INSS ignorou 6 alertas e atendeu interesses de entidades suspeitas, diz PF
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Investigações da Polícia Federal e da CGU (Controladoria-Geral da União) apontam que o INSS foi omisso no caso da suposta fraude bilionária em descontos de beneficiários apesar dos alertas de órgãos de controle.
O que aconteceu
As informações da Polícia Federal contradizem os argumentos apresentados pelo governo Lula. Em nota oficial divulgada na última sexta-feira, o INSS disse que adotou providências que facilitam o cancelamento dos descontos pelos usuários e implementou regras mais duras para acordos com entidades. A PF, porém, fez cronologia dos atos da direção do INSS que mostram que o próprio órgão abriu exceções às regras que ele mesmo criou para desbloquear os descontos em folha e ainda ignorou seis alertas feitos pela CGU (Controladoria-Geral da União) entre maio e julho de 2024.
A partir das investigações, a Justiça Federal afastou o presidente do INSS e outros quatro dirigentes da cúpula do órgão. Em entrevista à Folha de S.Paulo, o ministro Carlos Lupi (Previdência) voltou a negar omissão, atribuiu as irregularidades à gestão anterior e disse que até demitiu um diretor do INSS que não teria dado andamento a uma auditoria. O UOL questionou o ministro sobre os fatos apontados pela PF. Em nota, o ministério informou que não comenta investigações sob sigilo e reencaminhou a nota oficial divulgada sexta.

PF chegou a citar falas do então presidente do INSS em 2024 informando que havia adotado medidas para combater a fraude. Investigadores, porém, identificaram que iniciativas não tiveram sucesso devido às ações da própria direção do INSS, incluindo do então presidente Alessandro Stefanutto, para burlar os critérios mais rigorosos.
Descontos começaram a crescer de forma desproporcional em 2019, no governo Bolsonaro, diz PF. Foi neste ano que começaram a ser firmados os acordos de cooperação técnica, que permitiam o desconto direto em folha dos aposentados e pensionistas do INSS de mensalidades pagas a entidades que ofereciam benefícios. Estes acordos foram todos suspensos após a operação da PF na semana passada.

O INSS não comentou sobre as acusações da PF. A Reportagem solicitou posicionamento ao órgão na quinta-feira passada e, em resposta, recebeu a mesma nota que divulgaram no site. Nela, INSS não cita especificamente as acusações da PF e afirma que começou a testar o sistema de biometria da Dataprev em maio do ano passado, mas que ele só foi implementado, de fato, em fevereiro de 2025.
Confira abaixo a cronologia feita pela investigação da PF:
14 de março de 2024 - INSS edita a instrução normativa 162, que condicionava os novos descontos de beneficiários à adoção de tecnologias de assinatura eletrônica avançada e biometria. Os parâmetros destas tecnologias para dificultar fraudes seriam definidos pela Dataprev, empresa pública responsável por gerir a base de dados do INSS.
10 de abril de 2024 - INSS envia medida cautelar à Dataprev informando que, a partir de maio daquele ano, não seriam permitidos novos descontos em folha que não respeitassem as novas regras. Na prática, a medida representou um bloqueio dos descontos em folha dos beneficiários naquele momento.
11 de abril de 2024 - INSS divulga em seu site o bloqueio dos descontos até que fossem implementadas novas tecnologias da Dataprev para garantir a segurança do sistema.
24 de maio de 2024 - Em paralelo aos bloqueios, diretoria de Benefícios do INSS inicia tratativas com a Dataprev para buscar uma "solução transitória" para que os descontos voltassem a ser feitos em junho daquele ano, com base em propostas apresentadas por duas entidades, sendo uma delas o Sindnapi (Sindicato Nacional dos Aposentados), que tem como vice-presidente um dos irmãos do presidente Lula, conhecido como Frei Chico.
29 de maio de 2024 - Dataprev responde ao INSS e diz que as propostas das duas entidades não atendem aos requisitos da instrução normativa e que seria "prudente" aguardar até setembro de 2024, prazo previsto para implementação da tecnologia da própria Dataprev.
30 de maio de 2024 - Diretoria de Benefícios pede ao então presidente do INSS, Alessandro Stefanutto, que a regra "transitória" comece a valer em junho de 2024.
5 de junho de 2024 - Presidente do INSS autoriza que regra transitória comece a valer no mesmo mês apenas para três entidades: Sindnapi, Amar BR e Masterprev. A tecnologia prevê "assinatura eletrônica avançada e biometria facial com validação em bases biométricas públicas" que não haviam sido chanceladas pela Dataprev.
Junho de 2024 - PF e CGU descobrem que, além dessas três entidades, em junho daquele ano foram autorizados os descontos em folha para outras 30 entidades que não tiveram seus procedimentos de autorização fornecidos aos responsáveis pela investigação.
10 de junho de 2024 - INSS pede à Dataprev que analise documentação eletrônica sobre o portal de assinaturas eletrônicas da Masterprev.
13 de junho de 2024 - Dataprev informa ao INSS que a documentação encaminhada não é suficiente para atestar que o sistema de assinaturas da Masterprev atende aos parâmetros técnicos necessários.
19 de setembro de 2024 - CGU solicita providências sobre entidades que receberam recursos de descontos em folha e não prestaram informações adequadas para explicar essas cobranças ao órgão de controle. Além disso, a CGU reiterou outros seis pedidos de providências encaminhados entre maio e julho e que estavam sem resposta.
16 de outubro de 2024 - CGU solicita reunião com direção do INSS para verificar a implementação das recomendações. Reunião é marcada para 11 de novembro.
14 de novembro de 2024 - Após constatar que as medidas recomendadas para mitigar fraudes não haviam sido atendidas, CGU emite nova nota técnica alertando que a regra transitória adotada pelo INSS para liberar os descontos trouxe "riscos significativos" de perpetuação das fraudes e de descontos indevidos.
O que dizem a PF e a CGU
Além dos desbloqueios "excepcionais" feitos no ano passado, PF e CGU também apontam que foram assinados sete novos acordos com entidades em 2024. Tudo isso feito quando já havia auditorias e alertas da CGU, do TCU (Tribunal de Contas da União) e da própria auditoria interna do INSS, segundo a investigação. Na representação, a PF não lista quais seriam estas sete entidades.
Nesse contexto, o desbloqueio de benefícios de maneira excepcional sem previsão normativa e a autorização de inclusão de novos descontos baseados em termo de compromisso de que os sistemas das entidades estariam em aderência aos requisitos técnicos se caracterizam como atos temerários ante a quantidade de problemas relatados na mídia (...) bem como pela Auditoria-Geral do INSS, que reforçam o risco assumido pela direção do INSS ao autorizar e demandar à Dataprev ajustes em sistema para permitir a inclusão de descontos mediante a utilização de biometria alternativa, medida que, como antes registrado, não possui previsão normativa.
Trecho de auditoria da CGU que embasou investigação da PF
Outro lado
Defesa de Stefanutto diz que ele agiu para coibir fraudes e que investigação não provou dolo dele. Em nota enviada por seu advogado, ex-presidente do INSS diz que sua gestão instaurou auditoria interna e solicitou informações à PF. Defesa, também afirma que está "confiante" de que a verdade dos fatos será "restabelecida" ao final da investigação. Confira abaixo a nota:
Durante sua gestão à frente do INSS, foram adotadas medidas rigorosas e inovadoras para corrigir distorções históricas relacionadas aos descontos de mensalidades associativas em benefícios previdenciários;
- Ao liberar em lote as fichas de inscrição dos aposentados filiados à Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), o ex-presidente atendeu a um informe prévio da Dataprev avalizando a medida;
- A análise de todo o material levantado pelas autoridades mostra que, ao individualizar as condutas dos investigados, os agentes da Polícia Federal e auditores da Controladoria Geral da União (CGU) não conseguiram comprovar dolo por parte de Stefanutto no caso em questão;
- As únicas menções ao ex-presidente em todo o caso demonstram que, de diversas formas, ele agiu para coibir as eventuais fraudes e impedir que elas se repetissem no futuro;
- Diante de todos os fatos, a defesa de Stefanutto segue confiante que, ao final da investigação, a verdade dos fatos será restabelecida e a inocência do ex-presidente será confirmada.
- Entre as medidas adotadas estão a suspensão de NOVOS Acordos de Cooperação Técnica (ACTs) firmados pelo órgão com entidades e associações, a determinação para que fossem exigidas assinatura eletrônica avançada e biometria para autorização de novos descontos e a implementação do sistema biométrico da Dataprev (PDMA) para garantir a segurança das averbações;
- Além disso, foi criado um canal de exclusão automática de descontos no aplicativo Meu INSS e na Central 135 e para permitir consulta imediata e bloqueio de descontos por comando de voz, facilitando o acesso a idosos e pessoas com deficiência;
- Todo este trabalho resultou em mais de 3,5 milhões de descontos associativos não reconhecidos pelos beneficiários entre janeiro de 2023 e março de 2025. Para se ter uma ideia, em 2022 foram apenas 121 mil cancelamentos, o que mostra que o INSS combateu os descontos indevidos;
- Em paralelo com o trabalho de aprimoramento dos mecanismos de controle, Alessandro também determinou, em maio do ano passado, a abertura de uma investigação no âmbito da AUDITORIA e encaminhou um ofício à Polícia Federal para obter informações sobre eventuais apurações, medida necessária para auxiliar o INSS a combater eventuais fraudes internamente;
187 comentários
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José Eduardo Wood
aquilo que o Bolsonaro avisou em 2022 está acontecendo mas o povo quis pagar o preço. A corrupção do governo do PT está explodindo. Foi pra isso que eles vieram
Alberto Fernandes
Vamos deixar bem claro, o Lula não sabia de nada. Nem que tinha irmão no sindicato que mais arrecadou dinheiro dos velhinhos.
Hamilton Octavio de Souza
Demitir o Lupi não basta. Com todo respeito aos aposentados, já passou da hora de aposentar o Lula. Chega de políticos venais, populistas autoritários e juízes farsantes. O país precisa urgentemente de homens e mulheres empenhados na construção de país justo, igualitário, livre, democrático e soberano – com respeito aos direitos fundamentais e com qualidade de vida para todos. A luta é contra as oligarquias, clãs familiares, grupos patrimonialistas e castas privilegiadas do Estado que sugam os recursos públicos e sabotam as demandas da sociedade.