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OPINIÃO

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Tropa da Saúde aliada com Centrão faz governo Bolsonaro balançar

O presidente da república, Jair Bolsonaro, acompanhado do ministro da saúde, Eduardo Pazuello, durante cerimônia de assinatura  dos projetos de Lei que ampliam a capacidade de aquisição de vacinas  pelo Governo Federal - Mateus Bonomi/Agif/Estadão Conteúdo
O presidente da república, Jair Bolsonaro, acompanhado do ministro da saúde, Eduardo Pazuello, durante cerimônia de assinatura dos projetos de Lei que ampliam a capacidade de aquisição de vacinas pelo Governo Federal Imagem: Mateus Bonomi/Agif/Estadão Conteúdo

Colunista do UOL

01/07/2021 19h53

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Um detalhe que me chamou a atenção nessa epidemia de rachadões no MInistério de Saúde é a quantidade de militares citados nos depoimentos da CPI da Covid, um fenômeno que ainda não mereceu o devido destaque nas análises políticas sobre o destino do governo Bolsonaro.

Quando o general Eduardo Pazuello foi efetivado como ministro há um ano, levou com ele uma tropa de militares de várias patentes, fardados ou não, para ocupar o lugar de técnicos de carreira.

Havia no imaginário popular a ideia de que militares eram competentes e incorruptíveis. Viu-se agora que muitos deles não eram uma coisa nem outra.

A militarização do Ministério da Saúde, somada à política negacionista do governo anti-vacina, fez o número de mortos na pandemia saltar de 132.006, no dia em que Pazuello assumiu, para mais de 500 mil, quando ele foi demitido.

Nesse meio tempo, o governo caiu nos braços do Centrão, que passou a nomear sua turma para cargos nos ministérios, inclusive na Saúde, área que sempre foi cobiçada por movimentar bilhões de reais.

Os escândalos agora denunciados para a compra de vacinas, com a ação de atravessadores suspeitos, envolvendo a ala militar e o bloco de cargos de confiança do Centrão, criou uma aliança explosiva que faz o governo balançar.

Ao mesmo tempo em que constitui a principal base de sustentação do governo, este consórcio formado por militares bolsonaristas e parlamentares do Centrão, com seus métodos pouco republicanos, pode criar para Bolsonaro sérios problemas, tanto nas Forças Armadas como no Congresso. Nada indica que a atuação destes contingentes se limite ao Ministério da Saúde. Pode ser apenas a ponta de um iceberg.

O desgaste na imagem e a insatisfação nestas duas instituições é crescente.

A presença de mais de 10 mil militares ocupando cargos civis em todas as áreas do governo, agora por tempo ilimitado, com direito a soldo dobrado, corresponde a outro tanto, ou mais, de apaniguados do Centrão, e o presidente já disse que não tem como saber o que acontece nos 22 ministérios.

Agora apareceu no festival de maracutaias até um cabo da PM de Minas Gerais, Luiz Paulo Dominghetti Pereira, atravessador de uma empresa americana de medicamentos, que foi ciceroneado pelo tenente-coronel Marcelo Blanco, para um jantar de negócios com o diretor de Logística Roberto Dias, ligado a vários políticos do Centrão - entre eles, o lider do governo na Câmara, Ricardo Barros.

Em entrevista à Folha, Dominghetti contou que recebeu de Roberto Dias uma oferta de propina de US$ 1 por dose de vacina da AstraZeneca oferecida ao Ministério da Saúde.

Nesta quinta-feira, em depoimento à CPI da Covid, o cabo confirmou a denúncia e revelou que esteve também com o coronel Elcio Franco, o número 2 do general Pazuello no Ministério da Saúde, que centralizou a compra de vacinas.

Agora o general e o coronel estão novamente trabalhando juntos, mas no Palácio do Planalto, para onde foram levados depois de suas demissões, e encarregados de explicar os "rolos" no ministério em nome do governo.

Na denúncia anterior, dos irmãos Miranda, que foi levada diretamente para o presidente Bolsonaro, há mais de três meses, um outro militar, o tenente-coronel Alex Lial Marinho, também foi citado por pressionar o servidor Luís Ricardo Miranda para aprovar logo a compra da vacina indiana Covaxin, intermediada pela brasileira Precisa Medicamentos.

Só ontem a Polícia Federal abriu uma investigação para apurar o caso. A Procuradoria-Geral da República, de Augusto Aras, prefere esperar o final da CPI para fazer o mesmo. O presidente da Câmara, Arthur Lira, que recebeu um "superpedido" de impeachment na quarta-feira, relatando 23 crimes de responsabilidade que teriam sido praticados por Bolsonaro, já disse que nem pensa em abrir o processo.

Com Aras e Lira, os militares e o Centrão, o governo pensa que formou um intransponível cinturão de segurança para se proteger do movimento Fora Bolsonaro, que cresce nas ruas e na sociedade civil.

Mas nem tudo está dominado. Nesta quinta-feira, o presidente da OAB, Felipe Santa Cruz, convocou uma reunião extraordinária do Conselho Federal, para o próximo dia 20, com a única finalidade de debater a proposta de apresentação de pedido de impeachment do presidente Jair Bolsonaro. O mesmo pedido já foi feito pela ABI (Associação Brasileira de Imprensa). Só quem não se manifestou ainda é a CNBB (Confederação Nacional dos Bispos do Brasil).

O governo "incorruptível" está sob ataque, balançando, mas não cai.

Para este sábado, estão marcadas novas manifestações de protesto em todo o país.

Vida que segue.

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