Topo

Esse conteúdo é antigo

Frente ampla pró-Lula em meio a fiasco de Bolsonaro no exterior preocupa campanha do presidente

Jair Bolsonaro discursa durante abertura da Assembleia-Geral das Nações Unidas, em Nova York - Brendan Mcdermid/Reuters
Jair Bolsonaro discursa durante abertura da Assembleia-Geral das Nações Unidas, em Nova York Imagem: Brendan Mcdermid/Reuters

Raquel Miura

Da RFI, em Brasília

21/09/2022 05h58

Aliados de Bolsonaro admitem possibilidade de eleição ser decidida num único turno e reforçam estratégias. Viagem à Inglaterra e Nova Iorque virou marketing contra presidente

Enquanto Jair Bolsonaro e seus apoiadores divulgam dados falsos de pesquisas como se ele estivesse na dianteira das intenções de voto, o clima real no comitê do presidente é bem diferente e pela primeira vez alguns coordenadores admitem que existe a chance de vitória de Luís Inácio Lula da Silva no primeiro turno.

O fortalecimento de uma frente única de apoio a Lula, com nomes que vão da ex-ministra Marina Silva (Rede) ao ex-prefeito do Rio César Maia (PSDB), ajudou a acender o sinal amarelo no quartel bolsonarista, numa semana marcada por críticas à postura do presidente em viagens internacionais.

O que se espera daqui para frente é um acirramento dos ataques entre os dois adversários, com Bolsonaro focando nas questões de corrupção e Lula tentado desconstruir a narrativa do rival. Ambos mantêm também o desafio de apresentar um discurso mais moderado para atrair os que ainda se dizem indecisos ou dispostos a mudar o voto até o dia 2 de outubro.

O analista Carlos Melo, doutor em ciência política e professor do Insper, disse à RFI que a briga na TV e nas redes sociais será grande, mas que o governo em si não tem cartas na manga para mudar muito o quadro

"A eleição está se afunilando. Na semana passada era quase certa a realização de um segundo turno. Esta semana, embora sejam mais prováveis dois turnos, nós vimos que cresceu a possibilidade de decisão num único turno. Semana que vem, vamos ver se isso é reforçado", afirmou o Melo.

"Eu não acredito em elemento surpresa em termos de política pública. O governo já fez de tudo, o que podia e até o que não podia, inclusive mudando a legislação de forma controversa ou mesmo ao arrepio da lei". O que não significa campanha morna ou parada daqui para frente. "Agora fatos novos são sempre possíveis, como escândalos ou tentativas de forjar escândalos, nossa história está repleta disso", lembrou o cientista político.

Fiasco internacional

E foi na tentativa de fazer campanha e mostrar que não está isolado internacionalmente que o presidente embarcou para duas viagens internacionais esta semana. Porém a avaliação no meio político é de que o comportamento de Bolsonaro acabou sendo um tiro no pé e rendeu mais munição para seus adversários.

Depois de fazer campanha em meio ao um cenário de comoção nacional na Inglaterra durante velório da rainha Elizabeth II, o presidente dosou um pouco o tom no discurso de abertura da Assembleia Geral da ONU, nos Estados Unidos, e acabou fazendo mais do mesmo, ao criticar adversários, apresentar um balanço inflado de seu governo e listar números não muito reais da economia brasileira.

Embora tenha sido essa a orientação de aliados do centrão, especialmente após o comportamento reprovável em solo inglês, há quem veja que o presidente perdeu a oportunidade de mostrar um discurso mais empolgado com um país que precisa atrair investimentos e recuperar a credibilidade externa.

Os adversários aproveitaram para relembrar trapalhadas do presidente nessa área. "Você tem um presidente que não recebe o governo francês porque está fazendo a barba. Um presidente que chama a mulher do presidente da França de velha, que afronta o presidente de Portugal, que afronta a Europa. Um presidente que se subordinou ao Trump", afirmou Lula.

Bolsonaro logo após discursar na ONU foi a uma churrascaria em Nova York e falou a apoiadores, repetindo o discurso conservador de apoio a pautas de costume, sem conseguir sair de sua bolha de entusiastas.

"O governo precisa ser laico, mas eu sou cristão e ponto. Não tem essa de discutir aborto. E nem essa de questão de gênero para alunos de 5 anos", disse Bolsonaro que voltou a dizer que é "imbrochável".

Para o analista Carlos Melo, o presidente fez tudo errado nessa viagem. "Ele fez as viagens para fazer campanha. Acontece que não deu certo. Em Londres foi muito constrangedor, pegou mal ele fazer campanha num momento de luto".

"Em Nova York ele basicamente repetiu o que vinha dizendo. Relativamente comedido. Veja, ser comedido na situação em que o país vive hoje virou um elemento positivo? Pode até ser em se tratando de Jair Bolsonaro, mas me parece muito pouco para quem disputa a Presidência da República e está tão atrás do primeiro colocado", avalia Melo.

Briga nos tribunais

O ministro Benedito Gonçalves, do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), proibiu Bolsonaro de usar imagens da viagem a Londres em sua propaganda. O pedido foi feito pela candidata a presidente Soraya Thronicke (União Brasil) sob o argumento de que Bolsonaro fez campanha com dinheiro público. Decisão similar já havia proibido a campanha do PL de usar imagens dos eventos públicos do Dia da Independência.

Na guerra travada entre os candidatos no TSE, a campanha de Lula, por exemplo, poderá continuar chamando Bolsonaro de genocida por conta da pandemia. Já Bolsonaro poderá usar críticas que Geraldo Alckmin, hoje vice de Lula, fez no passado sobre o petista.

No Supremo Tribunal Federal (STF), o plenário confirmou decisão do ministro Edson Fachin que suspendeu trechos de decretos de Bolsonaro que facilitavam a aquisição de armas e munições. Fachin levou em conta o risco de violência política na eleição.