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Brexit: 5 pontos-chave do novo acordo entre o Reino Unido e a União Europeia

Primeiro-ministro do Reino Unido, Boris Johnson, cumprimenta o presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker - Zheng Huansong/Xinhua
Primeiro-ministro do Reino Unido, Boris Johnson, cumprimenta o presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker Imagem: Zheng Huansong/Xinhua

18/10/2019 13h16

Boris Johnson e Jean-Claude Juncker chegaram a um acordo sobre a saída do Reino Unido da União Europeia, mas texto ainda precisa ser aprovado pelo parlamento britânico ? saiba o que muda com esse novo pacto.

Mais um capítulo da novela do Brexit.

O primeiro-ministro do Reino Unido, Boris Johnson, e o presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, anunciaram na ontem terem chegado a um acordo sobre o processo de saída do Reino Unido da União Europeia.

"Chegamos a um ótimo novo acordo que nos devolve o controle", escreveu Johnson no Twitter, enquanto Juncker classificou o texto como "justo e equilibrado".

Nas últimas semanas, as equipes de negociação trabalharam para chegar a um acordo que permitirá concretizar a saída do Reino Unido do bloco europeu, marcada para 31 de outubro, de forma mais organizada.

A decisão da saída é resultado de um referendo de julho de 2016, que ainda não se concretizou por falta de acordo sobre como o "divórcio" se dará.

Mas o novo acordo ainda precisa da aprovação da Câmara dos Comuns (equivalente à Câmara dos Deputados no Brasil) do Parlamento britânico. Os líderes da União Europeia ratificaram o documento no mesmo dia do anúncio.

Em Londres, Johnson tem agora a difícil tarefa de convencer os parlamentares a aprovarem sua proposta ? enquanto isso, em Bruxelas, Juncker parece ter fechado as portas para a União Europeia conceder uma nova prorrogação do prazo para a saída.

"Temos um acordo. Por que precisaríamos de uma prorrogação?", questionou o presidente da Comissão Europeia.

1. O que muda?

Em grande parte, o protocolo de saída anunciado por Boris Johnson é o mesmo negociado por sua antecessora, Theresa May. As principais mudanças se referem à Irlanda.

Desde o início das negociações, uma das questões essenciais para o premiê britânico era se livrar do controverso backstop, a "salvaguarda irlandesa", que na visão dos críticos levaria o Reino Unido a ficar vinculado aos regulamentos da União Europeia por tempo indeterminado.

Trata-se de uma política negociada por May sobre o futuro da fronteira entre a Irlanda (república independente que integra a UE) e a Irlanda do Norte (território que, junto com Escócia, País de Gales e Inglaterra, forma o Reino Unido) ? e que se tornou o principal obstáculo encontrado pelos parlamentares britânicos para aprovar o pacto anterior de saída.

O atual acordo elimina essa polêmica cláusula. Assim, o primeiro-ministro espera contar com o apoio do seu partido e do Partido Unionista Democrático (DUP) da Irlanda do Norte para a aprovação do novo texto no Parlamento.

Pelo novo acordo, o Reino Unido segue se comprometendo a pagar a "conta do divórcio", avaliada em quase 50 bilhões de euros.

O texto também garante os direitos tanto de cidadãos da União Europeia residentes no Reino Unido, quanto de cidadãos britânicos que vivem na União Europeia.

2. Que relação comercial estabelece?

Todo o Reino Unido deixará a união aduaneira da União Europeia, o que significa que o país poderá estabelecer acordos comerciais com outras nações no futuro.

A questão-chave está na Irlanda novamente.

Haverá uma "fronteira aduaneira legal" entre a Irlanda do Norte e a República da Irlanda, que permanecerá dentro da União Europeia. Mas, na prática, a "fronteira" em termos alfandegários será entre a Grã-Bretanha e a ilha da Irlanda, uma vez que os controles serão feitos nos "portos de entrada" da Irlanda do Norte.

O que isso significa? Esses controles e verificações vão ocorrer nos portos da Irlanda do Norte, o que evitará a necessidade de levantar uma fronteira dentro da ilha para executar esses procedimentos.

As autoridades britânicas serão responsáveis por fazer o controle no local de entrada no território, sob supervisão da União Europeia.

A Irlanda do Norte permanecerá alinhada com o mercado comum europeu em algumas questões - como bens e produtos, mas não no caso de serviços, por exemplo.

No entanto, a região também continuará fazendo parte da União Aduaneira do Reino Unido, por isso será incluída em qualquer acordo comercial fechado por Londres após o Brexit.

Sob esse sistema, não será necessário pagar impostos automaticamente sobre mercadorias que entrem na Irlanda do Norte a partir da Grã-Bretanha.

Mas, se algum produto for considerado passível de ser transportado para a República da Irlanda - que faz parte da união aduaneira da União Europeia - deverá ser paga uma taxa comunitária.

Um comitê conjunto decidirá no futuro que produtos são considerados "suscetíveis" (ou "arriscados") a entrar no mercado comum europeu.

O novo acordo também estabelece que a lei europeia que se refere ao Imposto sobre Valor Agregado (IVA) será aplicada na Irlanda do Norte ? mas sobre bens, e não serviços.

Por exemplo, se o Reino Unido decidir reduzir a zero o IVA dos combustíveis domésticos, a Irlanda do Norte ainda precisaria mantê-lo em 5%, que é o mínimo permitido pela União Europeia.

O protocolo também aborda o futuro relacionamento comercial entre os dois parceiros: estabelece que ambas as partes trabalharão para assinar um acordo de livre comércio e que será organizada uma reunião em janeiro de 2020 para verificar o progresso nessa área.

3. A Irlanda do Norte pode decidir seu futuro

Neste acordo, a Assembleia da Irlanda do Norte desempenha um papel crucial.

Sob um mecanismo de "consentimento", o protocolo declara que a Assembleia pode votar se mantém a solução para evitar uma fronteira física na ilha da Irlanda quatro anos após a entrada em vigor do protocolo, o que deve acontecer uma vez que o período de transição após o Brexit esteja concluído.

O acordo do Brexit prevê um período de transição em que as leis comunitárias continuarão sendo aplicadas em todo o Reino Unido, que a princípio será concluído em dezembro de 2020.

No entanto, se Londres e Bruxelas decidirem em conjunto, poderá ser prorrogado em um ou dois anos, até 2021 ou 2022.

Se a Assembleia da Irlanda do Norte votar contra, as normas europeias continuarão sendo aplicadas na região por mais dois anos - período no qual o "comitê conjunto" faria recomendações ao Reino Unido e à União Europeia sobre as "medidas necessárias" a serem tomadas.

Se a Assembleia votar a favor por maioria simples, o sistema continuará então por mais quatro anos. Se tiver "apoio majoritário", será prorrogado por oito anos ou até se chegar a outro pacto que regulamente essa relação.

Sob as condições atuais, a votação não ocorreria pelo menos até janeiro de 2025.

4. O que acontece agora?

A nova proposta ainda precisa ser aprovada pelo Parlamento britânico.

Juncker e Johnson pediram aos parlamentares que apoiem o acordo.

Neste sábado, o primeiro-ministro britânico submeterá o acordo à votação na Câmara dos Comuns.

Isso significa que Johnson tem pouco mais de 24 horas para tentar obter o apoio do partido norte-irlandês DUP, um aliado vital dos conservadores.

Mas tudo indica que não vai ser fácil: o DUP já alertou que não pode aceitar o que o premiê britânico negociou com a União Europeia.

Antes do anúncio de Johnson, o DUP publicou uma declaração em que afirmava não apoiar as propostas "da maneira como estão" - e, após o anúncio oficial, informou que sua declaração "continuava em vigor".

Sem o apoio do partido norte-irlandês, a aprovação do protocolo de saída dependerá dos parlamentares do Partido Trabalhista, da oposição, que têm posições divididas sobre o Brexit.

Jeremy Corbyn, líder do Partido Trabalhista, não tardou em condenar o texto e afirmou que "a melhor maneira de resolver o problema do Brexit" é conceder ao povo um segundo referendo.

"Johnson negociou um acordo pior do que o de Theresa May", tuitou.

Juncker escreveu, por sua vez, no Twitter: "Onde há vontade, há acordo - já temos um! É um acordo justo e equilibrado para a União Europeia e para o Reino Unido, e uma prova do nosso compromisso em encontrar soluções."

5. O que Boris Johnson precisa para ganhar a votação?

Peter Barnes, analista político da BBC, lembra que são necessários 320 votos para Boris Johnson sair vitorioso na Câmara dos Comuns, se todos os parlamentares estiverem presentes.

"Atualmente, há 287 deputados conservadores com direito a voto. A primeira coisa que o primeiro-ministro deve fazer é limitar, se possível, qualquer rebelião entre eles", avalia Barnes.

Mas, se não conseguir o respaldo do DUP, Johnson precisará do apoio dos 23 ex-parlamentares conservadores que atualmente são independentes.

"A maioria provavelmente apoiará o acordo - mas não todos", adverte.

Isso pode, portanto, não ser suficiente - sendo também necessário o apoio de alguns parlamentares trabalhistas e de ex-parlamentares trabalhistas hoje independentes.

Em 29 de março, quando o acordo de Theresa May foi votado pela terceira vez, cinco parlamentares trabalhistas apoiaram a proposta, além de dois ex-integrantes do partido hoje independentes.

"Desta vez, é provável que o número seja um pouco maior, pois vários parlamentares têm dito agora que apoiariam um acordo com a União Europeia", analisa.

No entanto, tudo isso faz com que a votação seja muito apertada. E existe a possibilidade de alguns parlamentares optarem por se abster, o que torna ainda mais difícil garantir o resultado final.