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O que explica força de Lula no Nordeste: caravanas e identificação com povo
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No dia em que Bolsonaro e Moro se encontram no Nordeste, em busca dos votos dos "paus-de-arara", como escreveu o Josias de Souza, fiquei pensando o que explica a força de Lula nesta região, onde o PT sempre abriu larga vantagem nas eleições presidenciais, inclusive na última, com Fernando Haddad, quando o ex-presidente estava preso.
Tem certas coisas que não mudam de um dia para outro porque "vêm de longe", como dizia Leonel Brizola, por razões tão arraigadas que fogem às circunstâncias políticas e eleitorais do momento.
Não é só por Lula ter nascido na pequena Caetés, no sertão de Pernambuco, antigo distrito de Garanhuns, de onde saiu com 7 anos com a mãe e os irmãos em busca do pai que tinha se mudado para São Paulo.
Outros candidatos, em diferentes épocas, também eram nordestinos, o que não lhes garantia os votos da região.
A primeira explicação para essa força de Lula no Nordeste é a incrível identificação com aquele povo, que vê nele um igual, um "conterrâneo", como eles dizem.
Embora viva há quase 70 anos em São Paulo e pelo mundo, Lula continua falando a mesma língua, come a mesma comida, tem os mesmos hábitos e as mesmas lembranças dos seus eleitores dos tempos de quando passou fome e não tinha água limpa para beber.
Por isso, a principal prioridade do seu governo foi o combate à fome, para garantir a cada brasileiro três refeições por dia, o mote das suas campanhas presidenciais, desde a primeira em 1989.
No seu governo, os programas do Fome Zero e Luz para Todos saíram do papel, assim como a transposição do rio São Francisco (hoje, Bolsonaro está inaugurando o último trecho da obra), além da construção de milhares de cisternas por centenas de municípios espalhados pelo sertão. Quem teve pela primeira vez luz e água limpa em suas casas não se esquece disso.
A segunda explicação para os altos índices de intenções de voto de Lula no Nordeste nesta nova campanha eleitoral, que já passam de 60%, são as caravanas de ônibus que fez pela região desde a campanha de 1994, quando Lula conheceu de perto a realidade da vida nordestina e as suas demandas, entrando nas casas e conversando com as pessoas.
Em cada cidade onde ele chegava, e era a primeira vez que aquele povo via de perto um candidato a presidente, a identificação era imediata e ninguém se acanhava para lhe dar um abraço com tapas nas costas, um dos hábitos da região que ele manteve. Ninguém o chamava de senhor nem pedia licença para lhe dizer "umas coisas" ao pé do ouvido.
Cada parada da caravana era uma festa popular, a cidade inteira nas ruas acompanhando a chegada e a partida, correndo atrás do ônibus, desejando boa sorte ao "cumpade". É uma imagem que aquelas pessoas guardaram para o resto da vida. Nem eu me esqueço, por exemplo, da caravana fluvial pelo rio São Francisco, a mais emocionante de todas, quando os ribeirinhos desciam correndo pelos barrancos para ver o candidato de perto, muitas vezes o obrigando a descer do barco para conversar com eles.
Ao final dos seus oito anos de governo, o Nordeste foi a região que teve o maior crescimento de PIB no país, deixando de ser um exportador de mão de obra barata para formar uma nova geração de jovens com acesso a universidades e escolas técnicas. Tanto que hoje eles nem pensam em sair de lá. Ao contrário, muitas famílias de antigos retirantes acabaram voltando para a sua terra. Isso resgatou a autoestima e o orgulho de ser nordestino.
O ex-presidente e candidato a voltar pela terceira vez ao Palácio do Planalto costuma dizer que essas caravanas foram a melhor coisa que ele fez na vida pública, um permanente reencontro com suas origens para nunca esquecer de onde veio.
E a melhor coisa de ficar velho na profissão é ter essas histórias para contar, por ter testemunhado essas andanças de Lula pelo país nos últimos 40 anos, o que me ajuda a entender o atual cenário eleitoral e a renitente liderança de Lula em todas as pesquisas.
Um candidato a presidente não se inventa de um dia para outro, por melhor que seja o marqueteiro, e por mais recursos que tenha. Pode, eventualmente, surgir uma zebra, mas o raio não cai duas vezes no mesmo lugar.
Assim como o correr natural das águas do São Francisco, da nascente, em Minas, até o mar, em Sergipe, se não houver um acidente de percurso, mais uma vez o eleitorado do Nordeste pode ser decisivo nesta eleição.
Os adversários de Lula sabem disso e agora estão correndo atrás dos votos dos "paus-de-arara". Pode ser tarde demais.
Dizem que somos um povo sem memória, mas os milhões de nordestinos que lá ficaram, ou estão espalhados pelas periferias do Brasil, mostram nas pesquisas que isso não é bem verdade.
Podem me xingar à vontade, mas eu não mudo de opinião. Sei do que estou falando por que eu vi, vivi e posso dizer, não falo do que ouvi em "off".
Vida que recomeça.
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