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Justiça suspende proibição da venda de bebidas alcoólicas em SP após as 20h

Proibição foi determinada por decreto estadual tinha como objetivo conter o avanço da covid-19 - Daniel Teixeira/Estadão Conteúdo
Proibição foi determinada por decreto estadual tinha como objetivo conter o avanço da covid-19 Imagem: Daniel Teixeira/Estadão Conteúdo

Anaís Motta, Carolina Marins e Douglas Porto

Do UOL, em São Paulo

14/12/2020 21h01Atualizada em 14/12/2020 23h05

O TJ-SP (Tribunal de Justiça de São Paulo) suspendeu hoje, em decisão liminar, parte de um decreto do governo estadual que proibia a venda de bebidas alcoólicas em São Paulo depois das 20h. A medida, assinada pelo governador João Doria (PSDB), vigorava desde o último sábado (12) e tinha como objetivo conter o avanço do coronavírus no estado.

A decisão do desembargador Renato Sartorelli atende a uma ação movida pela Abrasel (Associação Brasileira de Bares e Restaurantes), que questionou os motivos que levaram Doria a proibir a comercialização de bebidas alcoólicas à noite. Além de acusar o estado de se basear em opiniões pessoais, a entidade afirma que a medida afeta a livre concorrência e a livre iniciativa, princípios previstos na Constituição.

No texto enviado ao TJ-SP, a Abrasel acusa o governo Doria de se basear em "preconceito" na implementação da Fase Amarela do Plano São Paulo. "Sem amparo em qualquer tipo de pesquisa, estudo ou dados científicos, e baseado em puro achismo e opinião pessoal equivocada, o Coordenador Executivo do Centro de Contingência do Coronavírus recomendou ao Governador a despropositada proibição", diz o documento.

Em consonância com a Abrasel, Sartorelli disse não vislumbrar "qualquer estudo científico que estabeleça relação de causa e efeito entre a venda de bebidas alcoólicas e a contaminação pela covid-19", citando ainda os prejuízos financeiros causados ao setor de bares e restaurantes com a proibição.

"A OMS estabelece que o consumo de álcool é associado a uma série de ambientes de risco que fazem o indivíduo mais vulnerável ao contágio do coronavírus", afirmou ao UOL a secretária estadual de Desenvolvimento Econômico, Patrícia Ellen.

"Também relatam que o consumo de álcool compromete o sistema imunológico, aumentando a probabilidade de ser infectado. Sem falar de todos os estudos que relacionam o abuso de álcool como fator de risco para pneumonia e síndrome respiratória aguda grave", completou, negando a acusação de ausência de estudos por trás da decisão.

Em nota, o governo de São Paulo explicou que a suspensão foi adotada após especialistas do Centro de Contingência do coronavírus identificarem que os adultos jovens, entre 30 e 50 anos, são atualmente a maior demanda por leitos hospitalares de covid-19. Além disso, aqueles entre 20 e 39 anos representam 40% dos novos casos confirmados no estado.

Limitar a venda de bebidas alcoólicas, portanto, seria uma forma de evitar aglomerações durante o lazer noturno e reduzir os níveis de contaminação desta parcela da população.

Entidade compara Fase Amarela a Lei seca de Al Capone

O pedido de liminar da Abrasel chama o decreto paulista de "lei seca" e cita como exemplo o mafioso italiano Al Capone que viveu entre 1899 e 1947.

Leis secas nunca deram certo em num momento na história da humanidade. À época de Al Capone se aprendeu isso à duras penas, mas vez ou outra, aqui no Brasil, falsos moralistas acham um jeito de tentar proibir a venda de bebidas, todas elas com resultados desastrosos, seja para economia, em razão de os estabelecimentos passarem à ilegalidade, seja para a saúde pública, com as pessoas passando a consumir produtos clandestinos."
Trecho do pedido de liminar da Abrasel

Ao UOL, Patrícia Ellen se disse surpresa com a atitude da associação pois, segundo ela, houve diversos diálogos com os setores afetados, tendo inclusive ela própria e o governador João Doria já se encontrado com a Abrasel. "É bastante surpreendente que depois de oito meses de pandemia, a gente tenha esse tipo de situação".

Estamos falando de vidas. Não é normal um país ter 180 mil pessoas mortas e a gente ficar fazendo esse tipo de comparação. Tem algo muito errado aí. Todos nós precisamos voltar para casa, colocar a cabeça no travesseiro e refletir qual é o nosso papel no controle da pandemia."
Patrícia Ellen, Secretária de Desenvolvimento Econômico de São Paulo.

Outras restrições seguem valendo

A liminar do TJ-SP suspende apenas a proibição da venda de bebidas alcoólicas após as 20h, mantendo as demais restrições de horário e ocupação impostas pelo decreto estadual. Isso significa que restaurantes e lojas de conveniência poderão comercializar bebidas depois desse horário, mas precisarão fechar às 22h.

Bares encerram mais cedo, às 20h, e só podem funcionar com até 40% de sua capacidade máxima. Todos eles devem ter mesas com até seis pessoas e cumprir protocolos determinados pela vigilância sanitária, como aferição de temperatura, disponibilização de álcool em gel e distanciamento mínimo de 1,5 metro entre as mesas.

A Abrasel, no entanto, já sinalizou que deve entrar amanhã com uma outra ação na justiça, dessa vez contra as demais restrições da fase amarela do plano. Em entrevista ao UOL na sexta-feira, o presidente da Abrasel SP, Percival Maricato, disse que o estado estava punindo "quem faz a lição de casa".

Hoje, o presidente voltou a apontar o comércio de rua como causador do aumento de casos de covid-19 no estado: "A mídia tem noticiado constantemente dezenas de milhares de pessoas circulando aglomeradas na rua 25 de março, no Brás, nos pancadões, praias e transportes públicos lotados, muita gente sem máscara, e até há pouco tempo, amontoadas nas ruas em plena e animada campanha eleitoral."

Patrícia Ellen, no entanto, rebate que os comércios de rua fecham mais cedo que os bares e há descumprimento dos protocolos de todas as partes. "Há infinitos relatos de descumprimento nos bares. As maiores aglomerações com maiores transmissões são nos bares e nas festas, principalmente as ilegais".