Desde ontem, quando o presidente Ashraf Ghani deixou o Afeganistão e anunciou a vitória do Taleban, a situação em Cabul é de caos e desespero. Imagens publicadas nas redes sociais mostram uma multidão de afegãos tentando a qualquer custo deixar o país, mas eles são apenas uma parte da realidade.
Na capital de mais de 4,4 milhões de pessoas, parte está escondida em casa, com receio da violência dos militantes do Taleban.
"Estamos muito aflitos. Não posso correr o risco de sair de casa porque para os talibãs nós somos espiões", afirma, sob condição de anonimato, um antigo intérprete do Exército francês no Afeganistão. "Se eu sair de casa, eles vão me matar. Para eles, nós somos espiões, somos infiéis", disse, em uma entrevista à RFI por telefone.
Ao longo dos 20 anos de ocupação no Afeganistão, milhares de afegãos trabalharam para governos estrangeiros, como os Estados Unidos, a França, a Alemanha e o Reino Unido.
À espera de ajuda internacional para deixar o país, o intérprete conta que a entrada no aeroporto de Cabul, única saída do território, está sendo controlada pelos soldados norte-americanos.
"Há mais de 600 pessoas diante do aeroporto tentando entrar, mas quem não tem papeis não consegue passar da barreira do Exército norte-americano, e eles estão muito armados. Já atiraram", afirmou.
Refugiadas no aeroporto, as embaixadas de diversos países, entre eles a França e a Alemanha, prepararam vistos até o último minuto e mantêm listas com o nome das pessoas que devem ser evacuadas o mais rápido possível. No entanto, não há prazo para que isso aconteça.
Durante hoje, os Estados Unidos interromperam a partida de aviões, e ao menos sete pessoas morreram no aeroporto, de acordo com informações da agência Associated Press.
Algumas vítimas foram pisoteadas, outras caíram da parte exterior de um avião norte-americano ao qual tentavam inutilmente se agarrar. Dois homens também foram mortos a tiros pelas forças armadas dos EUA, eles estariam armados no meio da multidão, de acordo com os norte-americanos.
Incerteza e medo
Desde a tomada do poder pelo Taleban, os afegãos esperam por um comunicado oficial do grupo, impondo suas regras.
"Os insurgentes estão por toda a cidade, fazendo patrulha nas ruas. Eles dizem que estão fazendo isso para evitar a pilhagem e garantir a segurança, mas isso é o que eles dizem", disse um jovem afegão refugiado em sua casa.
"A atmosfera [da cidade] é de completo desespero", afirmou Nassim Majidi, pesquisadora e co-diretora do centro de pesquisas Samuel Hall, em Cabul. "Muitas pessoas estão dentro de suas casas, sobretudo as mulheres. Os jovens tentam fugir como podem."
Majidi conta que aconselhou os pesquisadores de seu instituto a ficarem no Afeganistão, mas teme que, sem ajuda internacional, não possa garantir a segurança de sua equipe.
Ontem, o ministro do Interior, Abdul Sattar Mirzakwal, afirmou que não haveria ataques à capital e que a transição de governo seria feita de maneira pacífica. A afirmação, no entanto, não acalmou a população.
"A cidade está completamente vazia, não há governo, não há polícia, nem exército. O ambiente é de pânico e de incerteza", conta um professor da capital. "Os militantes do Talibã não são um exército disciplinado, então tenho medo de abusos: eles podem atacar algumas casas, retirar mulheres, ou oficiais, jornalistas e os punir. Se eles roubam ou cometem qualquer crime, não tem um sistema para condená-los."
De acordo com os testemunhos recolhidos de moradores de Cabul, não houve cenas de violência do Taleban na capital nas últimas 24 horas, mas não é o que acontece em outras províncias.
"Soubemos que há reféns dos talebans mantidos no entorno de Cabul e que os insurgentes estão retirando seus passaportes", declarou John Sifton, diretor da ONG Asian Human Rights Watch. "Ainda que não haja represálias imediatas em Cabul, temos visto que em outras províncias os que trabalhavam para os Estados Unidos foram presos ou estão desaparecidos."
(Com informações de Sonia Ghezali, correspondente da RFI em Cabul, de Jelena Tomic, da RFI, de Alijani Ershad e de Poline Tchoubar, da France24)
Talibã toma Cabul e volta ao poder no Afeganistão
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Soldado afegão patrulha as ruas da capital Cabul
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Integrantes do Talibã dentro do palácio presidencial em Cabul após retomada do poder
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Fronteira entre Afeganistão e Paquistão é tomada por população que busca fugir do Talibã
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Bandeira do Talibã é vista durante avanço do grupo no Afeganistão
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Afegãos formam fila em Cabul para atualizar passaportes e deixar o país durante avanço do Talibã
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Após cerco do Talibã a Cabul, embaixada americana é fechada e diplomatas são evacuados
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Filas por passaportes levam afegãos a pânico enquanto tentam deixar o país
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Famílias se refugiam em outros locais do Afeganistão após conflitos provocados pelo Talibã
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Helicóptero militar dos EUA sobrevoa embaixada americana em Cabul para retirada de diplomatas
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Diante do avanço do Talibã no Afeganistão, famílias se refugiaram em outras cidades
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Integrantes do Talibã erguem bandeira em Jalalabad durante avanço no Afeganistão
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Guarda vigia famílias que deixaram cidades tomadas pelo Talibã no Afeganistão
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Integrantes do Talibã fazem patrulha nas ruas de Herat
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Famílias afegãs se abrigam em Cabul após fuga de cidades tomadas pelo Talibã
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Soldados afegãos controlam entrada do aeroporto internacional de Cabul
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Imagens mostram integrantes do Talibã no palácio presidencial na capital afegã
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17.ago.2021 - Membro do Talibã na área externa do Aeroporto Internacional de Cabul, no Afeganistão
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17.ago.2021 - Área externa do Aeroporto Internacional de Cabul, no Afeganistão
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17.ago.2021 - Pessoas se reúnem em torno de uma bandeira do Talibã enquanto esperam por parentes libertados da prisão no Afeganistão após uma 'anistia' do Talibã
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17.ago.2021 - Meninas assistem às aulas em Herat após tomada do Afeganistão pelo Talibã
Aref Karimi/AFP 30 / 45
17.ago.2021 - Homens do Talibã guardam entrada do Ministério do Interior, em Cabul
Javed Tanveer/AFP 31 / 45
17.ago.2021 -Os combatentes do Talibã patrulham rua em Cabul após tomada do poder no Afeganistão
Wakil Kohsar/AFP 32 / 45
17.ago.2021 - Cidadãos indianos embarcam em aeronave militar no aeroporto de Cabul para serem evacuados após tomada do Talibã no Afeganistão
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17.ago.2021 - Talibã segura lançador de granadas enquanto fica de guarda em um portão de entrada do lado de fora do Ministério do Interior em Cabul
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Vídeo mostram membros do Taleban em parque de diversões em Cabul, no Afeganistão
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Zabihullah Mujahid, porta-voz do Talibã, dá entrevista coletiva em Cabul
Hoshang Hashimi/AFP 36 / 45
17.ago.2021 - A chegada do mulá Abdul Ghani Baradar ao Afeganistão, em Kandahar
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Estátua de Abdul Ali Mazari, líder político contrário ao Taleban que morreu no anos 1990, foi parcialmente destruída em Bamiyan (Afeganistão)
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Afeganistão: imagens de satélite mostram milhares de pessoas tentando fugir
Maxar Technologies 39 / 45
20.ago.2021 - Fuzileiros navais dos EUA e civis durante uma evacuação no Aeroporto Internacional Hamid Karzai, em Cabul, Afeganistão
AFP/Nicholas Guevara/US Marine Corps 40 / 45
20.ago.2021 - Afegãos se reúnem em uma estrada perto da parte militar do aeroporto de Cabul, na esperança de fugir do país após a tomada militar do Taleban no Afeganistão
Wakil Kohsar/AFP 41 / 45
20.ago.2021 - Soldados dos Estados Unidos montam guarda atrás de arame farpado enquanto afegãos estão sentados em uma estrada perto da parte militar do aeroporto de Cabul
Wakil Kohsar/AFP 42 / 45
16.ago.2021 - Homem puxa uma criança para dentro dos muros do aeroporto internacional de Cabul, Afeganistão
Stringer/Reuters 43 / 45
21.ago.2021 - Tripulação da Força Aérea dos EUA auxilia evacuados qualificados a bordo de uma aeronave em apoio à evacuação do Afeganistão no Aeroporto Internacional Hamid Karzai, Cabul, Afeganistão
Taylor Crul/Força Aérea dos EUA/ AFP 44 / 45
22.ago.2021 - Membros da Frente de Resistência Nacional (FNR), principal grupo de oposição ao movimento fundamentalista islâmico Talibã, se preparam para lutar no Vale do Panjshir, Afeganistão.
Agência de Notícias Aamaj via REUTERS 45 / 45
23.ago.2021 - Mulheres afegãs vestidas de burca fazem compras em uma área de mercado em Cabul, após a tomada militar do país pelo Talibã
Hoshang Hashimi/AFP
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