Fila, UTIs lotadas e remédios em falta: por que o colapso já é real no país
Apesar do discurso do governo federal de que o país não passa, nem passará, por um colapso na saúde, a realidade em quase todos os estados aponta para uma situação dramática, em uma semana marcada por recorde de mortos, falta de vagas em UTIs (Unidades de Terapia Intensiva) e escassez de medicamentos.
Segundo levantamento feito pelo UOL com base nos registros das secretarias estaduais, há pelo menos 40 mil pessoas internadas em leitos de UTI com covid-19 nas 27 unidades da federação.
Apesar da omissão de dados de muitos locais, a fila chega a pelo menos 4.500 pessoas em 15 estados mais o Distrito Federal.
Dos pacientes internados, quase um terço —12.588— está em terapia intensiva em São Paulo. O estado do Rio não informa o total de leitos, só a ocupação, o que impede saber o número de pessoas internadas.
Por conta da falta de sedativos, pacientes intubados estão acordando no processo de ventilação mecânica, segundo profissionais da saúde.
Com as internações em alta inédita, há um iminente risco de falta de insumos. Levantamento divulgado pela CNM (Confederação Nacional dos Municípios) apontou que, das 2.600 prefeituras ouvidas entre 23 e 25 de março, 50,4% afirmaram que podem ter de suspender atendimentos por falta de medicamentos do kit intubação.
Além disso, 27% alegaram risco de falta de oxigênio em hospitais ou centros de atendimento.
O Conass (Conselho Nacional de Secretários de Saúde) fez um alerta de que podem faltar medicamentos em UTIs.
A situação também é grave em unidades privadas. O Sindicato dos Hospitais, Clínicas e Laboratórios do Estado de São Paulo (SindHosp) informou ontem que vai auxiliar hospitais a criar um consórcio para importar, de forma coletiva, medicamentos destinados à intubação.
A Santa Casa de São Carlos informou que, por falta de anestésicos, deixará de receber pacientes com covid-19.
São 24 estados, mais o Distrito Federal, das 27 unidades da federação, com ocupação de UTI igual ou superior a 80%, 15 deles com taxa igual ou superior a 90% de ocupação. É uma situação gravíssima. Se não é colapso, é o que então?
Bernadete Perez, sanitarista, pesquisadora e vice-presidente da Abrasco
Fila de espera
Se a situação de quem está internado é de medo, a de quem está na fila de espera é de desespero. Na quinta-feira, segundo o Conass, eram 6.371 pessoas aguardando por uma vaga em UTI. O maior número é em São Paulo, onde esse número chega a 1.500 pacientes.
Levantamento do "Agora" mostrou que mais de cem pessoas morreram sem direito a leito. No estado, as internações estão 85% maiores que o pico de 2020.
Em Minas Gerais, esse número de pessoas em espera chega a 700 doentes. No Rio de Janeiro, ontem havia 634 pacientes esperando leitos de UTI —um recorde na pandemia.
No Ceará há mais de 400. No Distrito Federal, esse número ontem era de 353; e em Pernambuco havia 174 pacientes esperando um leito de terapia intensiva na noite desta sexta-feira.
Colapso leva a tragédias
O colapso é uma realidade pelo país, e casos de mortes sem o devido atendimento se espalham pelo país. Em Teresina, na semana passada, um caso consternou o país: um homem morreu atendido no chão em UPA (Unidade de Pronto Atendimento) que estava superlotada.
Sem vagas, muitos morrem sem atendimento adequado. No Espírito Santo, na segunda-feira, aos 34 anos, Vinicius Pin, eleito Mister Espírito Santo em 2013, morreu por complicações da covid-19 enquanto esperava por um leito de UTI em um hospital da região metropolitana de Vitória.
No mesmo dia, foi uma jovem de 22 anos que morreu em Fernandópolis (SP) esperando vaga.
Em Brasília, o colapso leva corpos a se amontoarem no chão e nos corredores por horas em hospitais.
Diante do cenário, o presidente da Abredif (Associação de Empresas e Diretores do Setor Funerário), Lourival Panhozzi, pediu aos fabricantes caixões que "trabalhem com sua capacidade máxima para evitar a falta de materiais nos sepultamentos".
Para a sanitarista e pesquisadora Bernadete Perez, a situação no país é caótica. "Pela primeira vez a gente tem um aumento simultâneo, em diversos estados do país, de casos, de positividade de testes, de ocupação hospitalar. São vários indicadores que revelam o pior colapso do sistema público da história do Brasil", diz.
Ela lembra que isso foi confirmado pelo boletim extraordinário da Fiocruz da semana passada, que cita o maior colapso hospitalar do país.
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