Análise: "Ou há elementos fortes, ou será desmoralizante" para a Lava Jato
O cientista político Fábio Wanderley Reis, professor emérito da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), disse que, a partir desta sexta-feira (4), a Operação Lava Jato chegou a um momento crucial. Em sua opinião, ela está em uma encruzilhada após a condução coercitiva do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para depor na (PF) Polícia Federal.
“É patente isso. Essas ações dirigidas diretamente ao ex-presidente Lula claramente envolvem isso. Ou há elementos muito fortes para respaldar isso, ou será desmoralizante [para os responsáveis pela Lava Jato]”, afirmou.
Ele considerou que o objetivo dos responsáveis pela operação pode ser alcançado se a condução do processo for bem “fundamentada”. “Se há de fato como caracterizar como crimes o envolvimento do Lula nas coisas em que ele está sendo acusado, isso pode ter evidentemente uma consequência mais ambiciosa”, externou.
O especialista, no entanto, faz ressalvas sobre como esse processo vem ocorrendo até o momento.
“Acho que certamente é um grande motivo de preocupação a maneira discutível, do ponto de vista jurídico, como algumas coisas estão sendo feitas [no âmbito da Lava Jato]”, declarou.
Para tanto, ele citou o caso do banqueiro André Esteves. Na ótica do especialista, os elementos para a prisão dele foram posteriormente considerados frágeis pelo STF (Supremo Tribunal Federal). No entanto, mesmo assim, ele está sendo mantido em prisão domiciliar.
“Claramente, no caso do André Esteves, ele está sofrendo as consequências de uma condenação. Isso nem sequer é destacado na imprensa”, avaliou.
Reis ainda traçou um paralelo entre o ineditismo da condução coercitiva de Lula para depor e a sua origem humilde.
“Há uma coincidência importante do ineditismo disso [condução coercitiva de um ex-presidente do Brasil] com o fato de que se trata do primeiro ex-presidente da República de origem social mais humilde. É evidente que essas duas coisas estão relacionadas. Seria muita ingenuidade sociológica, para não dizer o mínimo, pretender que se trata de uma mera coincidência”, avaliou.
Segundo ele, episódios análogos aos que motivaram o depoimento do petista já teriam ocorrido com outros ex-presidentes e, na sua ótica, o tratamento dispensado a eles foi diferente.
“Em relação ao que tem sido objeto de investigação mais recente, ao sítio [em Atibaia-SP] e ao tríplex [Guarujá-SP], [imóveis que pertenceriam a Lula, que nega ser o dono] há registro na história recente do país de fatos semelhantes ocorridos com ex-presidentes e que não foram objeto de nenhuma consequência mais ampla. Nem sequer teve divulgação ampla. A maioria da população nem teve registro de que isso aconteceu em relação a benesses, a presentes a presidentes ou a ex-presidentes da República”, ressaltou.
Imagem negativa
Segundo Reis, a ação de hoje da PF contra o ex-presidente é “sem dúvida negativa” para a imagem dele, do PT e da presidente Dilma Rousseff. Entretanto, ele disse ser “muito cedo” para tentar avaliar os efeitos do ponto de vista das pretensões políticas da legenda.
“A própria Dilma ilustra isso. Em 2013, houve intensas manifestações contra ela, com o apoio ao governo caindo claramente. No entanto, ela acabou se reelegendo”, disse.
O professor emérito disse entender, porém, que o ex-presidente terá sua reputação internacional “arranhada” após o evento desta sexta-feira.
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