Brasil tem aumento de 73% em apreensão de cocaína em 10 anos, diz Anuário

A Polícia Federal apreendeu 730 toneladas de cocaína entre 2013 e 2023. Nesse período, o crescimento das apreensões foi de 73,7%, segundo o 18º Anuário Brasileiro de Segurança Pública, divulgado hoje (18).

O que aconteceu

O volume saltou de 41,7 toneladas em 2013 para 72,5 toneladas em 2023. Entre 2022 e 2023, porém, as apreensões da droga pela PF diminuíram 24,9%. Somando os 11 anos analisados, chega-se ao montante de 729,9 toneladas.

Brasil é o segundo maior mercado consumidor de cocaína do mundo, perdendo apenas para os Estados Unidos. A constatação é do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC). O país se tornou "importante hub logístico para a distribuição de drogas", afirma Renato Sérgio de Lima, presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

O pico de apreensões na série histórica ocorreu em 2019, com a apreensão de 104,6 toneladas de cocaína. Já entre 2017 e 2018 ocorreu o maior salto em termos de volume de apreensões com um aumento de 64,8%. Nesse período, o país vivia o estopim de um intenso conflito entre as facções criminosas PCC (Primeiro Comando da Capital) e CV (Comando Vermelho) — que culminou com um pico das taxas de homicídios.

Apreensões de cocaína se estabilizam e alcançam patamar superior a partir de 2018, aponta Anuário. Entre 2018 e 2023, a média de toneladas apreendidas foi de 89,6. Já entre 2013 e 2017, foram apreendidas 38,5 toneladas de cocaína, em média.

Oferta global de cocaína alcançou pico histórico em 2002. Segundo o UNODC, foram mais de 2.700 toneladas da droga produzidas naquele ano — um crescimento de 20% em relação ao ano anterior. Entre os anos de 2010 e 2022, a produção de cocaína aumentou 143% ao passo que as apreensões cresceram 220%.

Volume apreendido cocaína no ano passado equivaleria a R$16 bilhões ou a US$2,9 bilhões, segundo estimativas da UNODC. Mas, segundo estimativas de delegados da PF, apenas metade da cocaína que passa pelo país é apreendida. Com isso, pesquisadores do Fórum Brasileiro de Segurança Pública afirmam que o volume da droga que passou pelo Brasil no ano passado equivaleria a ao menos R$ 32 bilhões ou US$ 5,8 bilhões.

Brasil como rota estratégica para o tráfico internacional

O Centro-Oeste passou a ser a região com maior volume de toneladas apreendidas em 2023. Segundo o presidente do FBSP, o Mato Grosso teve um papel importante no escoamento do tráfico internacional de drogas. "Não à toa, a cidade de Sorriso está entre as mais violentas do país", afirma Lima. Segundo os dados, o volume de cocaína apreendido no Mato Grosso foi maior do que o da região norte inteira.

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Sudeste foi a região com maior volume de apreensões na série histórica. Mas, desde 2019 apresenta tendência de redução, superada pela Centro-Oeste em 2023. Embora entre 2022 e 2023, o Brasil tenha registrado redução no volume de apreensões de cocaína, duas regiões registraram aumento: no Centro-Oeste subiu 9,8% e no Sudeste foi de 23,9%.

São Paulo, Mato Grosso, Paraná, Rondônia e Pernambuco foram os estados com maior volume de apreensão de cocaína. "Todas as cidades mais violentas estão em pontos estratégicos de distribuição da droga, têm porto ou aeroporto ou uma infraestrutura importante para o escoamento", afirma Lima.

Na última década, São Paulo é o estado com maior volume acumulado de apreensões de cocaína. As 231,8 toneladas da droga apreendida em território paulista tem um volume quase três vezes maior do que o estado que ocupa o segundo lugar, o Paraná, com 83,4 toneladas. Na sequência, vem Mato Grosso, que pertence à Amazônia Legal, Mato Grosso do Sul, Bahia, Amazonas e Rondônia.

Concentração de volume de droga nesses estados apontam para rotas transnacionais. Segundo o Anuário, são estados fronteiriços, vizinhos de países produtores — como é o caso do Paraná, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Amazonas e Rondônia. Do outro lado, estão os estados com saída para o mar, como São Paulo e Bahia.

Aumento vertiginoso de cocaína apreendida na região Norte em 2022, segundo Anuário. Os dados apontam que enquanto a média de apreensão dos últimos dez anos foi de seis toneladas, o ano de 2022 registrou 19 toneladas. Segundo os pesquisadores David Marques e Marina Bohnenberger, o aumento dificilmente pode ser explicado apenas por uma maior atuação das forças de segurança federais.

Apreensões de maconha sobem mais do que de cocaína

Entre 2013 e 2023, a Polícia Federal apreendeu 3,6 mil toneladas de maconha no país. O crescimento do volume apreendido foi de 87,1%. De acordo com os dados do 18º Anuário, o volume saiu de 222,6 toneladas em 2013 para 416,4 toneladas no ano passado.

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Apreensões de maconha do ano passado se concentram na região Sul, seguida pelo Centro-Oeste. Segundo o FBSP, a concentração revela uma mudança de padrão, que teve início em 2021. Nesse ano, os pesquisadores apontam que as apreensões de maconha parecem ter se deslocado do Centro-Oeste para o Sul.

Dados mostram incremento nas apreensões de maconha na região Norte entre 2021 e 2022. O aumento nesse período foi de 347%, percentual puxado pelas apreensões no Amazonas e Rondônia.

Dificuldades para apreender e contabilizar

O Brasil não possui parâmetros para reunir e contabilizar de forma adequada as apreensões do volume total de drogas que circula no país. Segundo informações do Anuário, há uma parceria entre a Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas e Gestão de Ativos do Ministério da Justiça e Segurança Pública e do FBSP para aumentar a precisão na contabilidade dos volumes apreendidos por diferentes forças de segurança.

Boletins de ocorrência registrados pelas Polícias Civis também servem para contabilizar o volume de droga apreendido. Em 2023, foram registrados 240.092 boletins de ocorrência com apreensão de drogas — 7,7% a mais do que no ano anterior.

"Ainda não há uma pactuação sobre as apreensões", diz Lima. O presidente do Fórum explica que em uma operação de apreensão de drogas todas polícias que participam registram a quantidade de droga apreendida no balanço da corporação. Isso, segundo ele, dificulta a produção de dados nacionais sobre o volume de apreensão.

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GLO dos portos e aeroportos para combater o crime organizado foi "inócua", segundo o presidente do Fórum. "Focar no combate ao crime em portos não é ruim, mas não foi uma solução adequada porque rapidamente o crime encontrou outro caminho de se propagar", afirma.

Dados obtidos pelo UOL mostram que o valor empregado na GLO foi de R$ 177,4 milhões. Segundo o Ministério da Justiça e da Segurança Pública, as Forças Armadas receberam R$ 140 milhões, a Polícia Rodoviária Federal, R$ 32.175.451,90, a Polícia Federal, R$ 3.671.892,71 e Força Nacional, R$ 1,6 milhão. Contudo, na avaliação do presidente do FBSP, a divisão de recursos deveria privilegiar a PF que tem presença em todas as ações de apreensão.

Aumentou a quantidade de drogas consumidas em circulação. Com isso, cresce o poder econômico das facções criminosas. Assim, o crime organizado começa a comprometer setores formais da economia como postos de gasolina, chegando até a setores políticos.
Renato Sérgio de Lima, presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública

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