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OPINIÃO

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"PEC da Bandalha" passa na CCJ da Câmara: tapa na cara da Justiça Eleitoral

Apesar de amplamente repudiada por setores da sociedade civil, PEC da anistia partidária foi aprovada com larga maioria na CCJ da Câmara - Foto: Billy Boss/Câmara dos Deputados
Apesar de amplamente repudiada por setores da sociedade civil, PEC da anistia partidária foi aprovada com larga maioria na CCJ da Câmara Imagem: Foto: Billy Boss/Câmara dos Deputados

Colunista do UOL

17/05/2023 18h09

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"O descumprimento da obrigação dos partidos de destinarem 30% de vagas para mulheres nos pleitos eleitorais revela a sociedade machista em que estamos inseridos. Não só isso, mas também o descaso com a observância das leis. A anistia constitui um tapa na cara das mulheres, do Judiciário, da democracia. Os partidos precisam ser instrumentos de promoção do bom exemplo."

Maria Fatima Veras Villanova (Fortaleza, CE), no Painel do Leitor da Folha.

*

Belo exemplo: ao aprovar, por 45 votos a 10, a chamada PEC da Anistia, proposta de emenda constitucional que promove "o maior perdão da história a partidos políticos", segundo a Folha, a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara passou como um trator sobre a Justiça Eleitoral, mostrando uma rara unidade de ação no momento em que o país se encontra dividido ao meio, entre governo e oposição, emperrando o funcionamento do Congresso Nacional.

Mais justo seria chamar este monstrengo de "PEC da Bandalha", pois é disso que se trata.

Desta vez, juntaram-se todos os partidos, da extrema-direita à centro-esquerda, do PL de Bolsonaro ao PT de Lula, com a honrosa exceção do pequeno PSOL, para esculachar com as leis eleitorais, atropeladas por crimes em série na última campanha, a começar pela cota mínima para candidatas mulheres.

O pior é que todas as sete mulheres da CCJ votaram a favor desta bandalha, junto com os 35 homens, para revogar, na prática, uma das mais importantes conquistas da jovem democracia brasileira, ao lado da cota racial, também desrespeitada pelos partidos: os quatro parlamentares negros da comissão, todos autodeclarados pardos, juntaram-se aos 41 brancos para apoiar a proposta da "PEC da Bandalha".

Se até os principais interessados numa democracia plena para corrigir desigualdades históricas votam contra eles mesmos, o que se pode esperar dos outros?

Nesta votação-relâmpago, nem foi preciso que o governo abrisse os cofres para distribuir emendas parlamentares do orçamento secreto. Foi tudo muito rápido. Quando se trata de defender seus próprios interesses, estão todos do mesmo lado, até o PT, que ao longo da sua história defendeu as cotas de gênero e de raça.

A presidente nacional do PT, Gleisi Hoffmann, reafirmou os compromissos do partido, mas defendeu o voto a favor da proposta de anistia para as multas aplicadas pelo TSE, que ordenou a devolução de mais de R$ 40 milhões aos cofres públicos, alegando que a Justiça Eleitoral estaria aplicando "multas inexequíveis", colocando em risco a sobrevivência dos partidos, sem dizer o que ela consideraria "multas razoáveis".

Ou seja, para sobreviver, Hoffmann acha que os partidos precisam desrespeitar as leis eleitorais, promovendo uma farra com os recursos públicos destinados aos fundos eleitorais e partidários, como a compra de avião e de quase quatro toneladas de carne para churrasco por uma legenda nanica, o extinto Pros.

Além disso, o terceiro artigo da PEC autoriza os partidos a receber dinheiro de empresas para quitar dívidas com fornecedores, contraídas ou assumidas até agosto de 2015, quando o STF proibiu financiamento empresarial a partidos e candidatos.

Assim, de retrocesso em retrocesso, depois de quatro anos de esbornia institucional, o país recua séculos em seu processo civilizatório, com a multiplicação dos casos encontrados quase diariamente de trabalho análogo à escravidão e do genocídio de populações indígenas e quilombolas, tudo em nome do progresso.

Os discursos acintosos feitos pelos parlamentares dos diferentes partidos em defesa da aprovação da proposta de anistia, deveriam ser guardados num Mausoléu da Infâmia Parlamentar, que o presidente da Câmara, o grande estadista do Centrão, Arthur Lira, auto nomeado primeiro-ministro, poderia erguer com o dinheiro das multas que seus comparsas não querem pagar.

A PEC agora segue para uma comissão especial da Câmara, apenas para referendar a decisão da CCJ; depois, vai a plenário e, por fim, será chancelada pelo Senado. Pelo retrospecto do atual Congresso, o mais reacionário e medíocre desde a República Velha, nada impedirá sua aprovação final.

Vida que segue.