Vítimas acionam MPF contra União e AL após afundamento de bairros em Maceió
A Associação de Empreendedores e Vítimas da Mineração em Maceió ingressou com uma representação criminal no MPF (Ministério Público Federal) em Alagoas cobrando que o órgão entre com uma ação penal em um prazo de até 15 dias contra a Braskem e órgãos de Alagoas e do governo federal.
O que aconteceu
Empresa e três órgãos públicos devem ser responsabilizados, diz a associação. Para os advogados, há indícios suficientes de que a petroquímica, o IMA (Instituto do Meio Ambiente de Alagoas), o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Social e Econômico) e a ANM (Agência Nacional de Mineração) praticaram crimes ambientais que contribuíram —por omissão ou financiamento—para o afundamento de solo em cinco bairros de Maceió.
As penas dos crimes indicados variam de um a seis anos de prisão, mais multa. Em síntese, a empresa e os três órgãos públicos são acusados, pela associação, de poluição — que tornou a área imprópria para a ocupação humana — e de apresentar laudo falso ou enganoso.
O episódio na capital alagoana é considerado o "maior desastre socioambiental em área urbana em curso no mundo". Desde 2018, a tragédia já expulsou de casa ou de seus negócios 60 mil pessoas.
A associação foi criada em 12 de fevereiro de 2019 e é uma das entidades que representa moradores e empresários que foram afetados pela mineração da Braskem.
Importa destacar que muitos crimes que ainda deveriam ser imputados aos responsáveis já podem estar prescritos, após todos esses longos anos desde o primeiro evento sismológico, em 2018, e das perícias feitas pelo SGB [Serviço Geológico do Brasil] e pelo próprio MPF, por isso as medidas repressivas aqui propostas são urgentes.
Representação criminal
O maior crime socioambiental do mundo em área urbana não pode passar impune. Acordos unilaterais, sem a participação das vítimas, que só privilegiaram o poderio econômico da Braskem, jamais poderiam ser usados como desculpas para a não responsabilização criminal da mineradora. Esperamos que o MPF cumpra seu papel constitucional.
Alexandre Sampaio, presidente da associação
O MPF confirmou o recebimento da representação e informou que ela será analisada.
O que diz o documento
O UOL teve acesso à representação criminal. Com 186 páginas, fora os anexos, ela faz um histórico do caso e mostra documentos levantados pela associação entre junho e agosto de 2023.
Os advogados apontam que pelo menos duas licenças ambientais foram realizadas em "grave desacordo com as normas ambientais". Trata-se das duas últimas licenças expedidas para extração da salgema em 2016 e 2017 — a associação alega que não teve acesso a documentos de licenças anteriores.
Restou flagrantemente caracterizado que essas licenças foram expedidas sem o prévio e necessário Estudo de Impacto Ambiental e seu Relatório (EIA/RIMA).
Representação criminal
Braskem mais do que triplicou o número de poços, segundo os advogados. O relatório ambiental apresentado pela empresa é de 1986, quando havia apenas 11 poços, e o projeto da petroquímica evoluiu para 38, além de alterações na área de mineração, na quantidade de rejeitos, no número de empregados envolvidos, entre outros fatores.
É evidente, portanto, que o projeto teria que ser reavaliado ambientalmente com um estudo correto e atualizado -- o que era para ser feito nas duas licenças citadas acima.
Representação criminal
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OLHAR APURADO
Uma curadoria diária com as opiniões dos colunistas do UOL sobre os principais assuntos do noticiário.
Quero receberA ANM, órgão responsável por autorizar atividades de mineração do país, teria sido omissa. "Pelo menos desde 2015 a ANM já suspeitava da existência de subsidência do solo, desmoronamento das paredes e teto das cavidades e instabilidade do subsolo."
(...) Ela [a ANM] poderia ter constatado as graves fraturas no solo e afundamento dos bairros em uma de suas vistorias.
Representação criminal
Críticas ao financiamento do BNDES à empresa. A alegação é que o banco público teria "subsidiado financeiramente por longo tempo as atividades minerárias da Braskem sem o devido controle".
A iniciativa que estamos encaminhando é uma forma de evidenciar ao MPF e à sociedade que todos os elementos necessários ao encaminhamento das questões criminais relacionadas ao desastre ambiental sempre estiveram à disposição; portanto, as vítimas desse crime esperam a responsabilização dos seus algozes e tais medidas não podem ser abdicadas pelo estado.
Gabriel Bulhões e João Batista Barbosa, advogados autores da ação
O que dizem os órgãos públicos
Em nota, a ANM informou que a exploração de salgema está proibida desde 2019 em Maceió. Sem dar mais detalhes, diz que "controlou e fiscalizou as atividades realizadas pela Braskem SA ao longo dos anos, dentro da sua competência legal e em cumprimento às disposições do Código de Mineração e legislação correlata, com os recursos e meios disponíveis à época".
A autarquia minerária realizou vistorias na área de concessão de lavra da Braskem, exigindo dados/informações e determinando diligências à empresa, muito antes do aparecimento da fissura (15/02/2018) e do tremor de terra ocorrido na região (03/03/2018).
ANM
O IMA afirmou que até ontem não foi notificado e que, "tão logo tome ciência do processo, adotará todas as medidas cabíveis, juntamente com a Procuradoria Geral do Estado de Alagoas (PGE)".
O BNDES diz que sua relação com a Braskem "seguiu estritamente os regulamentos do Banco para apoio às empresas brasileiras".
Sob a ótica acionária, o BNDES sempre foi acionista minoritário, condição que não confere atuação executiva nem decisória sobre os negócios ou o dia-a-dia da empresa. No que diz respeito às operações de crédito, elas foram lastreadas nas condições cobradas de todos os demais clientes, dentre as quais inclui-se a documentação exigida pela legislação, notadamente licenças ambientais.
Procurada ontem pela coluna, a Braskem não se manifestou até o momento.
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