Assembleia-Geral da ONU: exigência de vacina ainda não está decidida, mas é improvável que Bolsonaro seja barrado
Perdeu força a possibilidade de que líderes de países tenham que comprovar que se vacinaram contra a covid-19 para participar da 76ª Assembleia-Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), que acontece na semana que vem e deve reunir mais de cem líderes de Estados na sede da organização, em Nova York.
A discussão surgiu na terça-feira (14/09), depois que o presidente da Assembleia-Geral, Abdulla Shahid, enviou aos Estados-membros uma carta na qual endossava um pedido das autoridades nova-iorquinas para que as mesmas regras impostas aos habitantes da cidade fossem seguidas no prédio da ONU.
Para conter a pandemia, Nova York exige que frequentadores de centro de convenções comprovem vacinação. A Prefeitura da cidade disse que a ONU se enquadraria na definição de centro de convenções.
No entanto, na noite da última quarta, dia 15, o Secretário Geral da ONU António Guterres deu uma entrevista à agência Reuters na qual negou que tivesse meios para garantir tal exigência e lembrou que a sede da organização é considerada território internacional.
"Nós, como Secretariado, não podemos dizer a um chefe de Estado que, se ele não estiver vacinado, não poderá entrar na ONU" afirmou Guterres, alertando que tal imposição dependeria do apoio da maioria dos países que compõem a ONU.
O assunto era particularmente relevante para o governo brasileiro, já que oficialmente o presidente Jair Bolsonaro não foi vacinado e uma obrigatoriedade de certificado poderia levá-lo a ser barrado do evento. Tradicionalmente, cabe ao mandatário do Brasil a função de abrir os discursos dos chefes de Estado no encontro de líderes mais importante do ano.
Nas discussões de hoje, as delegações internacionais se mostraram inclinadas a manter em vigor o que chamam de "sistema de honra", aplicado já na edição do evento do ano passado. Pelo sistema, cabe aos chefes de Estado declararem que não estão infectados com covid-19, mas não é preciso provar isso nem com certificado de vacinação, nem com resultado negativo de teste PCR.
De acordo com embaixadores ouvidos pela BBC News Brasil, além do Brasil, a Rússia também é contrária à exigência já que sua vacina, a Sputnik, não seria reconhecida como imunizante pela ONU.
Em carta a Shahid, a Rússia acusou o posicionamento de ser "claramente discriminatório". Para não gerar tensões antes mesmo das discussões do evento, a tendência da maioria das delegações seria dispensar o certificado de vacina.
"Tínhamos um sistema de honra na última sessão. Estamos trabalhando com o presidente em exercício da Assembleia Geral para dar continuidade a esse sistema de honra de uma forma que seja aceitável para todos. Há questões neste edifício que precisam ser tratadas pelos Estados-membros e aquelas que estão sob a alçada do Secretário-Geral. A autoridade do Secretário-Geral é limitada. Portanto, trabalharemos com os Estados-Membros para encontrar um caminho a seguir", reforçou nesta quinta, dia 16, o porta-voz da Secretaria-Geral, Stéphane Dujarric.
Questionada pela BBC News Brasil sobre a provável dispensa do certificado de vacina, a porta-voz do presidente Shahid apenas reenviou à reportagem a carta em que ele endossa a vacinação obrigatória. Sua posição, no entanto, parece vencida.
"O entendimento é que segue vigorando o acordo anterior entre Estados-membros no sentido de que não há como exigir comprovantes de vacinação dada a diversidade na situação sanitária e de disponibilidade de vacinas entre os diferentes países", afirmou reservadamente à BBC News Brasil um embaixador.
Circulação restrita no hotel
Outra dificuldade para o presidente brasileiro poderia ser sua hospedagem. O hotel onde tanto Bolsonaro quanto parte da comitiva brasileira ficarão hospedados, por exemplo, informa em sua página na internet que segue a determinação da cidade de Nova York de exigir certificado vacinal para qualquer hóspede acima de 12 anos.
Nesta quinta, no entanto, um representante do hotel afirmou à BBC News Brasil que Bolsonaro não enfrentará dificuldades no estabelecimento desde que sua circulação fique restrita ao quarto e ao lobby. O presidente não poderá, no entanto, frequentar o restaurante ou a academia do hotel, onde o protocolo de exigência de certificado vacinal se aplica.
Bolsonaro também não poderá se alimentar dentro de nenhum restaurante, mas não há limitação para o presidente brasileiro em ambientes abertos.
Há três dias, em conversa com apoiadores em frente ao Palácio da Alvorada, Bolsonaro voltou a repetir que não havia tomado imunizantes contra a covid-19, que já matou quase 590 mil brasileiros. Ele citou um suposto resultado do exame IGG, que mede a quantidade de anticorpos para uma dada doença no corpo, como justificativa para não ter se vacinado.
"Eu não tomei vacina, estou com 991 (nível do IGG). Eu acho que eu peguei de novo (o vírus) e nem fiquei sabendo", afirmou Bolsonaro.
A BBC News Brasil consultou a Presidência da República sobre se o presidente segue sem ter sido vacinado contra covid-19, mas não recebeu resposta até a publicação desta reportagem.
Durante o verão do hemisfério Norte, Nova York voltou a experimentar um aumento do número de casos de covid-19 na cidade, resultado da grande circulação da variante delta. Atualmente com 62% da população completamente vacinada e média móvel de cerca de 1600 novos casos por dia, a cidade luta para controlar a epidemia.
Em meados de agosto, o governo dos Estados Unidos, que vem tentando fortalecer os órgãos de relações multilaterais e demonstrar protagonismo nesses espaços, expressou preocupação com os impactos sanitários da realização do evento em Nova York, que decidiu oferecer imunização gratuita a todos os participantes da Assembleia Geral da ONU.
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