publicou a reportagem, com a revelação de mensagens trocadas entre os parlamentares.

O que diz a revista?

Em 9 de dezembro, Do Val se reuniu com o ex-presidente e Silveira no Palácio da Alvorada.

O plano era de que alguém do círculo de confiança de Bolsonaro se aproximasse de Moraes e gravasse o ministro do STF, na tentativa de captar algo comprometedor para prendê-lo e impedir a posse de Lula.

Três dias depois, no entanto, conforme mensagens obtidas pela revista, Do Val enviou uma mensagem a Moraes pedindo para falar pessoalmente com o ministro.

"Dia emblemático", escreveu o parlamentar a Moraes.

Naquele 12 de dezembro, Lula havia sido diplomado pelo TSE e, à noite, apoiadores de Bolsonaro tentaram invadir a sede da PF para resgatar um preso e vandalizaram Brasília.

Precisava falar como foi o encontro com o PR [Presidente da República] e o DS [Daniel Silveira]" Mensagem de Do Val a Moraes

Segundo a revista, o senador relatou ao ministro do STF que Bolsonaro e Silveira haviam lhe convidado para participar de algo que ele definiu como "uma ação esdrúxula, imoral e até criminal".

Bolsonaro a Do Val: "Dá um pulinho aqui"

A reportagem relata que Do Val foi abordado por Silveira no Congresso dois dias antes da reunião no Alvorada. O deputado teria dito que o então presidente tinha um assunto importante e urgente para falar com ele.

Em uma conversa por telefone, Bolsonaro pediu para o senador "dar um pulinho" em sua residência oficial e o encontro ficou acertado para o dia 9.

Do Val conversou com Moraes antes de ir à reunião — segundo a revista, estava com receio de ser envolvido em algo que pudesse ser prejudicá-lo.

Código para falar sobre encontro

A reportagem revela que a reunião foi cercada de cuidados e que, por sugestão de Silveira, ele e Do Val só falariam por códigos.

No dia do encontro, o deputado passou uma mensagem de áudio ao senador passando instruções para que eles se encontrassem num local discreto, para que não fossem vistos.

Vou te mandar a minha localização, mas tu não entra não, no Alvorada. E nem chega perto da entrada. Tu não vai aparecer. Tu vai parar o carro no estacionamento que eu vou te mandar a localização. Eu vou estar ali. O carro vai vir buscar a gente Mensagem de áudio de Daniel Silveira a Marcos do Val no dia 9 de dezembro

Por volta das 17h30 daquele dia, o senador seguiu com seu motorista até a localização enviada por Silveira e, de lá, os dois seguiram ao Alvorada num carro da segurança de Bolsonaro e, por isso, não deixaram registros na portaria.

Silveira disse que Do Val era uma pessoa de sua confiança e pediu a Bolsonaro que apresentasse a ideia que "salvaria o Brasil". Conforme a revista, o presidente disse que o GSI (Gabinete de Segurança Institucional) e a Abin (Agência Brasileira de Inteligência) ajudariam na ação e forneceriam equipamentos de espionagem.

O senador deixou a reunião dizendo que iria pensar sobre o assunto e foi sondado por Silveira nos dias seguintes, mas não respondeu.

'Declínio' da missão

No dia 14 de dezembro, Moraes e Do Val se encontraram, conforme já havia sido acertado entre os dois. Segundo a revista, o parlamentar narrou o que havia ouvido do presidente e Moraes, em tom de espanto, teria respondido apenas: "Não acredito".

À noite, após conversar com o ministro, Do Val respondeu Silveira e disse que não participaria do plano.

O advogado Jean Garcia, que faz a defesa da Silveira, disse que, "sobre as declarações do senador Marcos do Val, enquanto ele não apresentar provas concretas, fatos comprovados, se trata apenas de especulação. Nós não comentamos especulações".

A assessoria de Moraes disse que ele não comentaria o caso. Bolsonaro está nos Estados Unidos há mais de um mês e não foi localizado.

Do Val disse que vai se afastar do Senado

O parlamentar se irritou após viralizar uma imagem na qual ele aparecesse cumprimentando Rodrigo Pacheco, reeleito ontem para mais dois anos na Presidência do Senado.

Em outra publicação, dessa vez por escrito, o senador falou sobre seu afastamento.

Perdi a convivência com a minha família, em especial com minha filha. Não adianta ser transparente, honesto e lutar por um Brasil melhor, sem os ataques e as ofensas que seguem da mesma forma. Nos próximos dias, darei entrada no pedido de afastamento do senado e voltarei para a minha carreira nos EUA."

Segundo Do Val, ele chegou a sofrer um princípio de infarto e os ataques que ele tem sofrido afetam também seus parentes.

Nada existe de grandioso sem paixão. Essa paixão não estou tendo mais em mim. As ofensas que tenho vivenciado, estão sendo muito pesado para a minha família."

A deputada estadual Janaina Paschoal (PTB-SP) disse que, após a repercussão do caso, ouviu do senador que ele não abandonará sua cadeira no Senado.

Marcos do Val foi eleito em 2018, com 24,08% dos votos capixabas. Na época, o então candidato do PPS (hoje Cidadania) ficou em segundo lugar, derrotando Magno Malta (PL), aliado de Jair Bolsonaro no Espírito Santo. Sua suplente é a evangélica Rosana Foerst.

Em reportagem publicada pelo jornal O Estado de São Paulo em julho passado, Do Val confirmou que recebeu R$ 50 milhões de emendas após a eleição de Rodrigo Pacheco (PSD-MG) para o primeiro mandato na presidência do Senado.

Após a repercussão da entrevista, o parlamentar emitiu uma nota em que chamou de "má interpretação" da reportagem e disse que fez referência a existência de critérios no Senado para indicações transparentes de recursos por senadores.

 
Errata: este conteúdo foi atualizado
Diferentemente do que informava a primeira versão do texto, Janaina Paschoal ainda é deputada estadual por SP, com mandato até março. O texto foi corrigido.