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OPINIÃO

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Candidatos "traço" mostram a Bonner que regras para debates precisam mudar

 Debate na Globo é marcado por troca de acusações entre candidatos e vácuo de propostas  -  O Antagonista
Debate na Globo é marcado por troca de acusações entre candidatos e vácuo de propostas Imagem: O Antagonista

Colunista do UOL

30/09/2022 11h51Atualizada em 30/09/2022 16h08

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O último debate levado ao ar pela Globo, que durou mais de três horas e acabou na madrugada desta sexta-feira, só serviu para mostrar que o atual formato está com o prazo de validade vencido. Ninguém aguenta mais ouvir tantas sandices e inutilidades, por tanto tempo, tendo que acordar cedo para trabalhar no dia seguinte.

Há que se criar uma "cláusula de barreira", como já existe nas eleições para os partidos, talvez uma pontuação mínima de 5 pontos nas pesquisas, além da representação parlamentar, para definir os candidatos aptos a participar do momento mais importante e decisivo das campanhas eleitorais.

É a única forma de evitar a presença dos folclóricos candidatos "traço", aqueles com 0% nas pesquisas, como o tal padre Kelmon (quem?), do PTB, e o empresário Luiz Felipe D'Avila, do Novo. Sem nenhuma chance na eleição, servem apenas de laranjas ou linhas auxiliares de quem realmente está na disputa.

Do jeito que está, quem ganhou o debate da Globo foi o estoico moderador William Bonner, que conseguiu levar o jogo até o final, sem mortos nem feridos, servindo como bedel de marmanjos na hora do recreio. Dá audiência, mas no final em nada contribui para tirar as dúvidas dos eleitores indecisos na véspera da abertura das urnas, mais interessados em saber como os candidatos podem melhorar a vida deles.

Com novas regras, mais civilizadas, o debate poderia durar a metade do tempo e ser mais útil na hora da decisão do voto.

A avacalhação começou ainda antes de Bonner dar início ao deprimente espetáculo, quando Bolsonaro se reuniu num canto do estúdio com Kelmon e o filho Carluxo, para acertar os últimos detalhes da dobradinha milico-clerical, em que o presidente terceirizou os ataques a Lula, a ponto de fazer o petista perder a paciência com o padre, algo que eu nunca tinha visto antes. Por muito pouco, eles não saíram no tapa.

Se daqui a 100 anos, quando vencerem os sigilos decretados por Bolsonaro e historiadores do futuro resgatarem a gravação deste debate terão um perfeito retrato de como se fazia política no Brasil nos anos 20 do século 21.

Como nas velhas mesas redondas de futebol nas noites de domingo na TV ou nos júris de programas de auditório, cada um ali representava um personagem, mais bonzinho ou mais malvado, mais histriônico ou mais cerebral, repetindo sempre os mesmos bordões em monólogos que não permitiam qualquer diálogo.

O atual formato permite que os coadjuvantes se tornem protagonistas, roubem a cena e pautem o debate sobre temas tão candentes como cristianismo medieval ou liberalismo econômico para salvar o país dos demônios vermelhos.

Até hoje não se sabe se o padre é mesmo padre, nem de onde surgiu, mas é certo que ele se divertiu bastante e fazia ar de vencedor, enquanto esperava o carro na saída dos estúdios da Globo. Virou uma celebridade instantânea.

Felipe D´Avila, por sua vez, aproveitou o púlpito e a audiência global de 60 milhões para vender o seu peixe do Partido Novo, que de novo nada tem, e pregar o fim dos direitos trabalhistas, dos sindicatos e das empresas estatais, com o mesmo discurso de Paulo Guedes, a serviço de Bolsonaro, o "liberal na economia e conservador nos costumes", com o carisma de um gravador emperrado.

A caminho de também se tornar um nanico, Ciro Gomes continuou recitando os números do seu Plano Nacional de Desenvolvimento, que tem solução para tudo, o mesmo de suas outras três campanhas presidenciais anteriores, agora incrementado com o Programa de Renda Mínima de Eduardo Suplicy.

As senadoras sul-matogrossenses Simone e Soraya aproveitaram para se apresentar ao grande público nacional, já de olho nas próximas eleições.

Lula e Bolsonaro, os líderes disparados nas pesquisas, não ganharam nem perderam nada neste debate, que começou beligerante, com 10 pedidos de resposta concedidos, e terminou arrastado e repetitivo.

Se vai ou não ter segundo turno, só saberemos no domingo, quando os indecisos se decidirem. Quem sabe, os candidatos "traço" saiam do zero.

Podem ser a surpresa dos novos Datafolha e Ipec que saem amanhã? Já pensaram se eles tiram Lula e Bolsonaro do segundo turno?

Até seria interessante ver uma disputa entre o cristão Kelton e o liberal D´Avila para ver quem é mais bolsonarista.

Vida que segue.

Errata: este conteúdo foi atualizado
Diferentemente do informado, o nome do candidato do Novo à Presidência é Felipe D´Avila, e não Luiz Fernando D'Avila. O texto foi corrigido.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL