Carlos Madeiro

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Reportagem

Com boom em preço de casas, Maceió leva vítimas da mineração para periferia

O autônomo Jackson Douglas, 43, nasceu e morou, até 2021, na mesma casa da rua Manoel Sampaio, no bairro do Bebedouro, em Maceió (AL). Ele era vizinho de seus familiares — e foi um dos 60 mil moradores expulsos de suas residências por causa do afundamento de solo causado pela mineração de sal-gema.

Eu nasci e me criei na mesma casa, e tivemos de sair no susto. Com os preços dos imóveis de Maceió nas alturas, o dinheiro [da Braskem] não deu para comprar próximo um do outro. Estamos todos em uma área bem inferior da que morávamos.
Jackson Douglas

O aumento abrupto da procura elevou de forma significativa os preços de imóveis — o que fez com que moradores, que viviam nos bairros centrais da cidade, fossem levados a adquirir imóveis na periferia e até em outras cidades.

Os moradores também reclamam das indenizações — segundo eles, abaixo do mercado — pagas pela Braskem. Eles alegam que a empresa não levou em conta a disparada de preços registrada no período.

Rua abandonada após afundamento no bairro do Pinheiro, em Maceió
Rua abandonada após afundamento no bairro do Pinheiro, em Maceió Imagem: Carlos Madeiro/UOL

Maior alta

Segundo o Índice FipeZAP, Maceió teve, em 2023, a maior alta no preço dos imóveis residenciais do país. O cálculo é feito levando em conta os anúncios na internet em 50 cidades.

A Braskem colocou muito dinheiro com essas indenizações. Maceió passou a ter uma quantidade muito grande de clientes com dinheiro na mão. E no mercado existe a lei da oferta e da procura: quanto mais se busca, mais caro fica.
Vilmar Pinto, corretor de imóveis, há 42 anos, em Maceió

Enquanto a média nacional foi de 5,13% de valorização, na capital alagoana a alta foi de 16%. Essa foi uma tendência dos últimos quatro anos, justamente quando teve início o pagamento das indenizações às vítimas da Braskem.

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Alta dos preços em Maceió, segundo o Índice FipeZAP:

  • 2023 - 16%
  • 2022 - 13,2%
  • 2021 - 18,5%
  • 2020 - 7,9%
  • 2019 - 0,5%

Preços fora da realidade local

Dos cinco bairros com metro quadrado mais caro entre as capitais do Nordeste, em dezembro de 2023, três estão em Maceió.

Bairros mais valorizados do Nordeste:

  • Meireles (Fortaleza) - R$ 9.874/m²
  • Pajuçara (Maceió) - R$ 9.617/m²
  • Cabo Branco (João Pessoa) - R$ 9.335/m²
  • Ponta Verde (Maceió) - R$ 9.272/m²
  • Jatiúca (Maceió) - R$ 9.207/m²
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Orla de Maceió tem os bairros de Pajuçara, Ponta Verde e Jatiúca entre mais caros do Nordeste
Orla de Maceió tem os bairros de Pajuçara, Ponta Verde e Jatiúca entre mais caros do Nordeste Imagem: Émile Valões/Prefeitura de Maceió

Os três bairros da capital alagoana superam, por exemplo, o preço médio de imóveis em praias de centros urbanos maiores do Nordeste, como Recife e Salvador — que não têm nenhum bairro com média de preço a R$ 9 mil.

Ex-presidente do Creci e atual diretor financeiro do Cofeci (Conselho Federal de Corretores de Imóveis), Vilmar Pinto diz que hoje há uma grande dificuldade em se encontrar imóveis novos com três quartos para venda.

"Não temos mais. O pessoal da Braskem comprou o que tinha", diz ele. "Só daqui a três anos teremos novos, dos lançamentos que estão saindo agora. Até imóvel de dois quartos você não acha."

Além da alta procura, ele destaca ainda que Maceió teve valorização de marca nacional, sendo hoje a capital mais procurada para pacotes turísticos. O resultado disso é uma explosão nos preços dos imóveis nos bairros de orla.

Há três anos, um lançamento na Ponta Verde custava R$ 10 mil o m², hoje é R$ 14 mil. O turismo está muito bem, isso atraiu investimentos. Tem muito turista comprando, assim como investidores apostando em apartamentos estúdios.
Vilmar Pinto

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Indenização pequena

Sem dinheiro para comprar um imóvel em área similar, Jackson Douglas e os pais foram morar no conjunto João Sampaio, no bairro Petrópolis, bem mais distante da orla e do centro da capital.

E não foi o pior caso: um tio dele foi morar no bairro do Eustáquio Gomes, já na divisa de Maceió com Rio Largo. Outra tia só conseguiu casa pelo preço da indenização na vizinha Marechal Deodoro.

Fomos obrigados a sair. A estratégia da Braskem foi retirar os moradores e depois pagar em casas que valiam R$ 200 mil, R$ 100 mil; e o morador foi obrigado a aceitar. Eu fui um deles, minha família inteira também. Nunca houve indenização, foi uma compra injusta e imoral, na base da força.
Jackson Douglas

Casas coloridas coladas onde a família de Jackson morava em Bebedouro, Maceió
Casas coloridas coladas onde a família de Jackson morava em Bebedouro, Maceió Imagem: Arquivo pessoal

Sobre os valores pagos, a Braskem informou que o Programa de Compensação Financeira e Apoio à Realocação utiliza como referência o valor de imóveis semelhantes, com as mesmas dimensões e que estejam situados em bairros de mesmas características.

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São também consideradas as benfeitorias relevantes para determinação do padrão construtivo e, assim, somadas ao valor do imóvel. Além disso, a depreciação dos imóveis não é levada em consideração.
Braskem, em nota

Faltou planejamento

Segundo o professor Dilson Ferreira, da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Ufal (Universidade Federal de Alagoas), a explosão nos preços veio no vácuo do poder público, que não teria feito um planejamento habitacional para comportar as mudanças.

Maceió tem uma quantidade de vazios urbanos equivalentes à própria [área urbana de] Maceió. Ou seja, você tem muitas áreas abertas dentro da cidade, que não foram ocupadas ainda; tem 540 prédios abandonados, tem fazendas dentro de Maceió.
Dilson Ferreira

Ele calcula que a cidade perdeu 23 quilômetros de vias de mobilidade e teve 7% do território urbano inutilizado. "É um problema que acaba gerando outros para toda a cidade", cita.

O mais correto diante desse cenário, analisa o professor, seria ter feito um trabalho em uma região próxima de onde as pessoas moravam, usando por exemplo prédios do bairro do Centro, onde há imóveis desocupados.

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Poderia ter usado essas áreas para realocar essa população, fazer um programa de habitação financiado pelo governo federal. Poderia ter programas de desapropriação de áreas na cidade para construir esses bairros e realocar as pessoas.
Dilson Ferreira

Avenida Fernandes Lima, no bairro do Farol: região ficou desvalorizada após bairros vizinhos afundarem
Avenida Fernandes Lima, no bairro do Farol: região ficou desvalorizada após bairros vizinhos afundarem Imagem: Junior Bertoldo/Prefeitura de Maceió

Novas vias, ônibus e ciclovias

Ao UOL, a Prefeitura de Maceió informou que prepara o novo plano diretor, que "deverá contemplar projetos urbanos específicos, considerando espaços públicos, lazer, equipamentos comunitários e áreas verdes nos bairros mais afetados pela realocação da população que saiu das áreas que sofrem com afundamento de solo causado pela Braskem".

A administração municipal diz ainda que tem investido no transporte público com "a aquisição de novos ônibus climatizados para a renovação da frota", além de ter alterado o itinerário de cinco linhas e adicionado ao sistema a criação de mais 12 linhas. Também garante que tem realizado a modernização dos semáforos e inauguração de vias para "garantir fluidez e reduzir os congestionamentos causados com a interdição de importantes corredores situados nos bairros atingidos".

Vias como a Marília Mendonça, Rota do Mar, Vida da Integração e ampliação da Durval de Góes Monteiro beneficiarão também pessoas que saíram das áreas atingidas ou que moram no entorno. Além disso, a prefeitura conta, atualmente, com 67 km de ciclovias e ciclofaixas na cidade. Até 2020 eram menos de 30 km.
Prefeitura, em nota

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Vista aérea dos bairros Mutange e Pinheiro, em Maceió
Vista aérea dos bairros Mutange e Pinheiro, em Maceió Imagem: Jonathan Lins / Folhapress

Reportagem

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