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Acordo de paz entre Israel e Emirados é ofuscado por suposta venda de armamentos

Primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, em pronunciamento sobre coronavírus - Ammar Awad/File Photo/Reuters
Primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, em pronunciamento sobre coronavírus Imagem: Ammar Awad/File Photo/Reuters

21/08/2020 09h51

Depois de celebrar o acordo de paz com os Emirados Árabes Unidos, o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, enfrenta acusações de que havia algo por trás do compromisso: a venda de aviões e armamentos americanos.

O acordo de paz histórico e surpreendente foi anunciado em 13 de agosto entre Israel e os Emirados Árabes Unidos. Ninguém sabia que os dois lados negociavam, com moderação americana, a normalização das relações diplomáticas.

A expectativa é de que o acordo final seja firmado em breve e que, em seguida, haja a abertura mútua de embaixadas e o estabelecimento de voos diretos e acordos bilaterais. Antes, Israel só havia assinado dois acordos de paz com países árabes: com o Egito, em 1979, e a Jordânia, 1994.

Avanço da paz

O primeiro-ministro Benjamin Netanyahu disse que se trata do maior avanço da paz no Oriente Médio em meio século. Ele comemorou o acordo com o príncipe herdeiro Mohammed bin Zayed, de Abu Dhabi, como uma vitória de sua política externa. O premiê israelense sempre apostou em uma normalização de relações com países do Oriente Médio antes de uma resolução do conflito com os palestinos.

Para Netanyahu, a mudança no foco das atenções é importante num momento em que ele enfrenta protestos contra sua permanência no governo, depois de ter sido indiciado em três casos de corrupção. O acordo, que também foi elogiado pela oposição, parecia ter coroado Netanyahu com um líder habilidoso, que realiza compromissos que antes se mostravam impossíveis.

No entanto, dúvidas e críticas vieram à tona. Na terça-feira (18), a imprensa israelense revelou indícios de que o acordo de paz incluiria uma cláusula "secreta": a venda de jatos de guerra e armamentos americanos de última geração para os Emirados Árabes, em troca da assinatura. Ou seja, o príncipe herdeiro Mohammed bin Zayed teria aceitado firmar o pacto para receber aviões F-35 da empresa Lockheed Martin, que os americanos vendem apenas para alguns aliados, cuidadosamente selecionados.

Isso seria um escândalo porque os Estados Unidos, maior aliado de Israel no mundo, evitam vender armas de última geração para países árabes no Oriente Médio. Só Israel recebe os armamentos mais modernos para manter sua superioridade militar regional.

Netanyahu nega, Emirados confirmam

Desde que essa alegação foi divulgada, Netanyahu tenta negar que a venda tenha ocorrido. O escritório do primeiro-ministro emitiu nota oficial afirmando que o "histórico acordo de paz" não incluiu "o consentimento de Tel Aviv para qualquer acordo de armas entre os Estados Unidos e os Emirados Árabes Unidos".

Nesta quarta-feira (19), o ministro do Exterior dos Emirados, Anwar Gargash, disse que o pedido de compra dos aviões americanos foi feito há seis anos, ou seja, antecedeu o acordo. Mas fez um adendo de que foi realmente o compromisso de paz com Israel que retirou o "último obstáculo" para a negociação.

O objetivo do presidente americano, Donald Trump, seria afastar os rivais russos e chineses do mercado de armas do Golfo Pérsico. De quebra, Trump - que está com a popularidade abalada - receberia a fama de ter moderado um acordo de paz no Oriente Médio a poucos meses das eleições presidenciais americanas.

Sudão engrossa a polêmica

Além dessa suspeita de troca de favores entre Israel, Estados Unidos e Emirados Árabes Unidos, houve mais motivos para azedar a comemoração de Netanyahu. Poucas horas depois do anúncio do acordo, um porta-voz da chancelaria do Sudão declarou que seu país estaria estudando assinar um compromisso de paz com Israel também.

Em Tel Aviv, isso foi visto como sinal de que uma nova era de relacionamento entre Israel e os países árabes havia começado, mesmo sem o fim do conflito com os palestinos - que, aliás, rejeitaram e condenaram o acordo com os Emirados. Essa nova era diplomática seria baseada em interesses econômicos comuns e no antagonismo ao Irã.

O premiê Benjamin Netanyahu chegou a divulgar uma nota celebrando as palavras do porta-voz sudanês. Mas o que aconteceu em seguida murchou as comemorações. O porta-voz do Sudão foi demitido e o país divulgou comunicado negando tudo. Na prática, a "nova era" de paz que Netanyahu tanto prega ainda está longe de ser realidade.

Nova escalada de tensão

Certamente não se pode falar de paz com vizinhos em meio a uma nova escalada de tensão entre Israel e a Faixa de Gaza. Há dez dias, a situação voltou a se acirrar entre Israel e o Hamas, que controla a Faixa de Gaza. Militantes do grupo islâmico voltaram a lançar foguetes e balões incendiários contra Israel, que reage com bombardeios em Gaza.

Só na quinta-feira (20), 42 balões com material inflamável causaram incêndios no sul de Israel e 12 foguetes foram lançados contra cidades da fronteira. Nove foram interceptados ainda no ar pelo sistema antiaéreo Domo de Ferro.

Israel respondeu com três ondas de ataques contra alvos do Hamas no Sul de Gaza, segundo a imprensa local.

O Hamas exige que, em troca de um cessar-fogo, Israel aceite diversas demandas, como autorizar mais trabalhadores de Gaza em Israel e facilitar projetos de infraestrutura da ONU no território. No entanto, o governo israelense afirma que não aceita essa forma de pressão e que responderá "fogo com fogo". Se esse ciclo continuar, há o temor de um conflito maior entre Israel e Gaza, como aconteceu em 2014.