Afeganistão: 5 lições aprendidas com a 'guerra ao terror' desde o 11 de Setembro
O 11 de setembro de 2001 deixou os Estados Unidos de joelhos com o pior ataque terrorista na história do país.
Logo depois, parte do mundo via um nítido contraste: havia os mocinhos e os vilões. "Cada nação, cada região", declarou o então presidente George W. Bush, nove dias após os ataques, "agora tem uma decisão a tomar. Ou você está conosco ou está com os terroristas."
A chamada "guerra ao terror" foi declarada. Desde então, ela levou à invasão do Afeganistão, depois do Iraque, à ascensão do Estado Islâmico e à proliferação de milícias apoiadas pelo Irã em todo o Oriente Médio, e à morte de milhares de soldados e civis.
O terrorismo não foi eliminado — vários países europeus sofreram ataques nos últimos anos —, mas também houve sucessos. Até o momento, nunca ocorreu um ataque que se aproximasse da escala de 11 de Setembro.
As bases da Al-Qaeda no Afeganistão foram destruídas, e seus líderes foram caçados no Paquistão. O califado do grupo extremista autointitulado Estado Islâmico, que aterrorizava grande parte da Síria e do Iraque, foi desmantelado.
Mas, afinal, quais lições foram aprendidas com os últimos 20 anos de luta contra o terrorismo em todo o mundo? O que funcionou e o que não funcionou?
A lista abaixo é, sem dúvida, controversa e está longe de ser completa, mas pode nos ajudar a entender se nos tornamos mais sábios do que éramos na manhã de 11 de Setembro.
1. É preciso compartilhar dados de inteligência vitais
As pistas estavam lá, mas ninguém ligou os pontos a tempo. Nos meses que antecederam o 11 de Setembro, as duas principais agências de inteligência dos Estados Unidos, o FBI e a CIA, estavam cientes de que havia algum tipo de conspiração em curso.
Mas tal era a rivalidade entre a coleta de inteligência doméstica e estrangeira que eles guardaram o que sabiam para si. Desde então, o governo americano tem examinado exaustivamente os erros cometidos, e melhorias importantes foram feitas.
No Centro Nacional de Contra-Terrorismo dos Estados Unidos, 17 agências do país agora compartilham seus dados de inteligência diariamente. O Reino Unido montou seu próprio centro, em que dezenas de especialistas de várias áreas se reúnem e fazem uma avaliação contínua do andamento da ameaça terrorista em casa e no exterior.
Mas o sistema não é perfeito. Dois anos depois que o centro britânico foi criado, a Al-Qaeda executou os atentados de 7 de julho em Londres, a capital britânica, e matou mais de 50 pessoas. Um enorme plano para bombardear vários aviões em pleno voo foi evitado no ano seguinte com a ajuda do Paquistão, mas o Reino Unido ainda sofreu vários ataques em 2017, incluindo o atentado de Manchester.
O ataque ao Bataclan de 2015, em Paris, que matou 130 pessoas, foi em parte o resultado de uma falha das autoridades europeias em compartilhar informações oportunas através das fronteiras. Portanto, mesmo uma boa coleta e compartilhamento de informações podem falhar na prevenção de ataques se forem tomadas decisões erradas.
2. Defina a missão e não se distraia
De todas as muitas razões pelas quais o Afeganistão voltou agora ao domínio do Talibã, uma se destaca: a invasão do Iraque, liderada pelos Estados Unidos, em 2003. Essa decisão malfadada se tornou uma grande distração para o que estava acontecendo no Afeganistão.
Muitas forças especiais americanas e britânicas que vinham caçando com sucesso membros da Al-Qaeda e trabalhando com parceiros afegãos para manter os insurgentes do Talibã em desvantagem foram desviados para o Iraque. Isso permitiu que o Talibã e outros se reagrupassem e voltassem mais fortes.
É fácil esquecer que a missão original no Afeganistão foi bem definida e bem executada. Depois que os governantes do Talibã se recusaram a entregar os perpetradores do 11 de Setembro, os Estados Unidos se uniram à Aliança do Norte (afegãos que se opunham ao Talibã) para expulsar com sucesso os extremistas.
Mas, nos anos que se seguiram, a missão se diluiu em várias direções. A vida melhorou durante esse período para a maioria dos afegãos, mas bilhões de dólares gastos na "construção de uma nação" foram desperdiçados pela corrupção.
3. Escolha seus parceiros com cuidado
A parceria do Reino Unido com seu aliado mais próximo, os Estados Unidos, na invasão do Iraque significou que o Reino Unido teve menos poder sobre quase todas as decisões-chave que se seguiram durante a ocupação.
Os apelos urgentes para não dispersar o Exército iraquiano nem banir todos os membros do partido Baath (então partido de Saddam Hussein) de cargos no governo foram ignorados ou rejeitados. O resultado foi uma aliança catastrófica entre militares iraquianos descontentes e recém-desempregados e oficiais de inteligência com jihadistas fanáticos. Isso criou o Estado Islâmico.
O pânico coletivo que se seguiu ao 11 de Setembro fez com que os serviços de inteligência dos Estados Unidos e do Reino Unido acabassem cooperando com certos regimes com históricos terríveis em violações de direitos humanos.
Hoje, o jihadismo violento está ressurgindo nas partes mal governadas ou não governadas da África, o que representa um problema sobre com quem exatamente o Ocidente deve fazer parcerias.
4. Respeite os direitos humanos ou perca a moral
Repetidamente, pessoas no Oriente Médio disseram que podiam não gostar da política externa dos Estados Unidos, mas que a respeitavam porque o país se pautava pela lei. Até o escândalo da prisão de Guantánamo.
Prender suspeitos "no campo de batalha", inclusive civis inocentes, e levá-los para o outro lado do mundo, para um centro de detenção dos Estados Unidos em Cuba, criou danos incalculáveis à reputação americana e do Ocidente como um todo. Detenção sem julgamento era algo esperado de países autocráticos, mas não dos Estados Unidos.
O pior estava por vir, com revelações de abusos em interrogatórios, como afogamento e outros maus-tratos, em locais secretos da CIA, onde suspeitos de terrorismo simplesmente desapareceram. O presidente americano Barack Obama acabou com isso, mas o estrago já estava feito.
5. Tenha um plano de saída
As intervenções ocidentais que precederam o 11 de Setembro foram relativamente rápidas e simples. Mas as invasões lideradas pelos Estados Unidos no Afeganistão e depois no Iraque resultaram no que foi chamado de "as guerras eternas".
Ninguém imaginava em 2001 ou 2003 que elas ainda estariam em curso duas décadas depois. Simplificando, o Ocidente não entendia no que estava se metendo e não tinha um plano de saída.
Não há dúvida de que se o Ocidente não tivesse expulsado o Talibã e a Al-Qaeda do Afeganistão em 2001 mais ataques teriam ocorrido. A missão de contraterrorismo naquele país não foi um fracasso, mas a de construção da nação, sim.
E, hoje, a única imagem duradoura que a maioria das pessoas vai guardar é a de afegãos desesperados tentando escapar de um país que o Ocidente abandonou.
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