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Diogo Schelp

Com direita "superlotada", eleições em São Paulo prometem fogo cruzado

28.out.2018 - João Doria (PSDB), Joice Hasselmann (PSL) e o prefeito da capital, Bruno Covas (PSDB). Sorrisos de ontem podem não aparecer nestas eleições - Luís Adorno/UOL
28.out.2018 - João Doria (PSDB), Joice Hasselmann (PSL) e o prefeito da capital, Bruno Covas (PSDB). Sorrisos de ontem podem não aparecer nestas eleições Imagem: Luís Adorno/UOL

Colunista do UOL

05/09/2020 04h03Atualizada em 09/09/2020 16h12

Na campanha para a Prefeitura de São Paulo, este ano, não faltarão opções aos eleitores. Quase duas dezenas de candidatos se apresentam para disputar o cargo, desde a esquerda que se admite comunista até a direita que não se acanha de se dizer bolsonarista.

Na centro-direita e na direita, o posicionamento político-ideológico dos candidatos mescla conservadorismo com liberalismo econômico em diferentes graus. O antipetismo é o elemento comum. O que os divide, em essência, é o alinhamento ou não ao presidente Jair Bolsonaro.

Todos, contudo, almejam os votos que elegeram Bolsonaro em 2018 (ele recebeu 60,4% dos votos na capital paulista).

Este é o primeiro de dois textos sobre as Eleições 2020 em São Paulo. O segundo artigo trata especificamente dos candidatos de esquerda.

Saiba o que esperar da campanha municipal no campo da direita em dez pontos, do perfil dos candidatos aos embates que eles devem travar:

Os "escolhidos" de Bolsonaro

O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) tem dito que não dará apoio formal a nenhum candidato específico em São Paulo, mas a disputa para ser o seu escolhido é grande — ainda mais depois que ele superou a fase ruim nas pesquisas de popularidade e tornou-se um cabo eleitoral promissor.

Celso Russomano (Republicanos) teve um encontro com Bolsonaro em Brasília nesta quarta-feira (2) para pedir apoio à sua campanha, caso realmente se lance candidato. Poderia contar a favor o fato de dois filhos do presidente, o senador Flávio Bolsonaro e o vereador do Rio de Janeiro Carlos Bolsonaro, serem do Republicanos. Mas a chancela oficial do presidente ao pré-candidato não saiu.

Outros que tentam se apresentar como os legítimos candidatos bolsonaristas são Levy Fidelix (PRTB), Filipe Sabará (Novo) e Marcos da Costa (PTB), este último do partido de Roberto Jefferson, um dos mais entusiasmados aliados políticos tardios do presidente Bolsonaro.

Márcio França, pré-candidato do PSB a prefeito de São Paulo, e seu pré-candidato a vice, Antonio Neto, presidente municipal do PDT em São Paulo - Arquivo - Reprodução/Facebook/antonionetopdt - Arquivo - Reprodução/Facebook/antonionetopdt
Márcio França, pré-candidato do PSB a prefeito de São Paulo, e seu pré-candidato a vice, Antonio Neto (PDT)
Imagem: Arquivo - Reprodução/Facebook/antonionetopdt

A centro-esquerda que virou centro-direita

A tentativa mais insólita de atrair os votos bolsonaristas, porém, partiu de Márcio França, pré-candidato do PSB, um partido que pode ser melhor definido como de centro-esquerda.

França, que exerceu o cargo de governador de São Paulo em 2018, acompanhou o presidente Bolsonaro durante a vistoria de uma obra em São Vicente, no litoral paulista, no dia 7 de agosto.

Em entrevista recente, seu companheiro de chapa à prefeitura, Antonio Neto (PDT), não endossou nem rechaçou um eventual apoio de Bolsonaro à candidatura de França. "Se ele é do Bolsonaro, eu não sei. E não vou perguntar nem para Bolsonaro nem para ninguém", disse Neto.

Tanto o PSB quanto o PDT fazem oposição a Bolsonaro no Congresso Nacional.

O fiel da balança direita/esquerda

Na última enquete do Paraná Pesquisas, a soma da intenção de voto em Celso Russomanno, Márcio França, Andrea Matarazzo, Arthur do Val, Levy Fidelix, Joice Hasselmann, Filipe Sabará e Marcos da Costa chega a 44,4% das respostas.

Já a soma dos candidatos que pleiteiam os votos de centro, centro-esquerda e esquerda é de 36%. A conta não inclui os entrevistados que com este cenário de disputa não sabem em quem votariam ou não votariam em nenhum dos candidatos.

A diferença de intenção de voto entre um grupo e outro de candidatos (44,4% e 36%) por muito pouco equivale à porcentagem dos que votariam em Márcio França, de 9,5%. Como França pertence a um partido de centro-esquerda, mas pleiteia o voto bolsonarista, ele acaba se colocando como o fiel da balança direita/esquerda na campanha.

A deputada federal Joice Hasselmann (Marcos Corrêa / PR) - Reprodução / Internet - Reprodução / Internet
A deputada federal Joice Hasselmann (PSL-SP)
Imagem: Reprodução / Internet
Os ex-bolsonaristas

Dois dos candidatos à Prefeitura de São Paulo enfrentam o desafio de atrair os votos da direita mesmo tendo rompido com o presidente Jair Bolsonaro.

É o caso, principalmente, de Joice Hasselmann, que concorre pelo antigo partido do presidente, o PSL. Antes de ter a candidatura confirmada em convenção realizada esta semana, a ala bolsonarista da legenda tentava puxar o seu tapete. Ela diz se arrepender de ter apoiado a eleição de Bolsonaro e afirma representar uma direita "racional".

Arthur do Val (Patriota), por sua vez, faz parte do MBL (Movimento Brasil Livre). O MBL apoiou a eleição de Bolsonaro em 2018, mas rompeu com o presidente já no início do governo, quando vieram à tona as denúncias de rachadinha no gabinete de seu filho Flávio Bolsonaro na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro.

Doristas camuflados

O candidato do governador João Doria (PSDB) no município de São Paulo é, obviamente, seu colega de partido e atual prefeito Bruno Covas, que corre pelo centro do espectro político. Entre os candidatos de direita, porém, alguns são — ou pelo menos já foram — bastante próximos de Doria.

Filipe Sabará, por exemplo, fez sua incipiente carreira política à sombra do atual governador. Foi secretário de Assistência e Desenvolvimento Social do município quando Doria era prefeito e presidente do Fundo Social do estado. Recentemente, disse que Bolsonaro teve melhor desempenho que Doria em lidar com a pandemia.

Joice também costumava ser muito próxima de Doria. Juntos, surfaram na onda que elegeu Jair Bolsonaro presidente em 2018 — e que alavancou Joice ao seu primeiro cargo eletivo como deputada federal mais votada da história e ajudou a levar o tucano, então confortável com a alcunha "Bolsodoria", ao Palácio dos Bandeirantes. Ao lançar sua candidatura no início desta semana, porém, a deputada federal criticou a passagem do amigo pela prefeitura de São Paulo: "Ele foi mais marqueteiro do que prefeito e deixou uma nulidade que é Bruno Covas."

Embate de dinastias

Joice Hasselmann blindou sua chapa de influências bolsonaristas ao escolher Ivan Leão Sayeg, herdeiro de uma centenária joalheria de São Paulo, a Casa Leão, como seu vice. O estabelecimento, fundado em 1912 por um imigrante sírio, é comandado por Lydia Sayeg, irmã de Ivan. Ela revelou ao UOL ter a intenção de lançar um livro com o título "O Preconceito ao Rico" e apresenta-se, no site da joalheria, como integrante de "uma longa dinastia de ourives, joalheiros, consultores, gemólogos".

Na disputa para ser vice na chapa do PSL, Ivan Leão Sayeg derrotou outro integrante de uma "dinastia": o deputado Luiz Philippe de Orleans e Bragança, descendente dos imperadores D. Pedro I e D. Pedro II e a quem o presidente Bolsonaro costuma chamar de "o príncipe", título extinto no Brasil. Luiz Philippe pertence à ala monarquista, ops, bolsonarista do PSL.

2.out.2016 - O candidato à Prefeitura de São Paulo pelo PRB, Celso Russomanno, participa de entrevista no seu comitê de campanha após ficar em terceiro lugar nas eleições - Marcello Fim/ FramePhoto/ Estadão Conteúdo  - Marcello Fim/ FramePhoto/ Estadão Conteúdo
2.out.2016 - O candidato à Prefeitura de São Paulo pelo PRB, Celso Russomanno, participa de entrevista no seu comitê de campanha após ficar em terceiro lugar nas eleições
Imagem: Marcello Fim/ FramePhoto/ Estadão Conteúdo
A eterna promessa

Deputado federal em seu quinto mandato e apresentador de TV especializado em direitos do consumidor, Celso Russomanno (Republicanos) é o eterno favorito que, na reta final, desaponta.

Pelo menos foi assim em 2012 e em 2016, quando ele disputou a prefeitura e liderava as pesquisas, mas não conseguiu chegar sequer ao segundo turno.

Em 2012, entre outros fatores, pesaram revelações sobre a evolução no seu patrimônio: entre os bens declarados à Justiça eleitoral estava um restaurante em Brasília do qual ele era sócio sem ter investido um real sequer. Alguns anos depois, em 2015, um dos seus sócios no estabelecimento, o empresário Augusto Ribeiro Mendonça Neto, confessou em delação no âmbito da Operação Lava Jato ter pago R$ 60 milhões em propinas para obter vantagens em contratos com a Petrobrás.

Ex-parentes em lados opostos

Em 2016, Marta Suplicy (ex-prefeita pelo PT, então no PMDB) disputou a prefeitura de São Paulo tendo como vice Andrea Matarazzo, do PSD (ele saiu do PSDB depois de uma disputa com João Doria).

A chapa era curiosa não apenas pelo fato de ambos terem estado em polos políticos antagônicos pouco tempo antes, mas também por Andrea ser primo de Eduardo Matarazzo Suplicy ("primo de segundo grau, distante", fazia questão de ressaltar o atual vereador pelo PT), ex-marido de Marta.

Marta e Andrea amargaram a 4ª posição nas eleições de 2016, que foram vencidas no primeiro turno por Doria. Agora, em 2020, podem estar em lados opostos na campanha, caso Marta Suplicy seja confirmada candidata pelo Solidariedade. Desta vez, ela pela centro-esquerda e Andrea pela centro-direita, no partido do ex-prefeito Gilberto Kassab.

Antipetismo onipresente, mas esvaziado

O antipetismo é o fator comum que une todos os candidatos de centro-direita e direita na disputa para a prefeitura de São Paulo — seja aqueles que procuram se distanciar do bolsonarismo, seja os que querem colar a própria imagem à do presidente.

Por outro lado, trata-se de uma característica sem muito efeito prático na campanha, pois o PT apresenta-se com um candidato fraco (Jilmar Tatto, com menos de 3% das intenções de voto).

A campanha do fogo cruzado

Com o PT isolado na esquerda, um candidato forte no centro (Bruno Covas, do PSDB) e a direita dividida, o mais provável, em vez de uma disputa polarizada, é que a campanha seja marcada por embates pulverizados: entre candidatos de direita pró e anti-Bolsonaro; entre esquerda e centro; entre a esquerda e a direita bolsonarista; todos contra os líderes nas pesquisas, etc.

Vai ser a campanha do fogo cruzado.

(Correção: uma versão anterior desse artigo afirmava que Márcio França exerceu o cargo entre 2018 e 2019. Oficialmente, entregou o posto em 1º de janeiro de 2019. O texto foi atualizado para não dar a entender que ele foi governador ao longo de 2019. Além disso, Marta Suplicy ficou em 4º lugar nas eleições de 2016, não em 3º, como dizia uma versão anterior.)