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OPINIÃO

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Basta! Celular de Mauro Cid é batom na cueca do bando de militares do golpe

CPMI dos atos antidemocráticos conta com 36 requerimentos de convocação, incluindo nomes de ministros, militares e suspeitos de terrorismo - Foto: Marcelo Camargo/ABr
CPMI dos atos antidemocráticos conta com 36 requerimentos de convocação, incluindo nomes de ministros, militares e suspeitos de terrorismo Imagem: Foto: Marcelo Camargo/ABr

Colunista do UOL

17/06/2023 12h30

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O que falta ainda para que sejam imediatamente afastados das suas funções nas Forças Armadas todos os oficiais golpistas flagrados na conspiração encontrada no celular do ajudante de ordens de Jair Bolsonaro, o agora notório coronel Mauro Cid, que está preso? Se houver algum inocente no meio, poderia ser reincorporado às suas fileiras ao final dos processos abertos na Justiça.

Revelados pela revista Veja desta semana, os inacreditáveis diálogos entre os conspiradores fardados mostram um bando de incompetentes, desajustados, mentirosos, trapalhões, irresponsáveis falastrões e, acima de tudo, covardes, no melhor estilo das repúblicas bananeiras do passado, que colocaram em risco a democracia brasileira durante várias semanas, após a derrota do seu líder nas eleições de outubro.

É o batom na cueca que faltava nas investigações do Supremo Tribunal Federal e da Polícia Federal para estabelecer a cadeia de comando dos ataques às instituições em Brasília no golpe fracassado de 8 de janeiro.

Entre os sediosos, desponta agora, ao lado de aloprados de menor coturno, a figura do coronel Jean Lawand Júnior, subchefe do Estado-Maior do Exército, o alto oficial que mais atiçou o coronel Cid a convencer Bolsonaro de que tinha "chegado a hora" de "dar a ordem" para botar as tropas em movimento e colocar o país sob intervenção militar.

Agindo sempre com a mão do gato para terceirizar responsabilidades, o então chefe supremo das Forças Armadas, se não foi o mentor oculto, nada fez para interromper a marcha do golpe armado para mantê-lo no poder. Homiziado no Palácio da Alvorada, sem dar entrevistas, fingiu-se de morto por dois meses até fugir para os Estados Unidos, enquanto seus seguidores ocupavam a frente dos quarteis, protegidos pelos militares, de onde saíram em caravanas para ocupar Brasília, uma semana após a posse do novo governo.

Um diálogo, em particular, entre os coronéis Lawand e Cid, revela como estava o clima no palácio naquele começo de dezembro de 2022. Em tom dramático, o então Subchefe do Estado-Maior do Exército faz mais um apelo, invocando Deus, para que o faz-tudo de Bolsonaro salvasse o país dos bandidos, como eles se referem aos vencedores da eleição.

Lawand: "Convença o 01 a salvar esse país Pelo, amor de Deus, Cidão. Pelo amor de Deus, faz alguma coisa, cara. Convence ele a fazer. Ele dá a ordem que o povo tá com ele. Acaba o Exército Brasileiro se esses caras não cumprir a ordem do Comandante Supremo. Ele não pode recuar agora. Ele não tem nada a perder. Ele vai ser preso. O presidente vai ser preso. E, pior, na Papuda, cara".

Cid: "Ele ainda não deu a ordem de intervenção militar porque ele não confia no ACE".

ACE é o Alto-Comando do Exército, exatamente onde o coronel Lawand estava servindo, junto com o general Edson Skora Rosty, Subcomandante de Operações Terrestres, que teria dito a um amigo: " Se o EB (Exército Brasileiro) receber a ordem, cumpre prontamente, mas de modo próprio, o EB nada vai fazer porque será visto como golpe".

Será visto como golpe? Não diga. Que maravilha... Na mesma mensagem, diz que se a cúpula do EB não está com ele, de divisão pra baixo está".

O ultimo diálogo entre os dois termina de forma melancólica, como uma premonição:

Lawland: "Soube agora que não vai sair nada. Decepção, irmão. Entregamos o país aos bandidos. Então ferrou. Vai ter que ser pelo povo mesmo"

O tal povo cumpriu sua parte no 8 de janeiro, mas os beneficiários do golpe fracassado sumiram todos de cena e, procurados pela revista, disseram que não se lembram de nada. O coronel Lawland admitiu ser amigo do coronel Cid, mas diz que só conversaram amenidades e não se lembra de nenhum diálogo de teor golpista. O general Rosty também não se lembra das mensagens. Cid nada falou porque está preso. Deu amnésia coletiva.

Por ironia dos astros, na mesma semana em que o Brasil ficou sabendo do "Roteiro do golpe", que não tem assinatura, Bolsonaro começa a ser julgado na quinta-feira pelo TSE, por falar mal do sistema eleitoral brasileiro numa reunião com embaixadores estrangeiros, um crime menor no rol dos processos a que responde. Mesmo condenado, não irá para a Papuda, mas se tornará inelegível por 8 anos.

O maior interessado num urgente e profundo expurgo dos golpistas das suas fileiras deveria ser o próprio Exército Brasileiro, achincalhado por quem deveria defende-lo e honra-lo. Não há no momento nenhuma ameaça de potência estrangeira no horizonte. Os inimigos da nossa democracia estão aqui dentro mesmo.

Vida que segue.