Com aval de Lula, chapa Boulos-Marta surgiu por falta de nomes no PT de SP

A chapa entre Guilherme Boulos (PSOL) e Marta Suplicy, que volta ao PT nesta sexta (2), surgiu de uma negociação que envolveu Lula e de uma constatação: seu nome traz mais benefícios à campanha à prefeitura da capital do que qualquer membro do partido em São Paulo.

O que aconteceu

Lula vai ter a eleição paulistana como prioridade, com diversas idas à capital. As conversas para a chapa começaram no início do ano passado, a partir de antigos integrantes da gestão de Marta à frente da prefeitura (2001-2004). Ex-presidente petista, o deputado Rui Falcão (PT-SP) tratou a questão diretamente com Lula.

O presidente se entusiasmou rapidamente com Marta na chapa. Como o UOL contou à época, ele foi o principal fiador do acordo para que o PSOL não lançasse candidato ao governo paulista em 2022, na disputa em que o PT lançou Fernando Haddad, em troca do apoio petista a Boulos na campanha pela prefeitura em 2024.

Boulos disse a Lula que ficaria "satisfeito" com quem o partido indicasse como vice —"trato é trato"—, mas todos, incluindo os petistas, preferiam um nome com viabilidade eleitoral e não apenas uma composição de chapa "para cumprir tabela".

Com força na periferia e bem avaliada até hoje pelos paulistanos, o nome da ex-prefeita caiu como uma luva. Houve alguns protestos de aliados, mas, com o apadrinhamento de Lula, ninguém conseguiu apontar nome melhor. O martelo estava batido.

Como Marta voltou ao PT

Marta voltou a se aproximar do PT durante a campanha de Lula, em 2022, quando subiu no palanque petista. O gesto agradou muito ao presidente e a sua cúpula. Ex-secretário de governo, Rui Falcão foi o primeiro a abordá-la com a ideia, discretamente, e um dos primeiros a tratar do tema com Lula. O presidente não só gostou como a sugestão começou a circular pelo Palácio do Planalto em outubro.

Ela nunca foi exatamente próxima do prefeito Ricardo Nunes (MDB). Marta se tornou secretária de Relações Internacionais após convite do ex-prefeito Bruno Covas (PSDB), morto em 2021. Interlocutores contam que ela não "compartilhava de certos valores" do chefe, o que facilitou a abordagem petista.

Lula se encontrou com Boulos e Marta no ano passado em Brasília, fora da agenda. À ex-companheira, falou que seria um prazer tê-la mais uma vez "do mesmo lado" e relembrou histórias. A Boulos, disse que ele "tinha muito o que aprender" com Marta. Enquanto o parlamentar está em seu primeiro mandato, ela já foi prefeita, senadora, deputada e ministra.

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Duas condições: voltar ao PT e deixar a gestão Nunes. O retorno ao antigo partido já havia sido sugerido por Rui, pelo ex-ministro Edinho Silva (PT), atual prefeito de Araraquara, e pelo deputado estadual Antônio Donato (PT-SP). Ela não mostrou resistência em retornar à sigla, onde ficou mais de três décadas, entre 1981 e 2015.

A presidente petista, Gleisi Hoffmann, também gostou da sugestão. Segundo aliados, houve uma ala que protestou, lembrando o passado recente da ex-ministra. Ao sair do partido, ela fez críticas e chegou a votar a favor do impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT), de quem foi ministra. Como resposta, ouviram: não há, no PT paulistano hoje, nome mais forte.

PT com menos força na capital

O PT governou a cidade de São Paulo três vezes, com a deputada Luiza Erundina (hoje no PSOL), com Marta e com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad —não conseguiu a reeleição em nenhuma delas. Desde então, fora Haddad, nenhum outro candidato tem apresentado resultados expressivos tanto para a prefeitura quanto para o governo do estado. O partido nunca comandou o Executivo paulista.

Haddad foi derrotado por João Doria (então no PSDB) no primeiro turno em 2016, também impulsionado pelo antipetismo e lavajatismo. O PT paulistano nunca mais encontrou outro protagonista.

  1. Em 2018, o ministro do Trabalho, Luiz Marinho (PT), só ficou em um quarto lugar na cidade, com menos de 1 milhão de votos (16%), na busca pelo Palácio dos Bandeirantes.
  2. No último pleito municipal, em 2022, Jilmar Tatto (PT) amargou a quinta posição, com 8,6%.
  3. Em 2022, Haddad voltou às graças com a cidade, vencendo o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) com 54% dos votos --resultado revertido no total de votos no estado.
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O PT de SP vê mais um sucesso da campanha do ministro do que a uma melhora do partido na capital. Se o partido tivesse um nome forte para 2024, nunca teria aceitado o acordo com Boulos.

Boulos em evento de Lula em São Paulo: de cabeça na campanha
Boulos em evento de Lula em São Paulo: de cabeça na campanha Imagem: Bruno Santos/ Folhapress

De olho em 2026

Como Haddad, outros nomes acabaram sendo descartados por terem outras pretensões. O foco é em 2026.

O ministro Alexandre Padilha (Relações Institucionais) é tido como um quadro que poderia, como Marta, puxar votos nas classes mais populares, em especial na área da saúde, onde foi ministro e secretário municipal, mas seu voo está mais alto. Ministro palaciano com acesso direto a Lula, Padilha é um dos principais cotados para disputar a reeleição de Tarcísio. Ele já tentou ocupar o Palácio dos Bandeirantes em 2014, mas foi derrotado pelo vice-presidente Geraldo Alckmin (então PSDB) no primeiro turno e acabou em terceiro lugar.

Outros nomes, como o do próprio Rui Falcão, do colega Carlos Zarattini (PT-SP) ou do ministro Paulo Teixeira (Desenvolvimento Agrário) chegaram a circular, mas foi decidido, quase que rapidamente, que contribuem mais em Brasília.

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Um complementa o outro

Marta é o nome certo para os envolvidos. A narrativa, tanto para o PSOL quanto para a própria Marta, estava pronta: se Boulos, forte em pautas sociais, tem adesão baixa na periferia, encontra na ex-prefeita uma avaliação positiva nos chamados "extremos" da cidade, ao sul e a leste, em especial por sua política de transporte.

Marta foi considerada a melhor prefeita de São Paulo desde a redemocratização por uma pesquisa Quaest de dezembro do ano passado. Ela foi escolhida por 24% dos moradores, com Luiza Erundina e Paulo Maluf (9%) na sequência. Nunes ficou em último, com 1%.

Marta tem ainda entrada com empresários e a chamada alta sociedade paulistana, da qual sempre fez parte. Descendente de uma das famílias mais tradicionais da cidade, ela circula entre a chamada classe A, onde Boulos tem pouca entrada.

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