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'Basta de repressão e fome': cubanos prometem continuar manifestações inéditas contra governo

Os protestos anti-governo, amplamente divulgados nas redes sociais, começaram de forma espontânea, um fato incomum no país - YAMIL LAGE / AFP
Os protestos anti-governo, amplamente divulgados nas redes sociais, começaram de forma espontânea, um fato incomum no país Imagem: YAMIL LAGE / AFP

Domitille Piron

Correspondente da RFI em Cuba

12/07/2021 09h53Atualizada em 12/07/2021 11h04

Cuba viveu um dia histórico nesse domingo (11). Manifestações inéditas aconteceram em todo o país. De Leste a Oeste, os cubanos protestaram aos gritos de "liberdade" e "abaixo a ditadura". Na ilha, dirigida pelo Partido Comunista há várias décadas, as manifestações são proibidas, mas nesse domingo a crise atual levou as pessoas a superarem as interdições e o medo.

Uma multidão ocupou o calçadão à beira-mar Malecón e as ruas de Havana. Muitos cubanos, indignados com a situação do país, participaram de uma manifestação pela primeira vez na vida. Nunca uma cena como esta foi vista antes no território comunista. Mas o medo permanece e todas as pessoas entrevistadas pela RFI pediram para não ser identificadas.

"Em quase todas as províncias e em várias cidades, as pessoas saíram às ruas porque estamos fartos de todos esses problemas e dessa crise. Os cubanos não aguentam mais!", relatou uma manifestante.

"Estamos passando fome"

"Queremos manifestar de maneira pacífica por nossa liberdade, mas a polícia reprime todo mundo que ousa protestar", reclama outro manifestante. "É a primeira vez que nos manifestamos e não será a última."

A crise, a fome, a epidemia de Covid-19 e o desejo de liberdade são os fatores que, acumulados, levaram os cubanos às ruas de todo o país. "Acabei de sair de uma fila por alimentos. Aqui, nós temos fome e há muita carência. Basta de repressão e de fome", esclarece outra participante do protesto. "Sempre nos calamos, nunca dizíamos nada, mas agora basta. As pessoas não aguentam mais", completa.

Repressão policial

Graças às redes sociais, os cubanos registram e divulgam os protestos e se sentem apoiados. Mas a polícia não se inibe e reprime os manifestantes. Cerca de 40 pessoas foram presas diante da correspondente da RFI. "O problema é que muitos policiais estão à paisana, infiltrados na manifestação. Veja como eles batem nas pessoas", aponta um participante.

Houve tumultos principalmente em Havana, onde as forças de ordem usaram gás lacrimogêneo, tiros para o alto e cacetetes para bater nos manifestantes. Vários carros da polícia foram depredados e muitos cubanos foram detidos.

Internet cortada

Segundo o site de jornalismo "Inventario", cerca de 40 manifestações foram realizadas em todo o país nesse domingo. A maioria delas foi transmitida ao vivo nas redes sociais. A internet móvel só chegou a Cuba no final de 2018 e hoje viabiliza um espaço importante para as reivindicações da sociedade civil. Por isso, o acesso à rede foi interrompido em grande parte do território a partir da tarde desse domingo.

O presidente cubano Miguel Díaz-Canel em um discurso na televisão pediu "aos revolucionários para ir às ruas". Apesar de reconhecer algumas dificuldades no país, ele acusou o inimigo de sempre, os Estados Unidos, de serem os instigadores das manifestações.

"Vamos defender a Revolução Cubana a qualquer preço", bradou no Twitter o vice-ministro das Relações Exteriores, Gerardo Peñalver.

Alerta de Washington

Os Estados Unidos alertaram Cuba ontem sobre o uso desproporcional da violência contra os manifestantes.

"Reconhecemos o desejo legítimo da sociedade cubana por remédios, alimentos e liberdades fundamentais", tuitou o secretário-geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), Luis Almagro. Ele completou o post condenando "o regime ditatorial cubano por convocar civis para reprimir quem exerce seu direito a manifestar".

Já a Rússia alertou nesta segunda-feira (12) contra qualquer "ingerência externa" em Cuba.