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Incursão turca para resgatar tumba histórica do Império Otomano irrita Síria

Efe
Imagem: Efe

23/02/2015 09h23

Ameaçada pelo Estado Islâmico, tumba foi transferida para perto da fronteira

Uma incursão militar da Turquia na Síria para demolir e transferir a tumba centenária de um líder histórico turco elevou a tensão entre os governos dos dois países.

No sábado, 600 soldados turcos, mobilizados em 39 tanques e outros 57 veículos blindados, entraram no norte da Síria para trasladar a outro local a histórica tumba de Suleyman Shah, avô do primeiro sultão otomano, Osman 1º.

Segundo a Turquia, a razão da incursão foi proteger um dos símbolos da nação de qualquer dano causado pelo autodenominado "Estado Islâmico".

Ancara considera o monumento como um território soberano. O primeiro-ministro turco, Ahmet Davutoglu, disse ainda que a Síria foi informada do início da operação.

Porém, o ditador sírio, Bashar al Assad, qualificou a operação como uma "agressão flagrante".

Mas por que a tumba de Suleyman Shah é tão importante para a Turquia a ponto de levar o país a desafiar seus vizinhos sírios?

Raízes históricas

Até sábado, o túmulo de Suleyman Shah ocupava uma pequena faixa de território turco dentro da Síria. Suas dimensões podiam equivaler a um campo de futebol, mas o significado histórico e político que carregava era enorme.

Comboio de 39 tanques e 57 veículos atravessou cidade de Kobani para chegar à tumba de Shah.

Shah era um líder tribal turco que viveu aproximadamente entre 1178 e 1236, quando, de acordo com uma epígrafe em seu mausoléu, "se afogou no rio Eufrates, junto com dois de seus homens, enquanto procurava um lugar para si e para o seu povo".

A versão oficial é questionada por alguns intelectuais mas, de acordo com a história, os seguidores de Shah foram para o norte, para o que hoje é a Turquia moderna.

Foi lá que seu neto, Osman 1º, fundou o Império Otomano, que no auge de seu poder, séculos mais tarde, controlou a capital Constantinopla (hoje Istambul) e vastos territórios ao longo do sudoeste da Europa, Oriente Médio e norte da África.

Após a Primeira Guerra Mundial, o Império Otomano foi desintegrado e surgiu o novo Estado da Turquia. Mas a importância do túmulo de Shah para a nação era tão grande que o local ficou sob a proteção de um contrato celebrado em 1921 com a França, que então ocupava a área na província síria de Aleppo.

De lá para cá, a Turquia invocou seu direito de manter tropas no local e hastear sua bandeira no mausoléu - que teve de ser trasladado cerca de 80 quilômetros ao norte depois que a área original foi inundada pela formação do reservatório do Lago Assad em 1974.

Evitando problema

Assim, o único enclave turco no exterior tem um imenso valor emocional para o seu povo. Além disso, o caos que dominou a Síria nos últimos anos aumentou também seu significado político.

Em agosto de 2012, o presidente Recep Tayyip Erdogan - então primeiro-ministro turco - alertou todos os lados no conflito sírio que uma ação contra o túmulo seria considerada um ataque em território turco, "bem como um ataque ao solo da Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte, a aliança militar ocidental)".

Em meio a relatos de que os soldados alocados ali estariam cercados por militantes do "Estado Islâmico", no ano passado, o Parlamento turco autorizou o uso da força contra os jihadistas.

Por outro lado, apesar de ter se aliado aos EUA no treinamento de alguns rebeldes moderados que lutam contra o presidente sírio, a Turquia tem relutado em participar de forma plena da campanha liderada pelos americanos contra o "Estado Islâmico".

Correspondentes da BBC na região afirmam que se o túmulo histórico de Suleyman Shah tivesse sido alvo de ataque, o efeito sobre a opinião pública teria colocado a Turquia em uma situação difícil: nesse caso, teria sido mais complicado manter distância de uma campanha militar em grande escala contra a grupo militante.

A transferência do túmulo e a evacuação dos soldados turcos é um alívio para o governo turco, de acordo com analistas locais.

"Demos às Forças Armadas turcas a orientação de proteger os nossos valores espirituais e a segurança de nossas Forças Armadas", disse o primeiro-ministro Ahmet Davutoglu após a operação de sábado, referindo-se também aos 38 soldados turcos que guardavam o local e também foram removidos.

Mais tarde, a imprensa turca divulgou imagens de três soldados hasteando a bandeira turca em outro lugar perto da fronteira com a Turquia, o que provavelmente será o novo sepulcro - onde as autoridades esperam que possam descansar, finalmente, os restos de Suleyman Shah.