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Governo abandonou acompanhamento e avaliação de cotas desde 2017, diz TCU
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Um relatório produzido e aprovado pelos ministros do TCU (Tribunal de Contas da União) aponta que o MEC (Ministério da Educação) deixou de acompanhar e avaliar o programa de cotas, criado há dez anos no país. Segundo o documento, isso prejudica a inclusão do público-alvo nessas vagas e a efetivação da política social. É uma das funções do TCU ser o órgão de controle na avaliação das políticas públicas.
A Lei das Cotas (Lei 12.711/2012) previa que o Comitê de Acompanhamento e Avaliação das Reservas de Vagas deveria elaborar, anualmente, um relatório de avaliação da implementação da política.
Porém, a auditoria do TCU aponta que "não há relatórios anuais sistemáticos sobre a avaliação da implementação das reservas de vagas".
"Tampouco [há] relatórios com dados consolidados relativos ao período de 2017 a 2022, no período de vigência da lei, em especial, no período de 2017 em diante, evidenciando fragilidades no acompanhamento e monitoramento da política de cotas."
Em consequência disso, diz o TCU, "não há um dimensionamento dos resultados da política de reserva de vagas para ingresso em instituições federais de ensino".
Um dos problemas práticos dessa falta de acompanhamento foi percebido no cruzamento dos dados por raça/cor da população do Censo de 2010, feito pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), com os do Censup (Censo da Educação Superior) 2020.
Em 2020, apenas nove estados teriam alcançado um percentual de universitários negros similar ou superior ao medido pelo IBGE. Esse número é ainda mais distinto entre indígenas: só quatro das 27 unidades da federação teriam batido a meta.
Entretanto, os técnicos chamam a atenção para subnotificações no quesito cor/raça no Censup, "o que prejudica a análise da evolução do perfil étnico-racial nos cursos de graduação".
"Em alguns estados, como Amapá, Amazonas e Pernambuco, por exemplo, nota-se um percentual bastante reduzido de negros nos cursos de graduação no ano de 2012. Verificando as sinopses estatísticas da educação superior daquele ano, observa-se que nessas unidades da federação mais de 90% das matrículas não dispõem da informação de cor/raça", aponta.
Os dados fizeram o TCU entender que a política de cotas "ainda não atingiu os objetivos de inclusão de grupos beneficiários na proporção representativa da população, havendo sub-representação de estudantes pretos, pardos, indígenas e estudantes com deficiência".
Entre os pontos questionados no relatório, estão que a inclusão das cotas para estudantes com deficiência ocorreu somente a partir de 2016 e que não tem tido o devido acompanhamento.
Neste sentido, o relatório elaborado pelo Ministério da Educação, em 2017 (com dados até 2016), não reflete os resultados após a efetivação plena da Lei de Cotas e não apresenta dados sobre inclusão de estudantes com deficiência."
Relatório do TCU
Outro ponto citado como crucial para a menor inclusão é que há "falhas na definição do público-alvo da política de cotas, com maior concorrência na subcota para estudantes com renda per capita de até 1,5 salário mínimo".
Universidades também não acompanham cotistas
O TCU também enviou um questionário às instituições federais de ensino e descobriu que 57% delas afirmaram não ter ações de acompanhamento e avaliação dessa política.
"Além disso, com base nas respostas ao questionário eletrônico, 73,5% das instituições federais de ensino declararam que não dispõem de indicadores de desempenho de estudantes cotistas atendidos por políticas de assistência estudantil, reforçando a fragilidade de acompanhamento e avaliação da política de cotas", relatam os auditores.
A auditoria ainda descobriu que o MEC não possui dados sobre a quantidade de alunos que ingressaram pelo programa de cotas e que foram atendidos pelos programas Nacional de Assistência Estudantil ou de Bolsa Permanência. "Também não existe um levantamento de estudantes que ingressaram pelo programa de ação afirmativa e que posteriormente abandonaram os cursos."
Das universidades brasileiras, 22 falaram que há dificuldades para permanência e êxito de estudantes cotistas, "em face das muitas dificuldades impostas aos beneficiários da política de cotas e de limitações de recursos para as políticas de assistência estudantil".
Pedido de providências
No acórdão, os ministros do TCU aprovaram o relatório e afirmaram que os dados mostram que a política não atingiu o público-alvo totalmente.
"Considerando os valores observados desde a criação das cotas, observa-se que, em média, 60% das inscrições realizadas para vagas reservadas foram de alunos de baixa renda. A porcentagem de alunos nessa situação, nas escolas públicas, era de 87,7% no ano de 2020, conforme Mapa do Ensino Superior", diz o relator Walton Alencar Rodrigues em seu voto em sessão no último dia 26.
"Mesmo que nem todos os concluintes do ensino médio tenham interesse em ingressar na faculdade, a discrepância entre o público-alvo e o percentual de vagas previsto é significativa."
Para os ministros, é possível concluir que as "distorções entre o número de vagas para baixa renda e a população de baixa renda são maiores em instituições federais de ensino localizadas nas unidades da federação mais pobres do país".
Para maior efetividade das cotas é necessário considerar sua coerência com as políticas de assistência estudantil, uma vez que o objetivo final não é apenas o ingresso do aluno na Ifes, mas que esse seja capaz de concluir o curso e ingressar no mercado de trabalho em melhores condições."
Relatório do TCU
A coluna procurou o MEC para que se pronunciasse sobre as revelações do TCU, mas não recebeu resposta até o momento. Ela será incluída assim que o órgão se manifestar.
Política é fundamental, diz especialista
As cotas completaram dez anos em 2022 e foram uma política pública essencial para inclusão de negros, indígenas e outros grupos vulneráveis.
A lei teve implementação gradativa no período de 2013 a 2016, quando a reserva de vagas atingiu 50% do total destinado ao público.
Para Alessandra Tavares, educadora, formadora e coordenadora da Comunidade Educativa CEDAC, o relatório do TCU faz importantes colocações.
"O documento traz uma percepção mais ampla da implementação em diferentes universidades do país e identifica algumas que não corroboraram devidamente com o processo. Além disso, a partir dos cruzamentos de dados públicos, é possível redirecionar atenção para que, de fato, estudantes que acessam a universidade pelas políticas de cotas possam permanecer e diminuir a evasão no ensino superior", comenta.
"É importante que as políticas de cotas não apresentem um teto ou limite para estudantes pretos, pardos e indígenas e, sim, oportunizem a ampliação do acesso aos estudantes do ensino superior."
Ela cita ainda o que, para ela, pode melhorar no sistema de cotas:
- Ampla participação no processo de acompanhamento e avaliação da política pública;
- Construção de orientações e diretrizes para a implementação em todo o país;
- Construção de políticas de permanência e assistência estudantil;
- Realização de estudo e aprofundamento sobre os processos de evasão.
Penso que o envolvimento dos diferentes atores contribuirá para a reflexão sobre as necessidades e formas de aprimoramento da lei."Alessandra Tavares, educadora, formadora e coordenadora da Comunidade Educativa CEDAC
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